Adubo orgânico pode ser saída para reduzir dependência da exportação
Legenda: O produtor Paulo Montenegro Fachinni está substituindo o adubo químico pelo fertilizante orgânico. Foto O Estado de S.Paulo
Fertilizantes naturais não substituem o uso dos químicos, mas podem reduzir em até 50% sua aplicação e melhorar a produtividade.
O produtor Paulo Montenegro Fachinni está substituindo o adubo químico pelo fertilizante orgânico composto em sua plantação de cana-de-açúcar, em Bocaina, no interior de São Paulo. Ele é de uma família que há mais de 120 anos cultiva cana e em 2016 aderiu ao uso do insumo, fabricado a partir da compostagem de lodos do tratamento biológico de esgotos e resíduos orgânicos agroindustriais.
“Comecei aplicando de 7,5 a 10 toneladas por hectare diretamente no sulco de plantio. Nessas operações, raramente faço complementação com fertilizantes minerais, mas, quando acho necessário, reduzo a aplicação do adubo mineral a 50% do recomendado”, disse.
O Brasil pode reduzir a dependência de adubos importados de países como a Rússia investindo mais na produção de fertilizantes orgânicos, produzidos a partir de subprodutos das atividades agrícolas, pecuária, agroindustrial e de saneamento urbano, ou seja, resíduos que normalmente são descartados. O adubo orgânico não substitui o uso do fertilizante químico, mas pode reduzir em até 50% sua aplicação e ainda melhora a produtividade da lavoura. O insumo natural facilita a absorção do fósforo pela planta, evitando que esse mineral se perca no solo e acabe contaminando os mananciais.
De acordo com o engenheiro agrônomo Fernando Carvalho Oliveira, da Tera Ambiental, especializada em reciclagem de efluentes e resíduos orgânicos, a produção de fertilizantes orgânicos no Brasil ainda está se organizando, mas tem grande potencial para crescer. Em 2020, segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Tecnologia em Nutrição Vegetal (Abisolo), o setor faturou R$ 334 milhões, 44,5% de crescimento em relação a 2019. “Com base nesse faturamento, é possível estimar que a produção seja de 1,5 milhão de toneladas ao ano”, disse.
A tecnologia mais usada pelo setor é a compostagem termofílica (micro-organismos que gostam do calor). “A produção vem numa crescente no Brasil nos últimos cinco anos, devido à satisfatória evolução do marco regulatório que orienta o segmento. As unidades fabris atualmente instaladas estão buscando aumentar sua produção ao nível máximo e ainda deve ficar aquém da demanda”, disse. Segundo o especialista, os fertilizantes orgânicos não substituem os minerais, mas contribuem para seu aproveitamento no solo, reduzindo as taxas de aplicação com ganhos de produtividade.
PRODUÇÃO
É o que o agricultor Fachinni já verificou na prática. A partir do primeiro corte da cana, ele reduziu a adubação orgânica para 5 toneladas por hectare e a adubação mineral em 40% do recomendado. Em algumas áreas que já tiveram cinco anos de aplicações sucessivas do orgânico, a redução é ainda maior. “Com essa estratégia, aliada aos demais tratos culturais, tenho alcançado produtividade acima da média regional e entendo que, com a adubação orgânica, estou investindo na qualidade do solo de minha fazenda.”
Atualmente, o preço dos fertilizantes orgânicos varia entre R$ 200 a R$ 450 a tonelada, dependendo da distância da área agrícola. A tonelada de adubo químico já custa mais de R$ 2 mil, embora a quantidade aplicada por hectare seja menor.
BENEFÍCIOS
A capacidade dos fertilizantes orgânicos de auxiliar na absorção do fósforo pela planta representa outro ganho para o ambiente. Segundo a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), análises da água coletada no reservatório de Barra Bonita, no Rio Tietê, nos últimos cinco anos, revelaram a presença de fósforo em níveis que favorecem o crescimento de algas, prejudiciais à qualidade da água. Favorece também o crescimento de plantas aquáticas, a exemplo dos aguapés que se acumulam em barragens dos reservatórios.
Reportagem do Estadão na sexta-feira mostrou a presença de algas e aguapés cobrindo grandes trechos do Rio Tietê numa extensão de 300 quilômetros, desde Anhembi, mais próximo da capital, até o reservatório da hidrelétrica de Promissão, no centro-oeste paulista.
De acordo com a Cetesb, o fósforo das águas dos reservatórios tem origem na carga difusa gerada em bacias onde predomina o uso agrícola do solo, cujo manejo envolve o uso de fertilizantes e adubos fosfatados. A aplicação desses insumos em meses chuvosos facilita o transporte do material para o Tietê (O Estado de S.Paulo, 6/3/22)