23/06/2025

Brasil larga bem na corrida da energia verde–Editorial O Estado de S.Paulo

Brasil larga bem na corrida da energia verde–Editorial O Estado de S.Paulo

O País está no primeiro escalão global da transição energética, mas precisa superar desafios regulatórios, tecnológicos e sociais para realizar todo o seu potencial sustentável.

 

No recém-lançado relatório anual do Fórum Econômico Mundial sobre transição energética, o Brasil figura na 15.ª posição num ranking com 118 países, à frente dos países latino-americanos e de potências como Reino Unido e Estados Unidos. Metade da matriz energética brasileira provém de fontes renováveis – mais de três vezes a média global, em torno de 14,3%. O País dispõe de abundantes recursos naturais, hidrelétricas de grande porte, biomassa diversificada e um vasto potencial em hidrogênio verde e biocombustíveis. Seu patrimônio ambiental, sobretudo a Amazônia, ainda que sob pressão, agrega valor estratégico para o mercado de créditos de carbono e serviços ambientais.

 

Apesar dessas vantagens, a transição energética brasileira enfrenta desafios estruturais profundos. A expansão da geração renovável esbarra em gargalos na infraestrutura de transmissão e distribuição. Projetos bilionários aguardam conexão à rede elétrica, mas o atraso em investimentos e o excesso de burocracia reduzem a eficiência do sistema. A insegurança regulatória e as divergências entre órgãos públicos minam a confiança dos investidores.

 

A regulamentação do mercado de carbono ainda é inconsistente e permeada por interesses conflitantes, comprometendo a eficiência dos créditos e a atração de investimentos para projetos sustentáveis, especialmente no combate ao desmatamento, principal fonte emissora no País. Um sistema transparente e rigoroso pode alavancar o papel do Brasil como líder global na oferta de soluções ambientais e financeiras, fortalecendo sua imagem internacional e gerando receita para o desenvolvimento social e ambiental.

 

Ademais, a transição demanda mais que simplesmente substituir fontes. Exige integração tecnológica, políticas públicas coerentes e estabilidade regulatória que incentivem investimentos em pesquisa, inovação e qualificação da mão de obra. Será necessário ampliar a infraestrutura, incluindo a modernização das redes elétricas e o apoio a soluções de armazenamento e digitalização, para garantir confiabilidade e eficiência ante as oscilações das fontes renováveis.

 

O otimismo em relação ao potencial do Brasil é justificado, mas deve ser acompanhado por realismo e pragmatismo. A transição energética não é tarefa simples nem imediata. O País está diante de uma janela histórica de oportunidades, mas isso só será possível com esforço concentrado, governança forte e visão estratégica, capaz de conciliar crescimento econômico com preservação ambiental e justiça social.

 

Um desafio central é a construção de uma agenda que integre os diversos setores da economia, governos estaduais, iniciativa privada e sociedade civil. A dispersão e sobreposição de políticas, leis e regulamentos geram insegurança jurídica e dificultam o planejamento de longo prazo.

 

Além disso, a capacitação técnica e a qualificação da força de trabalho devem ser prioridades para que a transição não acentue desigualdades, mas crie oportunidades de inclusão produtiva. O Brasil possui um enorme capital humano que precisa ser mobilizado para atender à demanda por profissionais especializados em energias renováveis, inovação tecnológica e gestão ambiental.

 

A posição de destaque em rankings como o do Fórum Econômico Mundial evidencia que o Brasil tem condições materiais para ser protagonista da transição energética global. Mas a trajetória dependerá da habilidade em superar desafios complexos: infraestrutura deficiente, conflitos regulatórios, equilíbrio socioeconômico e governança ambiental eficaz. O sucesso exigirá a combinação de políticas robustas, investimento privado qualificado e a capacidade de construir consensos em torno de uma agenda clara e coerente.

 

Assim, o Brasil poderá não apenas consolidar sua posição atual, mas transformar-se em exemplo mundial de como é possível avançar na transição energética de forma equilibrada, inteligente e inclusiva, num caminho que respeite tanto o meio ambiente quanto as necessidades humanas, garantindo sustentabilidade integral – ambiental e social – para as próximas gerações (Estadão, 22/6/25)