27/01/2020

Brasil pode rever ação por subsídio ao açúcar contra Índia na OMC

Brasil pode rever ação por subsídio ao açúcar contra Índia na OMC

Legenda: Presidente Jair Bolsonaro ao lado do primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, em visita à Índia

 

No encontro que tiveram, o primeiro-ministro pediu ao Brasil para que retire a ação referente ao açúcar e recebeu um aceno positivo.

O presidente Jair Bolsonaro afirmou neste sábado, 25, que pode rever a ação que o Brasil move contra a Índia na Organização Mundial do Comércio (OMC) por conta de subsídios à produção e exportação de açúcar. A declaração foi dada após uma reunião com o primeiro-ministro indiano Narendra Modi na capital indiana. 

No encontro que tiveram, o primeiro-ministro pediu ao Brasil para que retire a ação referente ao açúcar e recebeu um aceno positivo. Questionado por jornalistas sobre o tema, Bolsonaro respondeu que fará o possível para atender ao pedido. "Ele me disse que o açúcar comercializado para fora equivale a 2% do montante. Isso é pequeno. Pedi para o Ernesto Araújo (ministro das Relações Exteriores) a possibilidade de rever essa posição do Brasil".

O presidente disse que o Brasil não vai exigir nada em contrapartida, mas ressaltou que seria importante que a Índia aumentasse sua produção de etanol. "O etanol... essa tecnologia nossa vindo pra cá, eles querem isso aí, acaba nos favorecendo também. Daí produz menos açúcar aqui, ajuda a equilibrar o mercado e é um sinal de aproximação com a Índia muito forte".

Brasil, Austrália Guatemala pediram a abertura de um painel da OMC para analisar os subsídios do governo indiano para produção e exportação de açúcar. O contencioso foi iniciado em fevereiro de 2019 e o Brasil apresentou seu pedido para o estabelecimento de um painel em julho de 2019, tudo já durante a gestão de Bolsonaro.

O governo brasileiro argumentou, na ocasião, que as políticas indianas geraram prejuízos aos agricultores do Brasil, ao ajudar a derrubar as cotações do produto. O Itamaraty alegou, entre outras coisas, que a Índia quase dobrou o preço mínimo a ser pago pela cana-de-açúcar desde a safra 2010/11. Há poucos dias, já em 2020, Brasília apresentou, segundo matéria do jornal Valor, sua primeira petição com argumentos contra os programas de subsídios indianos.

Bolsonaro está na Índia desde sexta, onde está a convite de Modi para participar como convidado do Dia da República da Índia, no domingo. No sábado, ele se reuniu com o primeiro-ministro e com altas autoridades do governo indiano. Foram formalizados 15 atos para facilitar o comércio, os investimentos e a cooperação entre os dois países.

Na visita, tanto autoridades do governo indiano quanto do brasileiro enfatizam o potencial de comércio e atração de investimentos entre os dois países. Em 2019, o intercâmbio comercial entre Brasil e Índia foi de US$ 7,5 bilhões (O Estado de S.Paulo, 25/1/20)


Açúcar: Presidente da Índia pede que Brasil retire contencioso na OMC

Legenda: O primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, anunciou a assinatura de 15 acordos bilaterais entre Brasil e Índia e pede que Bolsonaro retire contencioso do açúcar na OMC

 

Chamando repetidamente o presidente Jair Bolsonaro de “meu amigo”, o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, ressaltou que Índia e Brasil têm "ideologia e valores comuns”, e anunciou a assinatura de 15 acordos bilaterais –segundo o líder brasileiro, um recorde.

“Numa viagem internacional, não tínhamos notícia de tantos acordos, e bons acordos, serem assinados”, disse Bolsonaro, em discurso de apenas 3 minutos e 40 segundos, após encontro bilateral com Modi, no segundo dia de sua visita oficial à Índia.

Ele agradeceu aos indianos pelo “carinho” da recepção e afirmou: “Ainda faltam dois dias para eu ir embora da Índia e já estou sentindo saudades”.

Embora Bolsonaro tenha anunciado no Twitter que o comércio com a Índia poderá passar a US$ 50 bilhões até 2022, creditando o número a Modi, a declaração oficial da visita fala apenas em “meta realista de US$ 15 bilhões”.

Em 2019, o fluxo de comércio entre os dois países foi de US$ 7 bilhões, ou seja, teria de aumentar sete vezes para chegar à estimativa de Bolsonaro.

Segundo uma fonte, o valor de US$ 50 bilhões foi mencionado nas conversas das autoridades indianas e de Modi com Bolsonaro, mas referia-se a vários anos, e não a 2022.

Segundo o deputado Eduardo Bolsonaro, foi o primeiro-ministro Narendra Modi que citou a cifra de USS 50 bilhões, que ele considera bastante otimista, mas factível. 

Bolsonaro e Modi são alinhados ideologicamente —nacionalistas de direita– e os dois enfrentam críticas da mídia internacional.

“A parceria estratégica entre a Índia e o Brasil se baseia em nossa ideologia e valores comuns e, apesar da distância geográfica”, disse Modi.

