01/02/2018

Argentina busca novos mercados para trigo

Argentina busca novos mercados para trigo

Dois anos depois de o governo de Mauricio Macri reduzir impostos e destravar as vendas externas de grãos da Argentina, a produção de trigo já avançou em tal proporção no país que os exportadores locais tiveram de buscar novos mercados além do Brasil, seu tradicional comprador, para vender tanto cereal. Com isso, enfrentam a concorrência acirrada de outros países produtores, como Rússia, que também registram colheitas recordes.

E as vendas para os novos clientes já fizeram a receita da Argentina com as exportações de trigo crescer 8% em 2017, para US$ 2 bilhões, montante próximo do valor dos embarques de soja, segundo principal produto agrícola exportado pelo país.

Na primeira quinzena deste mês, os produtores encerraram a colheita da maior safra de trigo dos últimos 18 anos na Argentina, estimada em 17 milhões de toneladas, segundo a Bolsa de Cereales de Buenos Aires. O volume colhido na atual safra, a 2017/18, cresceu 65% ante o ciclo 2015/16, quando as "retenciones" às exportações ainda vigoravam na Argentina.

Com a maior oferta, os argentinos têm cereal mais que suficiente para atender a demanda interna, de cerca de 5 milhões de toneladas, e a do Brasil. Nos cálculos da Argentrigo, que representa a cadeia de trigo no país, a demanda brasileira deve ficar em 5 milhões de toneladas – os moinhos brasileiros estimam um número maior. (ver Brasil terá de ampliar importação do cereal este ano)

Se a estimativa da entidade estiver correta, os exportadores argentinos terão que encontrar destino para 7 milhões de toneladas. Em dezembro, um carregamento "teste" com 30 mil toneladas foi enviado ao México, que se abastece principalmente de trigo dos Estados Unidos e do Canadá, devido ao Nafta e à facilidade logística.

"Foi um embarque para conhecer como era a operação, como chegaria o trigo, como seria o tema sanitário, o custo, etc. Os mexicanos podem comprar trigo, e estamos mais do que dispostos a vender a eles", afirma David Hughes, presidente da Argentrigo.

Nas últimas duas temporadas, a Argentina passou a vender volumes significativos para países do Sudeste Asiático, como Indonésia, Vietnã e Tailândia, e para o norte da África, como a Argélia.

Um levantamento da consultoria INTL FCStone mostra que a Argélia foi o segundo principal destino do trigo argentino em 2016/17, atrás apenas do Brasil. Os argelinos importaram 1,097 milhão de toneladas, ou 27% dos embarques argentinos. Na safra 2015/16, o segundo principal destino havia sido a Indonésia, que absorveu 15% dos embarques (1,312 milhão de toneladas).

A diferença em relação ao período anterior à redução dos impostos sobre as exportação é gritante. Apenas uma safra antes, a de 2014/15, o segundo principal destino havia sido o Chile, com 166 mil toneladas, ou 4% do total.

"É impressionante a Argélia entrar aí, porque é onde os argentinos competem com a Rússia, com a União Europeia", observa João Macedo, analista da INTL FCStone. Para disputar mercado com a Rússia – que se tornou nesta safra a maior exportadora de trigo do mundo -, a Argentina precisa vender o produto a preços mais competitivos que o já barato trigo russo, mesmo arcando com custo maior de transporte.

Mas nem sempre os argentinos conseguem garantir uma oferta mais atrativa para os países do norte da África. "É difícil chegar a essa região, onde se compete com o Mar Negro. Por isso os argentinos saíram buscando outros mercados, como o asiático, onde os exportadores do Mar Negro também estão distantes", diz Hughes. A maior dificuldade é competir em destinos como Coreia do Sul e Japão, que exigem trigo de melhor qualidade e que são abastecidos por Austrália, EUA e Canadá.

Diante da elevada oferta de trigo no mundo, o preço obtido pelos exportadores argentinos não é excepcional. Mas Hughes pondera que, comparado ao que o produtor recebia dois anos atrás, na época das "retenciones", o preço ainda é interessante e deve seguir estimulando o aumento do plantio do trigo (Assessoria de Comunicação, 31/1/18)


Brasil terá de ampliar importação do cereal este ano

Os moinhos brasileiros avaliam que os estragos provocados pelas adversidades climáticas nas lavouras de trigo da região Sul do país levarão o setor a ter de importar mais de 7 milhões de toneladas este ano, segundo Marcelo Vosnika, presidente do conselho deliberativo da Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo).

O número é maior que as 5 milhões de toneladas estimadas pela cadeia produtiva argentina e pode ser o maior volume importado desde 2013. Na época, problemas climáticos afetaram a produção da América do Sul, e o governo brasileiro suspendeu temporariamente a tarifa de 10% sobre as importações de trigo de fora do Mercosul.

Apesar dos esforços de diversificação das exportações por parte dos argentinos, o fornecimento de trigo pelos vizinhos deverá estar garantido. "A Argentina, com a safra desse tamanho, necessariamente tem que exportar também para fora do Mercosul. Mas isso não gera muita preocupação", diz.

No ano passado, o Brasil importou 6 milhões de toneladas de trigo, dos quais 5 milhões vieram da Argentina. Em geral, os moinhos brasileiros mesclam a produção nacional com cerca de 20% de trigo argentino. Contudo, como o trigo brasileiro está com menor qualidade desta vez, o cereal argentino poderá chegar a 50% nas misturas.

"O número mínimo do ‘falling number’ [índice de queda] que consideramos para o trigo para panificação é 250. E metade da safra brasileira ficou abaixo desse mínimo", diz Vosnika. Pela última estimativa da Conab, o país colheu 5,28 milhões de toneladas de trigo na última safra (2016/17), o que significa que apenas cerca de 2,6 milhões de toneladas do cereal são apropriados para a panificação.

Por enquanto, como a safra nacional acabou de ser colhida, os moinhos ainda estão abastecidos, mas a Abitrigo calcula que as importações começarão a crescer a partir de março, quando carregamentos argentinos deverão chegar pelos portos do Sul e Sudeste.

Já os moinhos do Nordeste devem importar, como sempre, dos Estados Unidos, um volume estimado de 500 mil toneladas. E, embora o Ministério da Agricultura tenha flexibilizado regras para permitir a importação do trigo da Rússia, ainda não há importações do país programadas para chegar ao Brasil, segundo Vosnika.

O aumento das importações deve tornar os custos dos moinhos mais suscetíveis às oscilações cambiais, principalmente em um ano "com mais volatilidade", diz. Mas os preços internacionais do cereal não preocupam, já que o mundo está com estoques elevados, acrescenta (Assessoria de Comunicação, 31/1/18)