BP: Mais gastos com petróleo e gás após fé 'equivocada' na energia verde

Em meio a luta pela sobrevivência do grupo, CEO diz que empresa foi otimista demais e reduzirá gastos com renováveis em 70%.
A BP abandonou a tentativa radical de se reinventar como uma empresa de energia verde, cedendo à pressão dos investidores após sua mudança agressiva dos combustíveis fósseis nos últimos cinco anos ter saído pela culatra.
Em um retorno às suas raízes, o grupo anunciou nesta quarta-feira (26) que aumentaria os gastos com petróleo e gás em um quinto, para US$ 10 bilhões por ano, e reduziria os gastos com renováveis em 70%.
A mudança, já esperada, ocorre enquanto o CEO Murray Auchincloss luta para convencer a Elliott Management, investidora ativista do negócio, de que é possível reverter a situação da empresa.
Britânica BP luta para apresentar alternativas para reverter cenário negativo diante de investidores em reunião esta semana - Ben Stansall - 11.fev.25/AFP
O diretor-executivo disse que a mudança era um "reajuste fundamental da estratégia da BP". As metas de redução da produção de combustíveis fósseis e desenvolvimento de 50 gigawatts de energia renovável foram abandonadas. Ele afirmou que a empresa foi otimista demais em sua decisão de se voltar mais agressivamente do que seus concorrentes para a energia verde.
"Nossa expectativa por uma transição rápida foi equivocada e fomos longe demais, rápido demais", disse ele ao anunciar a nova estratégia. "Petróleo e gás serão necessários por décadas."
Auchincloss tornou-se CEO permanente há 13 meses, após o ex-chefe Bernard Looney ser demitido devido a um escândalo sobre relacionamentos passados com colegas. Alguns membros do conselho acham que Auchincloss demorou demais para anunciar o tipo de mudanças estratégicas necessárias para reconquistar a confiança dos investidores, disse uma pessoa familiarizada com o pensamento do conselho.
Ele encerrou uma estratégia de cinco anos que havia estabelecido a BP como líder na transição energética, mas que, em última análise, não conseguiu conquistar o apoio dos acionistas após anos de retornos insatisfatórios.
Sob o plano de Auchincloss, a BP tentará arrecadar pelo menos US$ 20 bilhões até 2027 por meio da venda de ativos, potencialmente incluindo sua divisão de lubrificantes Castrol e uma parte de seu negócio solar Lightsource.
A pressão dos acionistas sobre Auchincloss para reformular a estratégia da BP aumentou depois que surgiu este mês que a Elliott havia adquirido uma participação de quase 5% na empresa e estava pressionando por mudanças.
As ações da BP caíram 2,3% após a publicação de sua atualização de estratégia nesta quarta, sinalizando que os investidores ainda estavam incertos se os anúncios foram suficientes.
"Colocamos uma tonelada de informações lá fora, [os investidores] precisarão interpretar isso e entender. E então espero que o preço das ações comece a subir nas próximas semanas e meses", disse Auchincloss.
Auchincloss disse esperar uma "taxa de crescimento bastante alta" para o negócio upstream da BP e planeja lançar até 27 novos projetos nos próximos cinco anos, enquanto a empresa reconstrói sua capacidade de produção de petróleo após anos de redução de sua produção. "Temos 16 bilhões de barris para buscar", afirmou.
A britânica ainda produzirá ligeiramente menos petróleo e gás em 2030 do que em 2019, e Auchincloss disse que o grupo não abandonou seus planos de ser uma empresa de energia diversificada. "Não vejo realmente ninguém fazendo mais do que estamos fazendo nesse tipo de escala", disse ele. "Você não verá uma empresa de energia mais bem integrada no mundo do que a BP."
Em um reajuste total das perspectivas financeiras da BP, Auchincloss sinalizou uma taxa mais baixa de retornos aos acionistas, mas prometeu cortar pelo menos US$ 4 bilhões em custos e reduzir a dívida líquida em pelo menos um quinto nos próximos dois anos.
Auchincloss disse que havia "muitas opções" para alcançar seu objetivo de arrecadar US$ 20 bilhões vendendo partes do negócio, incluindo infraestrutura, ativos upstream e downstream e parte de sua rede de postos de gasolina.
Biraj Borkhataria, analista da RBC Capital Markets, disse que, embora a BP pareça estar tomando "as decisões certas para o longo prazo, isso pode não agradar aos investidores hoje".
Anteriormente, a Elliott destacou que as metas baseadas em volume da BP para aumentar a produção de energia verde e reduzir a produção de petróleo e gás destruíram valor ao amarrar a empresa a objetivos estáticos.
O plano abandonado por Auchincloss nesta quarta havia sido apresentado em 2020 e comprometia a empresa a reduzir a produção de petróleo e gás em 40% até 2030. Também prometia desenvolver 20 gigawatts de capacidade de energia renovável até 2025 e 50GW até 2050.
Em 2023, em meio à turbulência nos mercados de energia após a invasão da Ucrânia pela Rússia, Looney atualizou a meta de redução de petróleo e gás para 25%, dizendo que os governos estavam pedindo que empresas como a BP investissem no "sistema de energia de hoje".
Na ocasião, as ações da empresa subiram mais de 10% nas 48 horas seguintes ao anúncio.
Outras petrolíferas, como ExxonMobil, Chevron e Shell já disseram que continuariam aumentando a produção. A BP produz cerca de 2,3 milhões de barris de óleo equivalente por dia (bpd), abaixo dos cerca de 2,6 milhões de bpd em 2019.
A Elliott também está pressionando a BP a fazer desinvestimentos significativos. Desde que o desastre da Deepwater Horizon em 2010 deixou a BP com uma conta de US$ 62,5 bilhões, a empresa sempre teve metas para desinvestimentos, mas evitou anunciar algum específico com antecedência. Isso deve mudar no dia do investidor, com Auchincloss se preparando para anunciar pelo menos um grande desinvestimento, disse uma pessoa familiarizada com o plano.
A Elliott adquiriu uma participação na Anglo American em 2024, quando foi divulgado que a BHP havia abordado o grupo listado no Reino Unido sobre uma aquisição. No final, a Elliott apoiou a Anglo depois que seu presidente e CEO delinearam uma estratégia radical para preservar a independência da empresa, desinvestindo várias partes do negócio, ajudando a afastar a oferta da BHP. Agora, o fundo de hedge quer ver algo semelhante na BP, disse uma pessoa familiarizada com seu pensamento ao Financial Times.
A Elliott se encontrou com Auchincloss e o presidente Helge Lund, e ainda não levantou a possibilidade de mudanças de pessoal no conselho ou no nível executivo, disseram duas pessoas familiarizadas.
No entanto, alguns membros esperam que mudanças no conselho sejam a próxima etapa na agenda da Elliott se as mudanças desta quarta não impressionarem, disse a fonte familiarizada com o pensamento do conselho. Isso poderia incluir uma pressão por um novo presidente, seguido por um novo CEO, acrescentou a pessoa.
Lund é presidente da BP desde 2019 e foi fundamental na nomeação de Looney e no desenvolvimento de sua estratégia atual. Ele então supervisionou a resposta prolongada da BP às alegações de que Looney não havia divulgado completamente seus relacionamentos passados com colegas e apoiou a estratégia do ex-CEO após sua demissão (Financial Times, 28/2/25)