“Sendo duas grandes democracias e países em desenvolvimento, há uma profunda semelhança entre as visões da Índia e do Brasil sobre importantes questões globais e multilaterais, entre elas o grave problema do terrorismo e a questão do meio ambiente; nossa perspectiva sobre os atuais desafios que o mundo enfrenta é muito semelhante.”

O principal acordo assinado é o de cooperação e facilitação de investimentos (ACFI), que tem como objetivo dar mais segurança jurídica e incentivar investimentos. O investidor estrangeiro passará a ter um “ombudsman” na Camex (Câmara de Comércio Exterior), a quem pode recorrer para prevenir conflitos ou mediar disputas.

O investidor brasileiro também terá um mecanismo semelhante na Índia. O tratado segue um novo modelo que exclui a cláusula investidor-Estado, que previa que os Estados poderiam ser acionados em arbitragem internacional pelas empresas investidoras.

Esse mecanismo era frequentemente exigido em acordos de investimentos com países europeus e rejeitado pelo Congresso, que não ratificou vários desses tratados.

O Brasil já assinou acordos nesse mesmo modelo com Angola, Chile, Colômbia, Emirados Árabes Unidos, México, Moçambique e Peru, entre outros países.

Hoje, há US$ 6 bilhões (R$ 25 bilhões) em investimentos indianos no Brasil, e apenas US$ 1 bilhão (R$ 4,2 bilhões) de aportes brasileiros na Índia, segundo o governo indiano.

Também foram anunciados dois acordos que são demandas antigas do setor privado brasileiro: o de Previdência, que permite aos executivos que o tempo em que trabalham expatriados seja contado para sua aposentadoria.

Para as empresas, elimina a dupla contribuição previdenciária. E uma revisão do acordo de eliminação de bitributação Brasil-Índia, válido desde 1992, que deve ter suas alíquotas atualizadas.

Também foi celebrado um memorando de entendimento sobre cooperação de bioenergia, que tem como objetivo aumentar a produção e uso do etanol no mercado indiano, o que pode aliviar as distorções causadas pelos subsídios do governo indiano ao açúcar.

A ideia é que mais países passem a produzir etanol, para que o produto se torne uma commodity, ampliando o mercado, ao mesmo tempo em que reduz a grande produção indiana de açúcar, que distorce preços internacionais.

O Brasil, ao lado da Austrália e Guatemala, pediu abertura de um painel (investigação) na OMC (Organização Mundial de Comércio) questionando os subsídios do governo indiano aos produtores de açúcar.

O assunto foi debatido no encontro bilateral entre Modi e Bolsonaro, e o indiano teria pedido ao brasileiro que revisse o contencioso no OMC. Bolsonaro afirmou que pediu ao chanceler Ernesto Araújo que verifique a possibilidade de o Brasil rever sua posição —porém, segundo a Folha apurou, isso é difícil de ocorrer.

Modi também abordou no encontro bilateral a possibilidade de produção de carros flex na índia, que abriria um grande mercado para tecnologia brasileira. O governo indiano passará a exigir uma mistura de 10% de etanol nos combustíveis a partir de 2022 e 20% a partir de 2030.

Também foram assinados acordos para cooperação em investigações criminais, intercâmbio cultural, exploração de óleo e gás, de recursos minerais, segurança cibernética, intercâmbio de material genético de gado bovino leiteiro, medicina ayurvédica e homeopatia, de parceria entre a Apex e a Invest-India.

Na declaração, anunciaram ainda a abertura do mercado indiano para exportações brasileiras de gergelim e a abertura do mercado brasileiro para exportações indianas de sementes de milho.

Os indianos pressionaram até o último minuto para que Bolsonaro anunciasse a isenção de vistos para cidadãos do país entrarem no Brasil, mas, como antecipou a Folhao anúncio acabou não saindo, apesar das promessas feitas pelo presidente brasileiro na China e na cúpula dos Brics.

No discurso, Modi disse que o Brasil é “uma fonte confiável para nossas necessidades nos campos de alimentos e energia”.

As exportações brasileiras para a Índia são muito concentradas em petróleo (35% das vendas de janeiro a novembro do ano passado), óleo de soja (10%) e açúcar (8,9%).

No ano passado, o Brasil teve déficit comercial de US$ 1,49 bilhão com a Índia, após um pequeno saldo positivo de US$ 246 milhões em 2018. Em 2019, o país exportou US$ 2,76 bilhões e importou US$ 4,25 bilhões, principalmente em produtos químicos, inseticidas, combustíveis e medicamentos.

No domingo (26), Bolsonaro será o convidado de honra do desfile do Dia da República, que comemora a entrada em vigor da Constituição indiana. A mudança, em 1950, marca a transição completa do país para uma democracia após a independência da Grã-Bretanha, em 1947.

No último dia da visita, na segunda (27), Bolsonaro abrirá o seminário empresarial Índia-Brasil. De lá, o presidente vai para Agra conhecer o Taj Mahal, o monumento mais famoso da Índia.

Trata-se do mausoléu construído a pedido do imperador Shah Jahan para abrigar o túmulo de sua esposa favorita, Mumtaz Mahal (Folha de S.Paulo, 26/1/20)