Açúcar: Em busca da pedra filosofal – Por Arnaldo Luiz Corrêa
“Não pode haver uma crise na próxima semana. Minha agenda já está cheia” - Henry Alfred Kissinger, diplomata americano
O mercado futuro de açúcar em NY teve uma semana de revigorante recuperação dos preços, chegando novamente a flertar com os 12 centavos de dólar por libra-peso para o contrato com vencimento em julho/20, cujas opções vencem na próxima sexta-feira e a expiração do futuro no último dia deste mês. O fechamento do açúcar na sexta-feira marcando 12.05 centavos de dólar por libra-peso representa uma alta de 112 pontos em relação à semana anterior, ou quase 25 dólares por tonelada.
No entanto, o real também experimentou grande valorização na semana, fazendo com que a cotação da moeda americana encerrasse abaixo dos R$ 5,0000, negociando próximo dos R$ 4,9600. Para a maioria das usinas, o que importa é o fechamento em reais por tonelada. Nesta sexta, o contrato de NY finalizou cotado ao equivalente a R$ 1,373 por tonelada, cerca de R$ 35 por tonelada acima do fechamento da semana anterior.
Para ilustrar a recente recuperação de NY é importante observar o histórico de preços praticados recentemente no mercado. Por exemplo, o valor médio do fechamento diário do contrato futuro de açúcar no mês de abril foi de R$ 1,229 por tonelada, enquanto que em maio a média atingiu R$ 1,379 por tonelada e no junho, até o momento, R$ 1,359 por tonelada. Usinas que focaram as fixações de seus açúcares de exportação em reais por tonelada se deram muito bem.
Este mês de junho será crucial para entender qual a estratégia a ser usada pelos principais players do mercado no que diz respeito à magnitude do volume de açúcar que será entregue contra o terminal nos meses de julho e outubro. Entendemos que a economia global ainda não refletiu em toda sua extensão o tamanho do buraco no consumo causado pela pandemia do coronavirus. Não temos elementos factíveis, nesse momento, que nos permitam conjecturar, ainda que usando generosa dose de otimismo, que o Brasil será capaz de exportar mais de 30 milhões de toneladas de açúcar como afirmam vários analistas de mercado. A única ressalva para trazer esse número no campo da exequibilidade seria se tivéssemos duas gigantescas entregas.
Nosso ponto diz respeito apenas à demanda, pois logística não é o problema. O Brasil já exportou quase 4 milhões de toneladas de açúcar num único mês, em outubro de 2012, portanto, pode repetir.
Acredito que as usinas devem continuar a aproveitar os preços remuneradores propiciados pelo mercado para esta e para a próxima safra. Temos que observar atentamente a trajetória do real, que se valorizou refletindo “sabe-se lá o que”, como disse um economista, com toda a humildade, reconhecendo que nem sempre conseguimos ver claramente as reações do mercado. O açúcar, por exemplo, subiu seguindo o rastro do cenário macro, alimentado pelos fundos (que agora estão comprados uma mixaria de 8,700 lotes), compras abastecidas pelos algoritmos de robozinhos mais excitados e a melhora na percepção do mercado de energia.
De qualquer forma, aguardar melhores preços e cenários róseos no meio de uma pandemia que já matou mais de 30,000 pessoas no Brasil, comandado por um presidente que calado é um poeta, é risco demasiado para qualquer um. Portanto, é bom ter disciplina e foco. De maio para cá, a correlação do real com o açúcar chega a 83%, ou seja, cada 1% de variação no real em relação ao dólar corresponde a uma variação de 0.83% do açúcar em NY.
Desde priscas eras o homem almeja prever o futuro. Vale tudo para antever, prognosticar, antecipar o que vai ocorrer adiante: pode-se usar a astrologia, a quiromancia, a tasseografia, a conchomancia, a cartomancia entre tantos métodos de adivinhação disponíveis. O objetivo de se usar esses “recursos” é sempre o mesmo: antecipar-se aos acontecimentos e ganhar dinheiro, prestígio, poder, etc.
No mercado financeiro não é diferente quando se fala em previsão (preço das commodities, taxa de câmbio, taxa de juros, etc). A notável diferença é que as metodologias do mercado financeiro são mais sofisticadas, mais elaboradas, numa roupagem mais elegante, muito embora não raramente com eficácia igualmente discutível.
Um amigo economista costuma dizer em suas concorridas palestras que a semelhança entre economistas e astrólogos é que ambos erram nas previsões, só que com os astrólogos a história contada é muito mais interessante do que simplesmente o discurso frio dos números.
Várias empresas destinam centenas de milhares de dólares na elaboração de modelos matemáticos que analisam distintas variáveis determinantes na formação de preço das commodities que negociam e, uma vez criado esse algoritmo e coletado os valores dele dependentes, o programa vai fornecer o exato valor que aquela commodity deve negociar e então a empresa ganhará milhões e milhões de dólares se antecipando ao mercado. Certo? Errado.
Modelos são importantes como mais uma ferramenta disponível na cabine de comando do tomador de decisão. Nenhum modelo é capaz de prever oscilações bruscas no mercado causadas por fatores exógenos, tais como guerras comerciais, a crise de 2008, as pandemias, o 11 de setembro, o Brexit, furacões, Brumadinho, a eleição de Trump, as falas de Bolsonaro entre outras. Nenhum modelo consegue prever um Cisne Negro. No entanto, penso que os modelos são importantes instrumentos para ajudar na tomada de decisão desde que não se crie uma enorme dependência deles.
São mais razoáveis os parâmetros simples para se deliberar uma política de fixação de preços, por exemplo. Qual o custo de produção vis-à-vis a fixação de preços em reais por tonelada, ou quanto determinado nível de preços em reais por tonelada afeta o EBIT da empresa, quanto mais ou menos a empresa deve travar seu preço de venda tendo em vista o câmbio, a margem de contribuição etc.
A Archer Consulting tem um modelo de previsão de preços que são fornecidos aos clientes. Nos doze meses que antecederam o debacle causado pela pandemia global, o modelo tinha uma acurácia muito boa, oscilando no máximo 4%. No mês de março, após o início da crise global, ele descolou 20%. Reforça a máxima de que os modelos funcionam até que param de funcionar. Mas, vamos continuar em busca da Pedra Filosofal.
A boa notícia da semana é a linha de financiamento aprovada pelo BNDES no valor de R$ 3 bilhões para financiar a estocagem de etanol.
Temos recebido muitos e-mails de pessoas interessadas no Curso Intensivo de Futuros, Opções e Derivativos – Commodities Agrícolas. Estamos aguardando a volta das atividades dos hotéis para poder remarcar o curso que foi suspenso em março e abrir uma outra turma que poderá ser presencial ou on-line, dando oportunidade àquelas pessoas que sempre quiseram fazer nossos cursos, mas devido à distancia e logística não puderam ainda faze-lo. Manteremos vocês informados (Arnaldo Luiz Corrêa é diretor da Archer Consulting - Assessoria em Mercados de Futuros, Opções e Derivativos Ltda.)