4,8 milhões no País desistem de procurar emprego
Com mais tempo de espera na fila do emprego, bateu recorde no segundo trimestre o contingente de brasileiros que desistiu de procurar trabalho, informou nesta quinta (16) o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Segundo o instituto, a taxa de desalento chegou a 4,4% no período, a maior da série histórica iniciada em 2012. Ao todo, 4,833 milhões de pessoas gostariam de trabalhar, mas não procuraram emprego no trimestre.
No trimestre, foi recorde também o percentual de brasileiros que está buscando emprego há mais de dois anos: 3,162 milhões de pessoas, ou 24,4% daqueles que procuraram trabalho. A dificuldade para encontrar uma vaga é uma das razões que leva a pessoa ao desalento.
De acordo com o IBGE, cerca de 203 mil pessoas se somaram ao contingente de desalentados no segundo trimestre, na comparação com os três primeiros meses do ano. Em um ano, foram 838 mil pessoas.
"São pessoas que não foram consideradas desocupadas, mas que se você oferecer emprego, elas estão dispostas a trabalhar. Isso mostra que a desocupação pode ser muito maior do que ela realmente é", disse o coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE, Cimar Azeredo.
O crescimento se deu em um período de queda da taxa de desemprego, que foi de 12,9% no segundo trimestre, contra 13,1% nos três primeiros meses do ano. O resultado, porém, foi ajudado pelo aumento do desalento e da subocupação.
A quantidade de pessoas que trabalham menos do que gostariam chegou a 6,5 milhões, ou 7,1% da força de trabalho. Em um ano 679 mil brasileiros obtiveram trabalho nessas condições.
A taxa de subocupação foi de 7,1%, contra 6,8% no trimestre anterior e 6,5% no mesmo período de 2018. Ao todo, 6,5 milhões de brasileiros trabalham menos do que gostariam, segundo o IBGE
"Os dados mostram que o cenário no mercado de trabalho brasileiro não é tão favorável quanto aparenta", comentou Azeredo.
No trimestre, a taxa de subutilização da força de trabalho, que inclui os desempregados, os desalentados e pessoas que gostariam de trabalhar mas não procuraram emprego foi de 24,6%, o que representa 27,6 milhões de pessoas, informou o IBGE.
O resultado é ligeiramente menor do que os 24,7% registrados nos três primeiros meses do ano, mas é a maior para um segundo trimestre desde o início da série histórica do IBGE, em 2012. Com relação ao segundo trimestre de 2016, são 1,3 milhão de pessoas a mais.
O cenário do mercado de trabalho é pior na região Nordeste, onde a taxa de desemprego foi de 14,8% no segundo trimestre. Lá, também estão as maiores taxas de desalento do país, de 16,2% - em Alagoas, chega a 16,6%; no Maranhão, a 16,2%.
No Sudeste, a taxa de desemprego é de 13,2%, puxada pelo Rio, com 15,4%. Em São Paulo, foi de 13,6% em junho, estável com relação ao mesmo período do ano anterior. Nos dois estados, houve queda no contingente de trabalhadores com carteira de trabalho, que atingiu o menor nível da série histórica: 9,944 milhões e 2,787 milhões.
Azeredo diz que os números preocupam, pois são considerados dois "estados-faróis". "Tudo o que acontece neles, costuma se repetir no resto do país", afirmou o economista do IBGE.
23% dos desempregados são chefes de família
Há sete meses, Antônio Carlos Santos Caires, 46, tenta uma recolocação no mercado.
Ele perdeu o emprego como analista de distribuição em uma empresa de comunicação em janeiro e, desde então, engrossa uma estatística que reforça o cenário de deterioração do mercado de trabalho brasileiro: o desemprego a partir dos 40 anos.
Esse grupo ainda tem taxas de desemprego menores do que o dos jovens, mas vem ganhando cada vez mais espaço entre o contingente de brasileiros em busca de trabalho.
No segundo trimestre, os brasileiros com idade entre 40 e 59 anos representavam 22,7% dos desempregados.
São 2,95 milhões de pessoas, crescimento de 131% em relação ao segundo trimestre de 2014, antes da crise econômica que teve impactos profundos no mercado de trabalho.
