‘Brasil está reinserido na agenda verde e isso anima os investidores’
CAPA Eduardo Sirotsky Melzer - FOTO DIVULCACAO
Para Eduardo Sirotsky Melzer, Brasil oferece ambiente absolutamente fértil e positivo na transição para uma economia mundial sustentável
Gestora de recursos conclui captação de mais de R$ 4,95 bilhões para um fundo que fará aportes em empresas com negócios sustentáveis.
A gestora de recursos EB Capital, dos sócios Eduardo Sirotsky Melzer, Luciana Ribeiro e Pedro Parente, está se preparando para dar largada a uma nova série de investimentos em economia verde. Para a gestora, a troca de governo ajudou a posicionar novamente o Brasil como um polo amigável aos negócios sustentáveis.
“Não quero fazer declaração de cunho político, mas é preciso reconhecer que, na perspectiva internacional, o Brasil está reinserido na agenda verde”, afirma o sócio e fundador da EB Capital, Eduardo Sirotsky Melzer. “O atual governo mostra um esforço para a reinserção do Brasil na economia mundial a partir da compreensão de que a transição para uma economia sustentável no mundo passa pelos temas em que o Brasil tem uma liderança natural.”
O empresário deu entrevista ao Estadão/Broadcast na sede da companhia, na Av. Brigadeiro Faria Lima, após desembarcar de uma rodada de reuniões com investidores em Nova York, Boston, Chicago e Washington. Nesta semana, os encontros estão sendo retomados em Nova York e, depois, em Londres.
Das andanças, ficou claro que os governos e as empresas estão colocando mais dinheiro em soluções para combater problemas em comum a todos os países. Entram aí: combate ao aquecimento do clima, descontaminação das águas, incremento à produção de alimentos e substituição de combustíveis fósseis por renováveis. “Esses são os grandes problemas da humanidade, e as soluções passam, necessariamente, pelo Brasil”, diz.
Isso é o que explica os próximos investimentos em preparação pela gestora. A EB Capital firmou parceria com a Colibri Capital para investirem, juntas, R$ 2 bilhões em energia solar. Além disso, a gestora está preparando a sua entrada na área de biogás e pretende aprofundar os aportes no setor de reciclagem de materiais.
O Estadão/Broadcast apurou, com fontes de mercado, que a EB Capital concluiu a captação de pouco mais de US$ 1 bilhão (R$ 4,95 bilhões) para um fundo que fará diversos aportes em empresas com negócios sustentáveis.
Uma das prioridades é o setor de reciclagem. Ano passado, o grupo comprou o controle da Green PCR, recicladora de garrafas e embalagens de plástico do tipo pet. Ainda segundo fontes, o dinheiro do fundo seria usado para a compra de outras empresas de recicláveis, numa consolidação do setor.
Melzer não comenta sobre o fundo e se limita a dizer que “enxerga o setor de materiais recicláveis de forma construtiva e com grande potencial de crescimento”. A EB Capital tem experiência na construção de plataformas setoriais e é dona da Alloha, holding que comprou diversos provedores de banda larga até se tornar a maior empresa do setor depois das grandes teles Vivo, Claro e Oi. Ao todo, a EB tem R$ 5 bilhões de recursos sob gestão.
Confira a seguir os principais trechos da entrevista:
Qual a visão da EB Capital sobre a atratividade do Brasil para novos investimentos?
Existem duas variáveis muito fortes que podem proporcionar um ambiente muitíssimo positivo para o Brasil. Uma delas é macroeconômica e a outra é geopolítica. Na parte macroeconômica, o Brasil é juridicamente competente, tem condições de rumar para a responsabilidade fiscal, a taxa de juros decrescente, a inflação sob controle e um ambiente de negócios potencialmente favorável. A segunda variável é a questão geopolítica. Estamos falando da transição da economia mundial para um patamar sustentável. Essa transição necessariamente passa pelo Brasil, desde que tenha estabilidade aqui. O aspecto geopolítico me anima muito. Na EB Capital, estamos fazendo todos os esforços para contribuir para essa direção.
Quais os diferenciais do Brasil dentro desse contexto?
Os grandes desafios mundiais são mudança climática, crise energética, escassez de água e de alimentos. Já o Brasil tem recursos naturais abundantes, capacidade intensa de produção alternativa de energia, como solar, eólica e de biomassa. Além disso, é a maior fonte de água doce do mundo e tem a quarta maior agroindústria. O País tem tradição na produção de etanol e pode liderar a produção de combustível verde para aviação. São muitas oportunidades.
Esses diferenciais não vêm de hoje. O que torna o Brasil mais atrativo para os negócios sustentáveis agora?
Tem uma coisa importante: o atual governo é a favor dos temas da pauta geopolítica que podem favorecer o Brasil. O governo compreende que a transição da economia passa por elementos nos quais o País tem uma liderança natural. Não quero fazer declaração de cunho político, mas é preciso reconhecer que, na perspectiva internacional, o Brasil está reinserido na agenda a partir de uma crença deste governo.
Que agenda é essa? O que foi demonstrado pelo governo, na prática?
Em primeiro lugar, há o reconhecimento de que existem esses problemas. O atual governo respeita a necessidade de combater as mudanças climáticas e está procurando criar mecanismos para levantar soluções. Isso já é um avanço super relevante, porque possibilita um diálogo diferente do que vinha acontecendo antes e anima os investidores. Olha o exemplo do pacote verde que o (ministro da Fazenda) Fernando Haddad está criando (O “pacote verde” inclui incentivos para o mercado de crédito de carbono, produção de painéis solares e ampliação da participação de produtos da floresta nas exportações, entre outros pontos). Nessa transição da economia mundial, o Brasil oferece um ambiente absolutamente fértil e positivo.
Nas reuniões com investidores lá fora, já existe a percepção de reinserção do Brasil na agenda?
Estamos observando um interesse crescente pelo Brasil, sim. Mas ainda tem uma desconfiança grande. Tem uma certa preocupação se o País vai cumprir com sua agenda.
Qual o peso da incerteza sobre os rumos dos juros neste momento?
Se o governo comprovar que vai, sim, buscar o equilíbrio fiscal e que há um ambiente político organizado, o Brasil terá grandes oportunidades de atrair investimentos. Tem uma porrada de desafios por aqui? Tem, mas o mundo também tem. Nos Estados Unidos, os empreendedores nunca tiveram de lidar com inflação e taxa de juros tão alta como agora. Nós já estamos acostumados a isso, temos capacidade de produção e reinvenção relevante. Claro que juro alto não é bom, mas aprendemos a lidar com isso geração após geração.
Mais empresários defendem que o Banco Central reduza os juros. Qual sua posição?
Eu também defendo. O prêmio de risco no Brasil ainda é muito elevado. O País não precisa disso para atrair capital. Mas tem de baixar os juros com responsabilidade. Isso tem de ser feito com outras coisas concomitantes, como controle da inflação e fiscal. O Brasil precisa provar que gasta menos do que arrecada. Também é preciso mostrar que a agenda populista não vai prevalecer (O Estado de S.Paulo, 11/5/23)