Açúcar: Mercado extremamente pesado, mas quem se importa?
Por Arnaldo Luiz Corrêa
O mercado de açúcar permanece sob o bombardeio de notícias desfavoráveis à recuperação de preços. Comentários acerca de uma safra indiana continuamente crescente seguida também pela volumosa safra tailandesa reforçam a ideia de que o mundo está carregado de açúcar e o chão é o limite para os preços.
O vencimento maio/2018 na Bolsa de NY encerrou a semana cotado a 12.10 centavos de dólar por libra-peso, uma variação negativa de 24 pontos (5.30 dólares por tonelada) em relação ao fechamento da semana anterior. O spread outubro/2018-março/2019 terminou a sexta-feira cotado a 118 pontos, representando um carrego equivalente a 24.3% ao ano, convidando os atentos consumidores industriais a apontarem seus lápis para aproveitar essa enorme distorção. A estatística não mente.
Analisando os dados dos últimos 10 anos dos fechamentos diários do contrato de açúcar mais negociado em NY, cobrindo o período de abril de 2008 até final de março de 2018, observamos que em apenas 7.5% dos casos NY encerrou a sessão abaixo dos 12 centavos de dólar por libra-peso. E em apenas 2.3% das vezes encerrou abaixo de 11 centavos de dólar por libra-peso. Mercado abaixo de 10 centavos de dólar por libra-peso foi observado em apenas 0.3% das ocasiões.
Só para que o leitor possa comparar esses valores com os seus equivalentes do outro lado da curva de distribuição, podemos afirmar que em apenas 7.5% das vezes o mercado encerrou acima de 27.48 centavos de dólar por libra-peso, em 2.3% das vezes NY fechou acima de 30.79 centavos de dólar por libra-peso e em 0.3% das ocasiões o mercado terminou o pregão acima de 33.94 centavos de dólar por libra-peso. Em outras palavras, a chance de o mercado permanecer abaixo de 12 centavos de dólar por libra-peso é a mesma que ele tinha de negociar e permanecer acima de 27.48 centavos de dólar por libra-peso! Traduzindo para o português, fixar vendas a 12 centavos de dólar por libra-peso tem uma gigantesca chance de se tornar um péssimo negócio (já falamos isso na semana passada).
Agora, note como o preço está em descompasso: o fechamento do contrato com vencimento maio/2018 de açúcar em NY nesta sexta-feira, 12.10 centavos de dólar por libra-peso combinado com o fechamento do câmbio em R$ 3.4120 correspondem a um valor de 41.29 centavos de real por libra-peso. Esse valor, comparado com os fechamentos dos últimos dez anos, corrigido pelo IGPM é o mais baixo em 99.74% das vezes.
Duas notícias podem contribuir para impactar ainda mais negativamente o mercado de açúcar: a primeira, a revisão do crescimento da economia brasileira para 2018, antes falava-se em 3.5%, mas agora alguns economistas baixaram essa previsão para 2.8%. A razão é principalmente a piora do quadro político, com os ânimos exaltados depois da prisão do criminoso e ex-presidente Lula. As indefinições acerca da sucessão presidencial e se o Brasil elegerá alguém comprometido com as necessárias reformas da previdência, política e tributária contribuem apara que os investidores adiem seus investimentos. A segunda, diz respeito ao consumo de combustível ciclo Otto. No acumulado de doze meses, o crescimento do consumo foi de pífios 0.52%. A explicação pode estar no preço do combustível ao consumidor, que passa a usar menos o veículo próprio, ou restringe seu uso.
O etanol hidratado despenca no início dessa safra, como sabíamos que iria ocorrer. As usinas, em especial aquelas com sérias restrições de caixa, precisam fazer dinheiro e pressionam os preços. No entanto, acreditamos que o hidratado tem um suporte de preços muito forte ao redor de 65% do preço da gasolina. Hoje, o consumidor olha os preços do combustível no posto de abastecimento e vê o preço da gasolina com o numeral 4 na frente (R$ 4.09) e o etanol com 2 (R$ 2.89) e ele nem faz muita conta, muitas vezes ignorando que a paridade está pior que 70%, como é o caso agora, mas ele tem a sensação que com R$ 50 coloca muito mais combustível no tanque do seu automóvel. É ilusório, mas psicologicamente ativo. É essa sensação que nos faz acreditar que o limite do hidratado é 65% da paridade.
Trabalham em favor da recuperação dos preços a fricção dos Estados Unidos com a Rússia, que podem elevar o preço do petróleo no mercado internacional e melhorar a arbitragem do hidratado aumentando ainda mais o mix de etanol no Centro-Sul, e também, muito importante, o fato de o presidente Trump ter sinalizado possíveis mudanças nas leis dos biocombustíveis nos EUA que podem aumentar em 26 bilhões de litros a demanda de etanol naquele país. Essa é uma resposta às retaliações da China e certamente deixarão os produtores felizes.
Petróleo em alta e real pressionado colocam nossa estimativa de preço de realização da Petrobras em R$ 1.8700 por litro (8% acima do preço que a empresa publicou na sexta, de R$ 1.7115 por litro). Usando o preço de realização da estatal brasileira, podemos prever que o preço mínimo que o hidratado chegaria na bomba em R$ 2.5700, equivalente a R$ 1.5163 por litro na usina, sem impostos. Na sexta-feira, esse preço era R$ 1.4900 por litro aproximadamente. Ou seja, estamos no chão. Mas, ainda assim, esse preço equivale a açúcar a 14 centavos de dólar por libra-peso, mais de 150 pontos acima de NY. Se a Petrobras corrigir seu preço de realização em linha com o que estimamos que seja o valor justo, o preço do hidratado na usina deveria ser de R$ 1.6300 por litro, equivalente a NY a 15.08 centavos de dólar por libra-peso.
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É importante notar que até o final de março, 9.6 milhões de contratos foram negociados na bolsa de açúcar em NY. Caso esse ritmo alucinante de contratos negociados se mantenha, no final do ano chegaríamos a quase 38 milhões de contratos negociados (somente futuros) quebrando o recorde anterior do ano de 2015 quando 34.5 milhões de contratos foram negociados na bolsa. Para se ter uma ideia do peso desse volume negociado nos três primeiros meses do ano, em 2004 o total de contratos foi de 9.7 milhões (Arnaldo Luiz Corrêa é diretor da Archer Consulting - Assessoria em Mercados de Futuros, Opções e Derivativos Ltda.)