No período, 1,67 milhão de trabalhadores dessa faixa etária perderam o emprego.
"É preocupante, porque mostra que o desemprego atingiu uma parcela da população que não pode de forma nenhuma ficar desempregada", diz o coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE, Cimar Azeredo.
Em geral, são chefes de família e, ao contrário dos mais jovens, têm menor possibilidade de voltar à casa dos pais.
A taxa de desemprego entre os brasileiros de 40 a 59 anos é de 7,5%, bem abaixo da média —no segundo trimestre, foi de 12,4%— e dos indicadores das parcelas mais jovens da população --na faixa de 18 a 24 anos, chega a 26,6%, e na de 25 a 39, a 11,5%.
Trata-se, porém, de um grupo tradicionalmente com maior resistência ao desemprego, por ter um nível de qualificação mais elevado, e com maior potencial para empreender, mesmo que na informalidade.
Por isso, diz o coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE, a aceleração do desemprego nesse grupo é um sinal a mais de deterioração do mercado, que já vem empurrando cada vez mais gente para o desalento --quando a pessoa desiste de procurar nova vaga.
"Quando o desemprego atinge essa parcela da população, é um sinal de que nem a informalidade está dando conta de absorver as pessoas que perdem o trabalho, que a precarização do mercado é bastante forte", diz ele.
Com três filhos, Caires vem recorrendo a bicos para pagar as contas: conserta celulares e aparelhos eletrônicos.
A família também está se virando para ajudar. A mulher trabalha como freelancer em um salão de beleza e a filha mais velha, de 18 anos, terminou o ensino médio e trabalha em um bico como monitora em transporte escolar para colaborar.
"Tratamos um mês de cada vez. O bom é que todos são muito participativos, então eu mostro o que dá para dar para cada um de mesada por mês, quando dá, e o que vai para pagar as contas", diz ele, que sacou nesta quarta-feira (15) a última parcela do seu seguro-desemprego.
Com outros dois filhos de 11 e 12 anos, Caires afirma que, para ajustar o orçamento reduzido às necessidades da casa, reúne todos para mostrar o que a família dispõe por mês. "É uma situação difícil, mas acho que é um aprendizado para a vida deles também."
A família cortou as saídas para o cinema, jantares fora de casa e provavelmente não renovarão o seguro do carro no próximo mês. "Só vou fazer isso se tiver um emprego."
Além da dificuldade de sustentar a casa sem ter um salário fixo, Caires afirma que a cada dia que passa, acha a recolocação mais difícil, outro ponto de preocupação apontado pelo coordenador do IBGE em relação a essa parcela da população.
A fila do desemprego só aumenta no país. No segundo trimestre, 3,16 milhões de pessoas estavam há mais de dois anos procurando trabalho sem encontrar, o maior número desde o início da série histórica, em 2012.
Segundo Azeredo, a recolocação é mais difícil para faixas etárias mais elevadas.
"Me cadastrei em diversas agências de emprego e até hoje só me pediram um currículo para entrevista, que foi por indicação", diz Caires.
Ele afirma que, para não desanimar, segue a rotina de enviar currículos e checar o email pela parte da manhã e, no período da tarde, corre com os bicos.
Além de crescer entre os mais velhos, o desemprego afeta mais pretos e pardos.
Dos 12,9 milhões de desempregados no segundo trimestre, 64,1% se declararam pretos e pardos.
Em 2012, quando a série histórica da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua) foi iniciada, pretos e pardos representavam 59,1% do total de desempregados.
No trimestre encerrado em junho, segundo o IBGE, a taxa de desemprego de entrevistados que se declararam pretos era de 15% enquanto a de pardos, de 14,4%. Entre os que se declararam brancos, o número era menor: 9,9%.
Para o coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE, o dado reforça a necessidade de políticas para reduzir as desigualdades no mercado de trabalho brasileiro.
Em relação ao nível de instrução, o desemprego é bem maior entre aqueles que não completaram ensino médio (21,1%).
Entre os que têm curso superior completo, é de 6,3%.
Em relação ao contingente de desempregados, porém, o maior grupo é aquele que tem ensino médio completo (Folha de S.Paulo, 17/8/18)