14/05/2018

Até a Agricultura critica PL do agrotóxico

O deputado Luiz Nishimori, relator do projeto de lei na comissão especial da Câmara

Polêmica e contestada sobretudo pelos órgãos de saúde e ambiente do governo, a nova lei em discussão no Congresso para agilizar o registro de agrotóxicos no país, defendida pela bancada ruralista, passou a ser alvo de críticas até no Ministério da Agricultura. O principal problema apontado é a falta de pessoal e estrutura para que o prazo de até um ano proposto, três vez maior que atual, seja cumprido com responsabilidade.

O projeto de lei em questão (6.299/2002) é de autoria do ministro da Agricultura, Blairo Maggi, que o apresentou enquanto cumpria seu mandato de senador. Mas Luís Eduardo Rangel, secretário de Defesa Agropecuária da Pasta, departamento responsável por fiscalizar esses produtos no Brasil, admitiu ao Valor que o prazo máximo estabelecido pelo relator do projeto de lei na comissão especial da Câmara, o deputado Luiz Nishimori (PR-PR), é insuficiente para registrar novas moléculas de agroquímicos, cujas características são desconhecidas. Hoje são 120 dias, mas é raro que um registro saia antes de três a oito anos.

É a mesma crítica feita pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que também participam do processo de análise dos registros de defensivos.

"O projeto até tem méritos, mas também tem falhas, porque não é aplicável. O mundo real não faz registro de agrotóxicos sofisticados e inovadores em um ano. Esse processo, quando não há dúvidas, leva ao menos dois anos", diz Rangel. "De novo esbarramos no problema de falta de estrutura, de gente e de informatização, e uma nova lei mais detalhada não mudará o cenário".

O principal gargalo, diz Rangel, é que não há técnicos especialistas em número suficiente para analisar pedidos de registro de novos produtos. Segundo ele, atualmente o Ministério da Agricultura não dispõe de nenhum profissional para essa tarefa. A Anvisa conta com quatro técnicos, enquanto o Ibama tem dois a três.

Para Rangel, não seria preciso realizar concurso público para contratar mais técnicos. Cerca de 20 químicos e toxicologistas atuando nos três órgãos e cedidos por universidades ou pela Embrapa, por exemplo, seria o ideal para desafogar a atual fila de registros de produtos novos, que de acordo com a Anvisa tem 32 agroquímicos – ingredientes ativos ainda não registrados no Brasil.

A demanda ganha ainda mais urgência caso o PL seja aprovado como está, já que o texto prevê a realização da "análise de risco" dos novos produtos. Essa análise tem por objetivo permitir que alguns defensivos sejam utilizados sob determinadas condições, a partir de testes científicos já concluídos em outros países, mas Anvisa e Ibama também resistem a esse modelo. Os órgãos entendem que, dessa forma, produtos que já estão banidos do mercado por riscos à saúde e ao ambiente poderão "voltar para a fila" de registros.

A lei que atualmente regula os agrotóxicos no país (7.802/ 1989), fixa um prazo de 120 dias para um novo registro, que na prática dificilmente é cumprido. O deputado Nishimori disse ao Valor que o prazo de um ano é razoável. E lembrou que, conforme seu relatório, caso os órgãos responsáveis não consigam cumpri-lo, terão que conceder um registro provisório para produtos já liberados em pelo menos três países membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Segundo o presidente da Anvisa, Jarbas Barbosa, o prazo de um ano é "equivocado" e não pode ser aplicado a produtos novos, apenas para "genéricos". "A lei retira responsabilidade da Anvisa e do Ibama e a concentra no Ministério da Agricultura. Mas eles não têm gente e a análise vai ser prejudicada. Para os mercados mais exigentes, que consomem alimentos do Brasil, isso seria uma sinalização extremamente negativa".

Já a diretora de Qualidade Ambiental do Ibama, Jacimara Guerra, acredita ser possível acelerar os processos, mas para isso seria preciso dobrar para 82 o número de técnicos do órgão com essa função. O Ibama tem hoje na fila 1,8 mil de pedidos de registro de agrotóxicos. Ela também faz duras críticas ao fato de 47% dos defensivos já registrados no Brasil, de acordo com o Ibama, nunca terem sido comercializados pelos fabricantes. "Que pressa é essa? Porque então gastamos tanto tempo e custo para analisar esses processo?", pergunta.

Ibama e Anvisa acreditam que o PL implica "perda de poder decisório" no processo de análise dos pedidos de registro de defensivos, e que caso ele seja aprovado os órgãos passariam a ter um papel apenas consultivo no processo. Logo, defendem a rejeição integral do texto e preferem a edição de um novo decreto presidencial. Esse decreto, que está em fase final de discussão, busca reduzir a burocracia nos registros, mas sem mexer com prazos (Assessoria de Comunicação, 11/5/18)