‘Carrefour’ energético – Por Adriano Pires
O Brasil precisa usar os recursos do petróleo e do gás e fazer a transformação energética e social.
O mundo se encontra hoje num grande carrefour energético, ao contrário do que ocorreu na revolução industrial inglesa, quando a única fonte de energia era o carvão, ou mesmo no século 20, que pode ter a sua história contada através do petróleo. A grande característica destes dois momentos da história foi a presença de uma fonte monopolista de energia que levou o mundo a grandes taxas de crescimento econômico. Agora tudo mudou. E por que mudou? Duas razões principais: a primeira, a exigência de melhor qualidade de vida e proteção ao planeta; e, a segunda, derivada da primeira, tais preocupações levaram ao aparecimento de tecnologias disruptivas baseadas em recursos naturais renováveis, que farão desaparecer os combustíveis fósseis e essa natureza monopolista de recursos energéticos. Isso trará independência energética, com tecnologias modulares e diversificadas nas fontes renováveis. Uma verdadeira revolução, cujo principal beneficiado será o consumidor.
E como fica o Brasil? O Brasil é um país privilegiado na medida em que tem uma enorme diversidade de fontes primárias de energia: temos água, vento, biomassa, petróleo e gás natural e vivemos num país ensolarado.
O desafio que está posto é como transformar essa vantagem comparativa que a natureza nos deu em benefício de todos os brasileiros.
Não será uma tarefa fácil, mas precisamos construir este caminho e enfrentar essa transição energética que levará a uma matriz 100% limpa. Um primeiro ponto que temos de esclarecer e explicar de forma muito clara é a importância do pré-sal em toda essa transição energética brasileira. O pré-sal, com certeza, é a maior janela de oportunidade que o Brasil possui tanto para a retomada do crescimento econômico quanto para viabilizar a transição energética baseada no modelo 3D (descarbonização, descentralização e digitalização).
O pré-sal é hoje a maior fronteira de expansão da produção de petróleo e gás natural para os próximos 20 anos. Os leilões realizados em 2017 e 2018 arrecadaram só de bônus de assinatura R$ 28 bilhões. Existem expectativas de o bônus de assinatura da cessão onerosa ser algo como US$ 50 bilhões. Os investimentos comprometidos pelas empresas em exploração e produção de óleo e gás natural com os leilões realizados até 2016 e os de 2017, 2018 e 2019 vão chegar a R$ 1,5 trilhão – o atual PIB brasileiro. Se agregarmos os investimentos que ocorrerão com o megaleilão da cessão onerosa, serão mais R$ 500 bilhões. O potencial de arrecadação de royalties será de R$ 6 trilhões até 2054, e o pico deverá ocorrer entre 2025 e 2035. Os números são fantásticos e extraordinários. Estamos falando de aumentar a produção de petróleo de 2,5 milhões de barris/dia para algo como 4 milhões de barris/dia em 2021 e 6 milhões de barris/dia para depois de 2030.
Além desse volume gigantesco de óleo, também seremos grandes produtores de gás natural. O mercado de gás natural hoje é pífio no Brasil. Faltam legislação, regulação e investimentos em infraestrutura. O gás natural tem um enorme espaço de crescimento na matriz energética brasileira. E, como está ocorrendo mundo afora, pode e deve ser a energia de transição para uma matriz limpa. Hoje, nos Estados Unidos, na Europa e na China, o diesel caro e poluente está sendo substituído por gás natural em caminhões. Já existem estradas onde só veículos a gás podem trafegar.
O Brasil precisa, agora e de maneira precisa, aproveitar o ciclo dos próximos 20 anos para usar os recursos do petróleo e do gás e fazer a transformação energética e social. Para a minha geração, sem dúvida, é a última chance. Com esses recursos poderemos financiar inovações tecnológicas que vão permitir no futuro o uso sustentado de recursos renováveis. Não podemos cometer o mesmo erro do passado, deixando esta missão e esta responsabilidade com a Petrobrás. Cabe à Petrobrás cuidar dos seus interesses e, portanto, dos de seus acionistas; e ao governo, dos interesses do Brasil e dos brasileiros (Adriano Pires é diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura – CBIE; O Estado de S.Paulo, 17/11/18)