Açúcar: Mercado difícil para quem é de carne e osso
Por Arnaldo Luiz Corrêa
O mercado de açúcar, uma vez mais, sofreu uma acentuada queda durante a semana, chegando a negociar no contrato com vencimento em maio/2018 12.75 centavos de dólar por libra-peso, o valor mais baixo desde junho do ano passado. O valor por tonelada do fechamento de NY nesta sexta-feira chegou a 959 reais, também o mais baixo desde janeiro e, se corrigido pela inflação brasileira, o mais baixo desde junho de 2015. Só para constar, a média corrigida dos últimos oito anos é de R$ 1.308 por tonelada, não corrigida cai para R$ 1.029 por tonelada. Hoje estamos 27% abaixo.
A Índia foi o protagonista por essa queda vertiginosa das cotações em NY com as previsões de safra cada vez mais volumosas daquele país produtor, que estimularam novas vendas por partes dos fundos. Esses, de acordo com o número publicado nesta sexta-feira, estão vendidos 129.000 lotes, ou equivalente a 6.6 milhões de toneladas de açúcar ao preço médio, segundo nosso modelo, de 13.92 centavos de dólar por libra-peso com um lucro não-realizado de US$ 150 milhões. Devem ter aumentado novamente a posição com o derretimento do mercado na quarta-feira.
Como dissemos em comentário anterior, os fundos não têm a menor pressa de liquidar suas posições e, portanto, a recuperação do mercado deverá levar algum tempo. Independentemente do tamanho do superávit mundial, seja de 5 ou de 10 milhões de toneladas de açúcar, o fato é que nenhum país consegue produzir açúcar nos atuais níveis de preço em NY (no Centro-Sul o custo FOB Santos, para as empresas mais eficientes é de 13.50 centavos de dólar por libra-peso, portanto, 66 pontos abaixo do preço atual).
Em commodities, numa circunstância em que há a percepção de excesso de produto no mundo, pouco importa qual o custo de produção no curto prazo. Ele será determinante para as safras seguintes, não na corrente. Foi assim, por exemplo, em 1999 quando o custo de produção no Centro-Sul era cerca de 6.00 centavos de dólar por libra-peso FOB e o mercado futuro negociava na mínima de 4.36. No ano seguinte, a região sofreu uma redução de 22% na produção de cana e 26% na produção de açúcar, moendo 205 milhões de toneladas (a mesma produção de cinco anos antes) comparada a 264 na safra anterior.
A situação financeira delicada de boa parte das usinas propicia, pela própria pressão do caixa, tomada de decisões baseada no pânico. Tem gente séria que teme que o mercado caminhe para um dígito. Na última vez que isso ocorreu, em junho de 2008. Não me parece fazer sentido esse temor, assim como não há necessidade de ficar de pé no peitoral da janela no último andar do edifício esperando dar um passo à frente. Notícias requentadas num mercado sem atividade ganham renovada roupagem baixista e validam o aumento dos volumes vendidos pelos fundos. E os produtores se desesperam.
Enquanto isso, no mundo real que vai determinar preços lá adiante, importantes pontos devem ser observados com o devido cuidado. A safra de cana no Centro-Sul, cujo número da Archer Consulting é de 580 milhões de toneladas de cana, já está acima do número que começa a sair do forno de vários analistas e usinas. Caminha para um número bem menor. Mesmo o mix de açúcar, cujo nosso número é de 41.4%, também deverá sofrer redução privilegiando a produção de etanol.
Preços baixos do açúcar aceleram a tomada de decisão (acertada), por parte das usinas, de aumentar seu mix para o etanol e em alguns casos negociar o washout de contratos comerciais de açúcar direcionando a cana para etanol, enquanto se observa que o consumo do hidratado cresceu 45% em jan-fev 2018 em comparação ao mesmo período do ano passado e é negociado no mercado ao equivalente a 17.50 centavos de dólar por libra-peso.
Mas nenhum desses argumentos é garantia de que os preços não vão continuar caindo. Do outro lado estão os fundos com seus robôs, algoritmos e outras ferramentas que extraem o fator emocional do processo decisório. É um momento difícil para quem é de carne e osso. Ainda mais se tem que fixar preços.
O modelo desenvolvido pela Archer Consulting aponta que até o pregão do dia 28 de fevereiro, as usinas já haviam hedgeado 11,83 milhões de toneladas de açúcar, ao preço médio de 15,51 centavos de dólar por libra-peso FOB, sem prêmio de polarização, o que deve representar aproximadamente 42,6% do total estimado da exportação brasileira de açúcar para o próximo ano.
O preço médio de fixação, segundo o modelo, é de R$ 1,142 por tonelada, incluindo o prêmio de polarização e ajustado pelo NDF (contrato a termo de dólar com liquidação financeira). Esse valor é equivalente a 49.72 centavos de real por libra-peso. O dólar médio obtido pelas usinas foi de 3.2060 reais. O percentual acumulado no ano, de 42.6% é o menor desde 2015/2016. Na safra passada, nesse mesmo período, o percentual de fixação estava em 52.4%.
É importante notar que se o Brasil diminuir suas exportações de açúcar para 24 milhões de toneladas, já estaríamos hedgeados em quase 50% da safra, exercendo menor pressão nos mercados futuros.
A tarifa aplicada pelos Estados Unidos sobre o aço brasileiro, na opinião do Professor Marcos Fava Neves, pode ser boa para o agronegócio brasileiro e explica: “Os EUA deverão ser retaliados por diversos parceiros comerciais em virtude de ter levantado essa barreira. Como grande concorrente do Brasil nas exportações do agronegócio, seja da soja, do farelo de soja, do óleo de soja, das carnes, do algodão, entre outros produtos, então se as barreiras forem nessa linha, contra os EUA, isso pode beneficiar o produto brasileiro” (Arnaldo Luiz Corrêa é diretor da Archer Consulting - Assessoria em Mercados de Futuros, Opções e Derivativos Ltda.)