AL:Parecer do Ministério Público é contra pedido de falência de 8 usinas
Promotores do órgão estadual argumentam várias irregularidades no processo.
O Ministério Público Estadual de Alagoas (MPE/AL) é contra o pedido de recuperação judicial ajuizado por um grupo de usinas porque o processo que envolve o caso foi constituído por “insanáveis defeitos e impropriedades que maculam indelevelmente o procedimento instaurado”. No parecer emitido por um grupo de promotores de justiça, estão apontadas algumas das ilegalidades cometidas, a exemplo da escolha errada da comarca onde está tramitando o processo, ausência de grupo econômico, inserção de uma empresa que não está vinculada economicamente às usinas e inclusão nos autos de duas empresas que já têm pedido de falência judicial em andamento.
O processo em discussão, de nº 0728189-20.2017.8.02.0001 e que envolve as empresas Copertrading Comércio, Exportação e Importação S.A, Usina Cansanção de Sinimbú S/A, Mecânica Pesada Continental S/A, Penedo Agro Industrial S/A, Companhia Açucareira Usina Capricho S/A, Industrial Porto Rico S/A, Usinas Reunidas Seresta S/A, Destilaria Autônoma Porto Alegre S/A e Companhia Açucareira Central Sumaúma S/A, está tramitando na 4ª Vara Cível da Capital. E esse é o primeiro ponto atacado pelo MPE/AL.
O parecer assinado pelos promotores Antônio Luiz dos Santos Filho, Elísio da Silva Maia Júnior, Eloá de Carvalho Melo, Luiz Tenório Oliveira de Almeida, Hamilton Carneiro Júnior, Carlos Davi Lopes Correia de Lima e Marlisson Andrade Silva, todos designados para atuar nesse processo pelo procurador-geral de justiça, Alfredo Gaspar de Mendonça Neto, alega que a escolha de Maceió para receber os autos da ação fere a Lei Federal nº 11.101/2005, que trata de falência e pedido de recuperação judicial. Para eles, os pedidos deveriam ter ocorrido em cada uma das cidades onde as usinas têm sua atividade desenvolvida. “É competente para homologar o plano de recuperação extrajudicial, deferir a recuperação judicial ou decretar a falência o juízo do local do principal estabelecimento do devedor ou da filial de empresa que tenha sede fora do Brasil”, argumentam os membros do Ministério Público ao fazerem referência o artigo 3o da referida norma. Inclusive, reforçam que já existe farta jurisprudência que fixou o entendimento de que o estabelecimento principal “é aquele no qual está o chamado ‘corpo vivo’ da empresa, ou seja, local onde se realizam com maior intensidade as operações econômicas mais expressivas, independentemente da fixação da sede estatutária ou mesmo da sede administrativa em comarca distinta”.
“A preocupação aqui é patente, no sentido de conferir a competência para conhecimento e julgamento das matérias relativas a falência e recuperação judicial de empresa ao juízo da comarca em cujo âmbito esteja a concentração da atividade produtiva e da execução de suas relações jurídicas, tais e quais dos contratos de trabalho, de prestação de serviço e fornecimento para o desempenho da atividade empresarial, sendo necessário, inclusive, vislumbrar a possível necessidade de que o magistrado, no amplo leque das atribuições que a legislação lhe confere, realize inspeções no parque industrial, e nos bens patrimoniais do recuperando, sendo esses atos judiciais substancialmente prejudicados, quanto a sua celeridade, se acaso necessária a expedição de várias cartas precatórias, afrontando, assim, a garantia constitucional da razoável duração do processo”, alegam os promotores, ressaltando que o magistrado que recebeu o processo, aqui em Maceió, deveria ter alegado falta de competência para atuar no caso.
Usinas já em processo de falência
O Ministério Público também apontou que o fato de as usinas Seresta e Sinimbu já estarem envolvidas em processos de falência é mais uma ilegalidade que consta na atual ação. Pela legislação, se uma empresa está em procedimento de falência ou de recuperação judicial, ela não pode ser parte em outro processo que tenha o mesmo objetivo jurídico. “Neste sentido, e conforme exegese sistemática dos artigos 6º, §8º, 76 e 115, da Lei Federal nº 11.101/2005, podemos concluir, de forma peremptória, que o juízo da falência e da recuperação judicial é uno, indivisível e universal, como sendo o único competente para conhecer todas as ações sobre bens, interesses e negócios do falido. Ademais, a prévia instauração de pedido de falência ou recuperação judicial previne a jurisdição para qualquer outro pedido de falência ou recuperação judicial, relativo ao mesmo devedor”, revela um trecho do parecer.
