28/11/2024

Após crise da carne, comissão do Senado convida CEO do Carrefour e embaixador francês

Após crise da carne, comissão do Senado convida CEO do Carrefour e embaixador francês

SENADORA TEREZA CRISTINA— Foto- Valter Campanato -Agência Brasil

Senadora Tereza Cristina diz que não dá para admitir que coloquem uma imagem ruim e falsa sobre os produtos brasileiros.

A Comissão de Relações Exteriores do Senado aprovou nesta quarta-feira (27) um convite ao embaixador da França e ao CEO do Carrefour no Brasil para que eles se posicionem a respeito da crise desencadeada pelo boicote da rede francesa à carne brasileira.

"Colocar uma imagem ruim, falsa, sobre os produtos brasileiros, não podemos admitir. O pedido de desculpas do CEO francês [do Carrefour] foi um pedido pífio, em que ele não pede desculpas coisa nenhuma", disse a senadora e ex-ministra da Agricultura Tereza Cristina (PP-MS), autora do pedido.

"Ele diz: Francês compra de francês, da União Europeia, o Carrefour brasileiro que compre dos brasileiros. Essa foi a desculpa dele, e ainda fez um pequeno deboche, na minha opinião, ao dizer que a carne brasileira é gostosa. Concordo com ele que a carne brasileira é boa, tem qualidade e é gostosa."

A senadora afirmou ser preciso entender o porquê "da escalada" contra a carne brasileira e destacou que há outra rede na França colocando em dúvida a qualidade dos produtos nacionais. A rede de supermercados francesa Intermarché também anunciou boicote às carnes bovinas, suínas e aves produzidas em países da América do Sul em geral.

Tereza disse ainda que a ministra da Agricultura francesa fez "duas declarações desastrosas" sobre o tema.

Por se tratar de convite, os dois não são obrigados a ir ao Senado Federal. A medida, entretanto, pode soar desrespeitosa ao Brasil, sobretudo por parte da Embaixada da França. Ainda não há data para a reunião na Comissão de Relações Exteriores.

Tereza também destacou a reunião nesta terça-feira (26) da Assembleia Nacional da França, que rejeitou por 484 a 70 votos o acordo União Europeia-Mercosul —resultado que só tem valor simbólico— e pediu retratação às falas pejorativas contra a carne brasileira.

O presidente da comissão, Renan Calheiros (MDB-AL), disse que as declarações do CEO global do Carrefour são "descabidas, afrontosas, absurdas" e afirmou que a medida causou prejuízos à imagem da produção nacional.

Nesta terça, o Ministério da Agricultura e Pecuária publicou em seu site um "pedido de desculpas do diretor-presidente do Grupo Carrefour", em carta assinada pelo executivo Alexandre Bompard. O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, deu por resolvida a crise (Folha, 28/11/24)

 



Ministra francesa reprova acordo UE-Mercosul; tom conciliador sobre Brasil

Ministra da Agricultura da França, Annie Genevard, discursa no Parlamento sobre acordo entre União Europeia e Mercosul. Foto  Stephanie Lecocq -Reuters

Annie Genevard diz que França não pretende estigmatizar 'amigos' da América do Sul.

A ministra da Agricultura da França, Annie Genevard, tentou apaziguar nesta quarta-feira (27) a polêmica entre seu país e o Brasil por causa da possível assinatura do acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul.

"Aproveito a ocasião para tranquilizar nossos parceiros da América Latina. Não queremos recolocar em causa a relação que, pela sua profundidade histórica, une nossos continentes", disse Genevard em discurso no plenário do Senado francês, que realizou sessão para debater o acordo.

No entanto, a ministra reiterou a posição francesa, oposta à assinatura do texto —que pode ocorrer na semana que vem durante a cúpula do Mercosul em Montevidéu.

O acordo é criticado pelos agricultores franceses, que desde a semana passada protestam bloqueando estradas. Ele cria cotas livres de tarifas para a entrada de produtos do bloco sul-americano na União Europeia, como a carne, em troca de redução recíproca para a importação de automóveis e outros produtos europeus.

Pouco antes de discursar, em entrevista ao canal de TV do Senado francês, Genevard disse compreender a reação do governo brasileiro às críticas feitas por políticos franceses aos produtos do Mercosul —sobretudo a carne brasileira, acusada de ser produzida à custa de desmatamento e uso de antibióticos, hormônios e pesticidas proibidos na União Europeia.

"Da parte dos brasileiros, há uma reação de defesa do orgulho nacional, quase. Mas não há da parte da França uma estigmatização dos países da América do Sul, que são países amigos", afirmou a ministra.

 Genevard comentou ainda, em tom cauteloso, sem citar nominalmente o Carrefour, a nota oficial divulgada na véspera pela empresa, encarada como um recuo em relação à decisão de suspender a venda de carne do Mercosul nos supermercados franceses.

 "O grupo em questão deve ter se dado conta de que é um fio da navalha", disse a ministra, referindo-se à dificuldade do Carrefour em conciliar seus interesses na França e no Brasil.

 Na terça-feira (26), a Assembleia Nacional francesa rejeitou o acordo, por 484 votos a 70. A votação só teve significado simbólico, uma vez que o texto é negociado entre os blocos comerciais e aprovado sem passar pelos parlamentos nacionais.

 A sessão da Assembleia foi marcada por discursos duros contra o Mercosul.

 O deputado Vincent Trébuchet, de direita, afirmou que os pratos dos franceses "não são latas de lixo". A conta do deputado no Instagram foi invadida por brasileiros, a esmagadora maioria indignados com a declaração.

