A Lei Geral de Licenciamento Ambiental – Editorial O Estado de S.Paulo
Passa da hora de o Congresso avançar com um projeto que já tramita há 16 anos.
Há nada menos do que 16 anos tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei (PL) 3.729/2004, que trata de uma nova Lei Geral de Licenciamento Ambiental. É um projeto de suma importância para o País. Tanto é assim que, recentemente, passou a tramitar em regime de urgência, ou seja, a deliberação em plenário será feita sem que o projeto passe por novas comissões temáticas. Entre muitas idas e vindas, o projeto ganhou novo impulso há cerca de um ano e meio, quando o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP) foi designado pelo presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), relator de um texto substitutivo.
Desde então, o deputado Kim Kataguiri coordenou uma série de reuniões de trabalho envolvendo ambientalistas, empresários do agronegócio e parlamentares, entre outros atores, com o objetivo de chegar a um consenso que permita a conclusão do relatório sem o fatiamento do PL 3.729/2004, vale dizer, sem que os interesses de cada setor sejam contemplados em projetos apartados. A estratégia é correta. Afinal, trata-se de uma proposta de lei geral. Ao mesmo tempo, a concertação de todos esses interesses, por vezes colidentes, tem sido o maior desafio para o avanço de um projeto que está há tanto tempo em discussão.
Até agora, já houve quatro versões do relatório do deputado Kim Kataguiri. A última, apresentada em agosto do ano passado, foi duramente criticada por ambientalistas, incluindo um grupo de ex-ministros do Meio Ambiente. Para o deputado, as críticas ao seu relatório foram “baseadas em mentiras” e feitas por quem “não leu o documento”. Ao Estado, Kim Kataguiri disse que a nova rodada de negociações está na fase final e que seu relatório deverá ser apresentado até o fim deste mês. Espera-se que esta nova versão seja consensual e que o projeto possa, enfim, avançar. Rodrigo Maia não pretende levar o PL 3.729/2004 ao plenário sem que haja acordo sobre o texto.
É preciso dar celeridade à aprovação de um novo marco regulatório para o licenciamento ambiental por duas razões, basicamente. Primeiro, porque a exigência constitucional de um “estudo de impacto ambiental antes da instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente” – art. 225, § 1.º, inciso IV –, em que pese sua justeza, tem sido desvirtuada ao longo dos anos, convertida em óbice praticamente intransponível para os que desejam desenvolver uma atividade econômica. Não raro, esse emaranhado de normas e regulamentações se converte em um fim em si mesmo, um pesadelo burocrático que pouco contribui para a efetiva proteção do meio ambiente.
Segundo, porque uma nova lei, mais equilibrada, mais adequada aos interesses nacionais e mais alinhada às modernas técnicas produtivas, que não degradam o meio ambiente, há de acabar com a barreira que opõe, de um lado, ambientalistas e, do outro, representantes do setor produtivo, como se o desenvolvimento econômico e a preservação ambiental fossem objetivos conflitantes, quando são complementares.
O projeto sob relatoria do deputado Kim Kataguiri traz inovações muito interessantes para as regras de licenciamento ambiental. Algumas delas, mera questão de bom senso. Por exemplo, produtores que já tenham licença ambiental para um determinado cultivo não terão de obter outra caso desejem mudar o tipo de plantação no mesmo local licenciado. Essa medida tende a reduzir o custo de produção. As despesas com licenciamento ambiental são estimadas em quase 30% do valor total de um empreendimento.
Um marco de licenciamento ambiental mais justo, equilibrando duas agendas de interesse nacional (o desenvolvimento econômico e a preservação ambiental), dará ao País um instrumento legal capaz de garantir que a um só tempo o direito dos cidadãos a um meio ambiente “ecologicamente equilibrado” seja garantido, como determina a Lei Maior, e o setor produtivo não seja tolhido por uma legislação obsoleta que facilita a corrupção e não cumpre a finalidade a que se destina (O Estado de S.Paulo, 17/8/20)