Agronegócio e coronavírus – Por Roberto Rodrigues
Apesar do coronavírus, o saldo comercial do agronegócio com a China cresceu em fevereiro.
Amanhã, 9 de março, acontecerá na São Paulo Expo a segunda versão da Anufood, uma enorme feira internacional de alimentos, onde o Brasil e os países da América do Sul exporão seus produtos alimentares exportáveis e receberão compradores do mundo todo preocupados com o abastecimento de consumidores de toda parte. E no período da tarde haverá, lá mesmo, um congresso que vai analisar em profundidade as tendências de consumo de alimentos em todo o mundo, as tecnologias utilizadas em sua produção e como isso tudo se encaixa na atual situação da economia global.
Aliás, uma economia que vem sendo estudada com muita curiosidade, tendo em vista o surto do “novo coronavírus” denominado de covid-19. De acordo com a OCDE, o mundo crescerá menos do que originalmente se calculava em razão do vírus: a projeção de 2,9% foi rebaixada para 2,4%, queda significativa. E pode piorar se a situação não for logo controlada, o que é esperado.
Tal perspectiva deverá afetar a economia brasileira em pelo menos três questões:
– Redução das exportações e em menor valor em dólar. Isso tem muito a ver com nosso mundo do agronegócio;
– Menor importação, com preços mais altos, o que afetará nossa agroindústria por causa do suprimento de componentes;
– A maior aversão ao risco por parte do mercado financeiro realimentará o valor do dólar, trará maior fuga de capitais, dificultando créditos externos.
Diante desse cenário, o Centro de Agronegócios da Escola de Economia de São Paulo, da Fundação Getulio Vargas (FGVAgro), elaborou um estudo coordenado pelo pesquisador Felippe Serigati a respeito dos efeitos imediatos sobre nosso agronegócio do ponto de vista do comércio internacional.
Analisando o comportamento do setor em fevereiro, já é possível observar:
– O índice de preços em dólar das commodities agrícolas caiu 2,8% em fevereiro em relação ao mês anterior. Mesmo assim, a contração foi menor do que a dos minerais (-6%) e das commodities energéticas (-12,7%);
– Mesmo assim, o valor das exportações do agronegócio brasileiro cresceu 3,3% em relação a fevereiro do ano passado, e surpreendentes 35,4% em relação a janeiro de 2020. Isso se explica pelo aumento do valor das exportações, de um fevereiro para o outro, de carne suína e de aves (26,3%), de carne bovina (19,3%), de soja (4,2%) e de café (3,4%);
– Em compensação, o agronegócio importou menos 12,3% em valor, relativamente ao mesmo mês do ano passado, e menos 5,8% em relação a janeiro deste ano. Destaque para a queda expressiva do valor importado de insumos agrícolas (-28,2%) e de têxteis (- 4,7%).
É muito importante avaliar especificamente a relação com a China, nosso maior parceiro comercial do agro. Vale a pena visitar a seguinte numerologia para caracterizar essa importância: no ano 2000, a China recebeu 2,5% do que nosso agronegócio exportou. E, no ano passado, nossa exportação para lá foi 30,8% de tudo o que o setor vendeu para o exterior. Foi um crescimento impressionante.
Pois bem, mesmo com a gravíssima crise causada pelo coronavírus na China, as exportações para lá de fevereiro cresceram espetacularmente em carnes: foram 70,8% mais dólares em carnes de aves e suínos em relação a fevereiro de 2019 e 43,5% a mais de carne bovina. Isso compensou com folga a redução de 13,2% das exportações de soja. E compensou também a queda das nossas importações de insumos e têxteis da China, que foi de 10%.
Resumindo: em fevereiro o coronavírus melhorou ainda mais o saldo comercial do nosso agronegócio com o gigante asiático. Precisamos acompanhar atentamente o que vai acontecer nos próximos meses.
E isso será, sem dúvida, objeto do congresso de amanhã na Anufood (Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura e coordenador do Centro de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas; O Estado de S.Paulo, 8/3/20)