Caroço de açaí, tocos e raízes viram energia no setor de papel e celulose
Legenda: Os tocos e raízes agora usados na Eldorado antes eram deixados para trás
De olho nos ganhos extras do mercado de energia, Veracel e Eldorado testam combustíveis alternativos e, até então, desperdiçados para garantir geração.
A indústria de papel e celulose tem alcançado bons resultados na busca por novas fontes para geração de energia. De olho na receita extra disponível no mercado de energia livre, vale até mesmo usar bagaço de cana e caroço de açaí das fazendas vizinhas.
A Veracel, joint venture entre a Fibria (hoje Suzano) e a finlandesa Stora Enso, tem sido pioneira em utilizar o bagaço de cana no processo de queima de resíduos. A concorrente Eldorado, por sua vez, tem apostado no aproveitamento de tocos e raízes de madeira em seu mix para geração de energia.
No caso da Veracel, o bagaço de cana é fornecido por duas usinas de álcool de terceiros, uma em Santa Cruz Cabrália (BA), próximo a uma das fábricas da empresa, e outra localizada em Minas Gerais. Atualmente, além do bagaço de cana a empresa realiza testes com caroço e casca do açaí, casca de coco verde e resíduo do cacau.
“Fizemos o primeiro teste em escala industrial com o caroço de açaí no início da semana passada, avaliando como funcionaria o sistema de transporte”, diz Estanislau Victor Zutautas, coordenador de recuperação e utilidades da Veracel. “Agora, estamos verificando sua viabilidade econômica. O caroço de açaí tem uma vantagem por ser um combustível homogêneo e de fácil de transporte.”
A redução na quantidade de madeira inservível (desqualificada na linha de produção) motivou o departamento de pesquisas da empresa a buscar alternativas para a geração de energia. No ano passado, foram feitos testes com um mix para a queima de resíduos, composto por 6% de bagaço de cana, 38% de inservíveis, 1% de lodo primário e 54% de biomassa gerada internamente. Em 2019, a proporção do bagaço no mix já subiu para 7%.
A Veracel tem capacidade para gerar 126 megawatts e opera próximo do limite, produzindo 121 MW. Desse total, a empresa consome 70 MW e vende internamente 30 MW para uma unidade química parceira. Embora tenha licença para exportar até 27 MW para o Sistema Interligado Nacional (SIN), a Veracel atualmente oferece apenas metade disso, em torno de 13 MW.
Ambiente de testes. “Não há planos, por enquanto, de ampliar a capacidade de geração”, diz Zutautas. “A intenção é conseguir manter o mix de combustíveis para geração equilibrado, e buscar eficiência.”
A capacidade de venda de energia da Veracel seria suficiente para atender à demanda residencial de uma cidade do tamanho de Eunápolis (BA), com mais de 100 mil habitantes.
Os tocos e raízes usados na Eldorado eram deixados para trás, mas descobriu-se que poderiam ser aproveitados. “Em Portugal, por conta do déficit de madeira e de terreno disponível, eles usam esse tipo de insumo para produção de celulose”, afirma Carlos Monteiro, diretor industrial da Eldorado. “No nosso caso, isso não seria viável, mas descobrimos que pode ser útil na queima.”
O projeto ainda está na fase de testes e deve entrar em operação com a inauguração da usina termoelétrica Onça Pintada, na fábrica de Três Lagoas (MS), em 2021. Será a maior termoelétrica movida a biomassa do Brasil. O investimento, que sairá do caixa da empresa, é estimado entre R$ 350 milhões e R$ 400 milhões. Sua construção foi contratada via leilão da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), em 2016.
No local a Eldorado já tem uma operação autossuficiente em energia, além de exportar outros 50 MW para SIN, via Ambiente de Contratação Livre (ACL). A nova termoelétrica vai consumir 1.500 toneladas de biomassa por dia e deve gerar 50 MW, que serão 100% comercializados via Ambiente de Contração Regulado (ACR).
A demanda, nesse caso, será determinada pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). O retorno financeiro é certo, diz Monteiro, sem estimar valores em razão de fatores externos, como demanda de energia e preço (O Estado de S.Paulo, 1/10/19)