Açúcar: Uma granada na mão – Por Arnaldo Luiz Corrêa
Embora não tenha pego ninguém de surpresa, a posição atual dos fundos não-indexados de 134.000 lotes vendidos, divulgada nesta sexta-feira, parece-me muito vulnerável. Claro é que o preço médio de venda dos fundos desde que a posição vendida começou a ser construída permite aos seus gestores adicionar mais volume nos níveis atuais, que acabam pressionando o mercado futuro, trazendo pânico para os que estavam esperando dias melhores para fixar o açúcar físico, e – naturalmente – mostrando um excelente desempenho na marcação à mercado no final do mês passado.
Quando me refiro à vulnerabilidade dessa enorme posição vendida à descoberto, é porque entendo que todas as notícias baixistas que hoje povoam o universo açucareiro mundial estão devidamente inseridas nos preços. Refletidas em toda sua extensão e até mesmo, como ocorre quase sempre, levando a curva de preço demasiadamente longe do custo de produção. Ora, quem se importa com custo de produção, não é mesmo? Pois bem, hoje no mundo não tem ninguém que consiga produzir açúcar com margem de lucro, pagando os custos financeiros, se tomarmos por base o preço de fechamento do contrato futuro em NY com vencimento para outubro de 2018, nesta sexta-feira, cotado a 10.85 centavos de dólar por libra-peso. Ninguém.
A questão que vejo de maneira preocupante, se eu estivesse sentado na cadeira do gestor de um fundo especulativo não indexado, é se o potencial de lucro dessa gigantesca posição vendida à descoberto compensa substancialmente o risco inerente que ela tem se tivermos um problema de climático, por exemplo. Vimos durante a semana que as temperaturas estão muito altas nesse verão europeu e que a seca pode comprometer a safra de açúcar Europeia. O mesmo vale para o Centro-Sul do Brasil. Nesta semana observamos diversas casas comerciais e respeitados consultores reduzindo suas estimativas de moagem. Há um ano apostávamos em 585 milhões de toneladas de cana para esta safra corrente, hoje 550 é um número que todos parecem convergir. E ainda assim, o mercado não reage.
Até as pedras sabem que o mercado futuro de açúcar tem tido enorme dificuldade em recuperar os preços por uma obviedade: tem mais gente querendo vender futuro do que comprar. Ora, nesse caso, por que os fundos precisariam se apressar em cobrir suas vendas, se tem mais gente (as usinas) precisando vender. Nessas horas, o gestor de carne-e-osso – sim, porque assumimos que as decisões partem de bípedes, e não por robôs alimentados por complicados algoritmos que pouco se lixam com discussões racionais e inócuas feitas por nós, humanos – aposta no pânico e desce os níveis de stop junto com o mercado. Por isso não são raros os picos de preços que temos assistido em curto espaço de tempo.
Um outro ponto que merece análise criteriosa é que no mês de julho o volume total de futuros negociados em NY foi de apenas 1,726,000 contratos, quase 2 milhões de contratos a menos do que o mês de junho e a posição em aberto no período cresceu 74,000 lotes e o mercado caiu 9%. No mês de junho, 3,720,000 contratos foram negociados, a posição em aberto caiu 72,000 lotes e o mercado caiu 8%. Em junho, provavelmente houve maior fixação de preço por parte das usinas (queda da posição em aberto), mas em julho, com muito menos volume, os fundos foram capazes de mover o mercado para níveis mais baixos, acrescentando novas vendas (aumento na posição em aberto). Com muito menos volume, eles conseguiram derrubar mais o mercado. O gestor de carne-e-osso não precisa ter pressa.
Pois bem, nesta semana os fundos recompraram parte das posições (depois da terça-feira), mas o mercado absorveu as recompras em função das fixações de preço por parte das usinas, que todo mundo sabe que estão atrasadas. Vamos imaginar que o total fixado pelas usinas até final do mês de julho (o número da Archer Consulting deverá ser divulgado aos clientes na próxima semana) seja de 75%. Normalmente, o total de fixações somadas contra os vencimentos maio-julho-outubro somam 79% ficando 21% contra o março. Vamos assumir que 30% da posição de março já esteja fixada, logo faltam ainda 70%. Se março, como dissemos, representa 21%, faltam 14.7%. Completando o raciocínio: se ainda faltam às usinas fixarem 25% da safra e se desse percentual 14.7% é do março, logo ainda faltam 10.3% a ser fixado contra o outubro. O outubro representa aproximadamente 39% da safra. Se ainda faltam 10.3%, conclui-se que as usinas ainda têm pouco mais de 25% do volume de outubro ainda a ser fixado. Isso deve dar uns 66,000 lotes.
Acredito que esse número é menor pois ele não computa as rolagens que muitas usinas fizeram passando o mês de precificação de outubro de 2018 para o março de 2019 com o objetivo de ganhar mais tempo para obter preços melhores. Se nossa leitura estiver correta, e esse número for realmente menor e no topo de tudo jogarmos os ingredientes provenientes de eventuais problemas climáticos, seja na Europa, ou mesmo no Centro-Sul, os fundos podem não encontrar mais as usinas dando-lhes liquidez na recompra e pode haver uma potencialização na reação de NY.
Em resumo: vamos observar atentamente a movimentação do spread outubro de 18 com março de 19. Os gestores podem estar com uma granada na mão. Se o pino for tirado (menor fixação por parte das usinas do que o esperado) pode explodir nas próprias mãos.
Restam apenas duas vagas para o 30º. Curso Intensivo de Futuros, Opções e Derivativos – Commodities Agrícolas que vai ocorrer nesta semana que se inicia, dias 7 (terça), 8 (quarta) e 9 (quinta-feira) de agosto, em São Paulo - SP, no Hotel Wall Street, na Rua Itapeva. O próximo vai ocorrer apenas em março de 2019 (Arnaldo Luiz Corrêa é diretor da Archer Consulting - Assessoria em Mercados de Futuros, Opções e Derivativos Ltda.)