“Deste modo, e sem olvidar possível perquirição (averiguação) judicial de eventual má-fé processual por parte da Usina Cansanção de Sinimbu S/A e Usinas Reunidas Seresta S/A, relativa à dolosa omissão, quando do ajuizamento da presente ação de recuperação judicial, da prévia existência de processos falimentares em seu desfavor, na tentativa de burla à regra da unidade, indivisibilidade e universalidade dos processos falimentares anteriormente instaurados, em cujo contexto deveriam ser discutidas todas as questões relativas aos deveres, haveres, patrimônio e demais relações jurídicas da massa falida, deve-se impor a extinção do presente feito”, requer o MPE/AL.
Da Usina Cansanção de Sinimbu os autos do processo em trâmite são o de nº 0725099-72.2015.8.02.0001 e o pedido de falência foi requerido pelo seu credor Banco Rural S/A. Já das Usinas Reunidas Seresta S/A são duas outras ações: 0700392-89.2016.8.02.0038, cuja requerente foi a Br Parafusos Importadora Comercial Ltda e 0700232-64.2016.8.02.0038, provocada pela Lubrificação em Geral Ltda.
Inexistência de grupo econômico
As irregularidades continuam, segundo os promotores que investigaram o caso. Para eles, o pedido de recuperação judicial não poderia ter sido feito de uma só vez pelo grupo de usinas em questão porque elas não fazem parte do mesmo grupo econômico, ou seja, não pertencem ao mesmo dono e não têm em comum relações jurídicas e administrativas. Em função disso, a pluralidade processual, que envolve tantas empresas, não poderia existir.
“É muito importante aqui asseverar que não se confundem setor econômico e grupo econômico. A mera similitude ou identidade de atividade econômica desempenhada pelos pretensos litisconsortes não lhes justifica pleito de inserção em grupo econômico. Se assim fosse, todas as empresas do setor turístico, ou do setor de serviços, ou do setor industrial, ou do setor agropecuário, ou do setor comercial – ou do setor sucroalcooleiro – do Estado de Alagoas, pela simples similitude da esfera econômica, sem qualquer identidade societária, estrutural, administrativa, financeira, coordenativa ou de qualquer outra ordem, poderiam aviar pleitos plúrimos de recuperação judicial, sem que houvesse qualquer identidade ou interferência de créditos, débitos ou obrigações ou patrimônio entre si”, diz o parecer.
“Ora, sob o subterfúgio de hipotético mas inexistente grupo econômico, empresas das mais poderosas do Estado, integrantes de um setor econômico (mais uma vez não confundir com grupo econômico) que se notabilizou pelo famoso acordo dos usineiros e tantas outras manobras formais e informais, em defesa de interesses econômicos muitas das vezes egoísticos, em nítido prejuízo ao crédito de terceiros (e até mesmo do Estado) tentam, mais uma vez, contar com o beneplácito dos poderes constituídos, em prol de sua única pauta econômica, para obter mais e mais benefícios às custas de muito suor e sangue alheio”, acusa o Ministério Público.
Ilegitimidade da Copertading Comércio, Exportação e Importação S/A
Por fim, o MPE/AL alega que a Copertrading Comércio, Exportação e Importação S.A. não tem legitimidade para figurar na ação. “Ela não demonstrou possuir, de fato, nenhuma ascendência ou descendência administrativa, jurídica ou econômica com relação às pessoas jurídicas (leia-se usinas) em pretensa recuperação judicial”, argumentaram os promotores. E, ainda que tivesse esse vínculo, uma cooperativa é regida por legislação própria e não pode fazer parte de um processo de recuperação judicial ou de pedido de falência.
Os pedidos
O parecer do Ministério Público fez uma série de pedidos ao Poder Judiciário. O primeiro deles é que é que a competência jurisdicional seja revista, uma vez que a ação deveria tramitar em cada comarca onde a usina está instalada. Na sequência, que as usinas Sinimbu e Seresta sejam extintas dos autos, já que elas têm pedido de falência em trâmite. Pedido semelhante também ocorre com relação a Copertrading Comércio, Exportação e Importação S.A. que, por ser cooperativa, não poderia estar dentro do processo.
Os promotores de justiça também requereram que as usinas enviem a relação integral dos empregados e a relação completa dos bens particulares de todos os sócios controladores e dos administradores dos devedores, inclusive no exterior e extratos atualizados das contas bancárias e de suas aplicações financeiras de qualquer modalidade, até mesmo em fundos de investimento ou em bolsas de valores, emitidos pelas respectivas instituições financeiras.
E por último, ainda foi solicitada a relação individualizada das dívidas de cada usina (Tribuna Hoje, 8/2/18)