Barreira verde – Editorial O Estado de S.Paulo
ESTADÃO AZUL
Proibição da importação de produtos oriundos de área desmatada traz risco à credibilidade do Brasil.
O Conselho Europeu sancionou no último dia 16 a proibição de importação de commodities produzidas em áreas desmatadas de florestas tropicais, inclusive aquelas consideradas legais nos países de origem. A nova barreira comercial, a ser adotada ainda neste mês pelos 27 membros da comunidade, não chega a surpreender.
Há anos essa decisão vinha sendo demandada pela agropecuária, a ala mais protecionista do bloco europeu, e por setores ambientalistas. Em novembro de 2021, o Conselho propôs a medida ao Parlamento Europeu, que a aprovou em abril passado. Por mais questionável que seja do ponto de vista do comércio internacional, a medida impõe ao Brasil o ônus da prova da origem “limpa” de suas exportações e desafia o governo Lula da Silva a, pragmaticamente, cumprir sua promessa de preservação ambiental.
As novas regras são preocupantes. O risco imediato é a perda de mercados, por enquanto restrita à Europa. A regulação abarca sete commodities – carne bovina, cacau, café, óleo de palma, borracha, soja e madeira – oriundas de áreas antes ocupadas por florestas nativas até 31 de outubro de 2020. Mas inclui bens processados que contenham esses insumos. A definição não abarca o Cerrado.
A medida restringe também a comercialização na União Europeia desses sete itens se a produção contrariar normas internacionais de trabalho, dos direitos humanos, de povos indígenas e de comunidades locais, bem como as vinculadas à corrupção e a crimes tributários. Os países do bloco exigirão certificados sobre esses requisitos e poderão realizar avaliações no terreno. Os exportadores estarão sujeitos a punições por descumprimento.
O questionamento da regulação na Organização Mundial do Comércio (OMC) esbarra no ostracismo do mecanismo de solução de controvérsias. Os exportadores brasileiros do campo, cientes da inevitável aprovação da barreira, há muito se previnem com a rastreabilidade de suas vendas externas. O agronegócio, em geral, é reconhecido pelo aumento de produtividade sem expansão de áreas cultivadas.
Mas o governo haverá de precaver-se com mecanismos de certificação mais eficazes e críveis, atento à parcela de agropecuaristas e mineradores que, ao resistir às leis de proteção ambiental, joga em favor do protecionismo europeu. Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostram que, em 2021 e 2022, houve corte raso de 24.606 quilômetros na Amazônia Legal brasileira. As sete commodities dessas áreas já estão sujeitas à barreira europeia.
Há risco mais grave. A regulação da União Europeia tenderá a pesar sobre a reputação do governo Lula e de seus sucessores. O compromisso do País com a sustentabilidade –além da coleta de recursos mundo afora para a preservação da Amazônia – será mensurado também nas avaliações anuais da Comissão Europeia sobre a adequação dos países importadores à regulação verde. A cada 30 de outubro, ter o Brasil na lista de “alto risco” será devastador para a administração, a quem caberá a escolha entre prevenção ou desmoralização (Estadão, 20/5/23)