 O presidente Lula fez referência ao discurso de Trébuchet nesta quarta-feira, na abertura do encontro nacional da indústria, em Brasília: "Eu quero que o agronegócio continue crescendo e causando raiva num deputado francês que hoje achincalhou os produtos brasileiros."

 No debate desta quarta, os senadores franceses, assim como os deputados na véspera, pintaram um retrato de um Brasil onde carne e milho são produzidos em condições inaceitáveis.

 O senador Yannick Jadot, ecologista, chegou a acusar o Brasil de usar "trabalho forçado" na produção de carne: "Quem já visitou um abatedouro no Brasil [constatou] condições absolutamente dramáticas de sofrimento animal, sabendo que muitos trabalhadores são forçados neles, é o trabalho forçado no Brasil".

 Lembrou ainda que, "quando Bolsonaro esteve no poder, ele não só incendiou a Amazônia para o agronegócio: autorizou vários pesticidas extremamente perigosos, e [Javier] Milei certamente fará o mesmo [na Argentina]."

 O comunista Fabien Gay também criticou Milei, mas elogiou o atual presidente brasileiro: "Enquanto o presidente Lula rompeu com a linha de seu antecessor em relação ao meio ambiente, o presidente Milei afirma que o aquecimento do clima é uma mentira".

 Gay acusou o "setor agroindustrial" brasileiro de desrespeitar os direitos dos "povos autóctones" e privar de terras 4 milhões de "pequenos camponeses"

O Senado também fez uma votação simbólica e rejeitou o acordo por 338 votos contra 1 (Folha, 28/11/24)



Lula defende agro forte 'para causar raiva' em quem critica carne brasileira

Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Foto André Borges - Efe

 

Presidente repetiu que França 'não apita nada' no acordo entre Mercosul e União Europeia. Lula participou da abertura do encontro nacional da indústria, em Brasília.

 

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) rebateu nesta quarta-feira (27) a crítica de um deputado francês, que comparou a carne brasileira a "lixo". Disse querer que o agronegócio continue crescendo para "causar raiva" em quem faz essas críticas.

 

Acrescentou que pretende ainda neste ano assinar o acordo entre o Mercosul e a União e a União Europeia, independentemente da resistência apresentada: a "França não apita nada", afirmou, em referência a declarações recentes do presidente Emmanuel Macron contra a assinatura.

 

"Eu quero que o agronegócio continue crescendo e causando raiva num deputado francês que hoje achincalhou os produtos brasileiros, porque vamos fazer o acordo do Mercosul nem tanto pela questão dinheiro. Vamos fazer porque eu estou há 22 anos nisso", afirmou.

 

"E, se os franceses não quiserem o acordo, eles não apitam mais nada. Quem apita é a Comissão Europeia e a [presidente da Comissão] Ursula Von der Leyen tem procuração para fazer o acordo. E eu pretendo assinar esse acordo neste ano ainda."

 

A fala de Lula acontece em meio à controvérsia envolvendo a rede de supermercado francesa Carrefour, que anunciou que deixaria de comprar carnes brasileiras.Nesta terça-feira, durante sessão da Assembleia Nacional Francesa que aprovou um veto simbólico ao acordo com o Mercosul, vários parlamentares criticaram produtos do Brasil.

 

"Nossos agricultores não querem morrer e nossos pratos não são latas de lixo", discursou o deputado Vincent Trébuchet (partido UDR, de direita).

Antoine Vermorel-Marques (Republicanos, direita) comparou a tradicional vaca charolesa francesa, "rústica e maternal", com a mesma raça bovina criada na América do Sul.

 

"Aglutinada em fazendas de 10 mil cabeças, engordada, condenada aos ferros, comendo soja transgênica, em um hectare onde antes havia a floresta amazônica, abatida sem dó nem piedade e empacotada em um cargueiro refrigerado. Seu destino? Nossas mesas, nossas cantinas, vendida a metade do preço, financiada ao custo da nossa saúde, alimentada com um pesticida proibido na Europa, que fragiliza a gravidez e ataca a saúde dos recém-nascidos", disse Vermorel-Marques.

 

O presidente também disse que pretende manter os laços econômicos com os Estados Unidos, mesmo durante a presidência de Donald Trump, mais extremista e próximo ao ex-presidente Jair Bolsonaro. Disse que vai manter um pragmatismo, assim como teve boas relações com outros presidentes americanos.

No entanto, acrescentou que, naquilo que houver divergência, vai "trancar a cara".

 

"Nós é que temos que acreditar em nós. Eu quero fazer tudo isso sem brigar com os Estados Unidos. Eu não quero saber se o presidente é o Trump, Biden, Obama. Eu quero saber o seguinte, o Brasil tem interesses soberanos, eles têm interesses soberanos e os nossos interesses têm que convergir.

 

Naquilo que houver diferença, a gente tranca a cara e não faz negócio", afirmou o mandatário.

Lula na sequência criticou que o investimento americano no Brasil estava em queda e que só ganhou novo impulso quando esse espaço passou a ser ocupado pela China.

 

Em outro momento, Lula também voltou a criticar a taxa de juros básica brasileira, acrescentando que não explicação para estar no patamar atual.

 

"Qual é a explicação de a taxa de juros estar do jeito que está hoje? Estamos com a inflação controlada, a economia está crescendo, [estamos com] o menor nível de desemprego desde 2012", acrescentou (Folha, 28/11/24)