Açúcar: Mudança de paradigma – Por Arnaldo Luiz Corrêa
O volume de contratos futuros negociados no mercado de açúcar em NY atingiu recorde diário na última quarta-feira, quando mais de 516,000 lotes foram transacionados, quebrando a marca anterior de 410 mil contratos, em janeiro de 2008, quando a trading brasileira Fluxo foi forçada pela bolsa de NY a liquidar suas posições. A posição de contratos em aberto do açúcar atingiu mais de 1,24 milhão de unidades, potencializada pelo apetite dos fundos, que agora estão comprados pouco mais de 149,000 contratos e dos comerciais (tradings e usinas), que fomentaram as fixações de preços de exportação para a safra 2020/2021.
O vencimento março/20 chegou a bater 15.90 centavos de dólar por libra-peso para depois despencar para a mínima de 14.89 centavos de dólar por libra-peso observada nesta sexta-feira. O mercado acabou encerrando a semana cotado a 15.06 centavos de dólar por libra-peso, numa apreciação acumulada de 14 pontos na semana (pouco mais de três dólares por tonelada). O valor do açúcar em NY fechou a semana ao equivalente a R$ 1,488 por tonelada.
O mês de fevereiro já apresenta um volume muito bom, indicando que mais usinas devem estar acelerando as fixações não apenas para 2020/2021 como também para a safra seguinte. Desde que a Archer Consulting começou a monitorar as fixações de preços das usinas, nunca tivemos um volume tão grande antes de a safra começar. As usinas estão mais disciplinadas e aprenderam as lições do passado.
Temos defendido veementemente que as usinas continuem a fixar preços de exportação de açúcar considerando alguns pontos bastante favoráveis no atual cenário que podem não exatamente estar disponíveis nas próximas semanas. O real, por exemplo, desvalorizou-se rapidamente em relação ao dólar, contaminado pela disseminação do coronavírus que acende o alerta para um encolhimento da economia mundial e o aumento da aversão ao risco. Para as usinas, no entanto, essa é a oportunidade de travar câmbio.
A curva do açúcar em NY convertida em reais por tonelada indica excelente remuneração para o produto. O dólar, que na sexta-feira encerrou a 4.3010 reais, está sobrevalorizado. Esse sentimento de que a moeda americana estressou além da conta pode ser testemunhado quando o boletim Focus, que reflete as expectativas do mercado financeiro acerca da moeda brasileira, aponta uma cotação de R$ 4,1000 para o final do ano, por exemplo.
Se a moeda americana retornar ao patamar estimado, as usinas vão precisar que o açúcar em NY exceda os 16 centavos de dólar por libra-peso para propiciar a mesma rentabilidade em reais por tonelada. Uma aposta arriscada, pois os fundamentos, no momento, não corroboram com isso.
O mercado de açúcar hoje é bem diferente daquele de alguns anos atrás. Uma completa mudança de paradigma ocorreu na gestão de Pedro Parente na presidência da Petrobras no período de 2016-2018, que alterou o mecanismo de formação de preços da gasolina para o mercado interno, passando a considerar o preço internacional e fazendo com que a área comercial das usinas ficasse mais atenta à arbitragem entre o hidratado e o açúcar.
Também foi uma mudança de paradigma o fato de o mercado financeiro poder oferecer nos dias atuais mecanismos de proteção que possibilitam às empresas escolher o hedge que melhor se adequa à sua realidade e ao seu apetite ao risco, que pode optar entre hedgear o açúcar ou o etanol, ao longo da existência da estrutura. A transparência na formação de preço da gasolina abriu espaço para o surgimento de operações mais bem estruturadas, que demandam um pouco mais de conhecimento dos derivativos além do be-a-bá.
Compra de puts (opções de venda) de petróleo em reais como parte de hedge cruzado para proteger o etanol de eventual queda é apenas um exemplo da criatividade dos traders mais antenados. O lado bom de todo essa transformação vivida pelo mercado no passado recente, é que com dois produtos com preços determinados pelo mercado internacional a possibilidade de estruturas de proteção, ainda que se utilizem de hedge cruzado, foi uma virada de página na maneira como a gestão de risco atuava no setor.
Em situação inédita, hoje o setor consegue - se entender que os preços dos produtos que produz são remuneradores - entrar 100% fixado e/ou protegido numa safra cuja cana ainda nem foi moída. Isso é salutar. O setor entra num período que pode trazer bons frutos, com boa margem, com melhor gestão, com atitude profissional no tratamento dos riscos.
Vender futuro e comprar uma call (opção de compra) fora do dinheiro resolve o dilema daqueles que ainda olham a tela sonhando com preços mais altos. Melhor garantir o preço de venda agora e abrir mão de um pequeno pedaço dele gastando com seguro, do que ficar com cara de quem perdeu no pôquer para uma trinca de 2.
A próxima safra será mais açucareira, muito mais em função de as usinas estarem aproveitando preços altos e dólar forte, do que deliberadamente terem decidido isso. Uma grande parte vai virar o mix simplesmente porque fixou bons preços em NY.
A preocupação legitima de alguns traders é de que acima de 15 centavos de dólar por libra-peso, o mundo vai continuar a produzir bastante açúcar e, portanto, inundar o mercado internacional. Espertos são aqueles que se antecipam a essa questão. No entanto, é bom lembrar que o petróleo está com os preços deprimidos. Nesse cenário, se o petróleo subir e o real continuar fraco, a coisa pode ficar bem interessante.
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