Com a volta de CFO, Minerva Foods quer resgatar investidor
Obcecado em conferir previsibilidade à condução de seus negócios, o empresário Fernando Galletti de Queiroz enfrenta um semestre conturbado – e inusual – à frente da Minerva Foods, maior exportadora de carne bovina da América do Sul. Receosos com as mudanças repentinas nos rumos da gestão e com o elevado endividamento da companhia, os investidores castigaram as ações da Minerva nos últimos meses na bolsa, num movimento que gerou uma perda de valor de mercado de R$ 850 milhões.
De “chatamente previsível”, expressão que Galletti já utilizou para se referir à empresa controlada por sua família, a Minerva Foods passou a ser alvo de questionamentos em fevereiro, quando Edison Ticle deixou o cargo de diretor financeiro depois de quase nove anos.
A saída do executivo gerou especulações sobre desentendimentos entre ele e Galletti, que preside a companhia, e foi mal-recebida pelos investidores. Respeitado no mercado por ter implementado uma bem avaliada política de capital de giro – um diferencial em relação a frigoríficos concorrentes -, Ticle deixou a Minerva em um momento crítico. A empresa estava em fase de integração dos frigoríficos adquiridos da JBS no Mercosul no ano passado, por R$ 1 bilhão.
A sucessão de Ticle provocaria ainda mais ruído. Em fevereiro, a Minerva recrutou Eduardo de Toledo, então diretor financeiro da fabricante de papel e celulose Klabin. O executivo assumiu em março, mas ficou só dois meses no cargo.
O desligamento de Toledo, anunciado em 9 de maio, fez crescer as incertezas deflagradas com a saída de Ticle. A analistas, Galletti disse que a contratação de executivos embute riscos para os dois lados. Nesse sentido, indicou que Toledo não se encaixou na cultura da Minerva e, como alternativa, decidiu dividir a área financeira da empresa em três.
Em meio a essa turbulência, as ações da Minerva atingiram na segunda- feira passada o mais baixo patamar em mais de seis anos. E a pressão continuou.
A resposta, surpreendente, veio na quinta-feira. A companhia informou que depois de quatro meses, Ticle estava reassumindo a diretoria financeira. Os investidores gostaram e, na sexta-feira, as ações subiram 6,5%, cotadas a R$ 7,72.
Na própria sexta, primeiro dia de sua nova fase na Minerva, Ticle recebeu o Valor na sede da companhia, na capital paulista. De acordo com o executivo, os ruídos sobre sua saída eram infundados. “O mercado não acreditou que tive problemas pessoais. Mas minha volta acaba com os ruídos”, disse.
Ticle, que perdeu os pais em um curto espaço de tempo, cogitou que seu projeto na Minerva estava completo. Buscou outros desafios e, no período em que ficou fora da companhia, teve duas experiências no mercado financeiro – ficou um mês como tesoureiro da XP Investimentos e outro como sócio do C6Bank.
“Mas o projeto que achei que estava concluído não se finalizou”, afirmou Ticle, em entrevista concedida ao lado de Galletti e do diretor de relações com investidores da empresa, Eduardo Puziello.
Galletti reforçou a ideia. Enfatizou que a cultura corporativa da empresa de Barretos (SP), que abriu o capital em 2007, foi “forjada” e liderada por ele e Ticle e disse que a expectativa com o realinhamento é que a Minerva recobre de vez a confiança dos investidores.
Segundo Galletti e Ticle, as perspectivas operacionais da companhia são favoráveis. Após dois trimestres difíceis, nos quais a Minerva amargou forte aumento de gastos com capital de giro devido à integração das operações no Mercosul e sofreu com a sobreoferta de carne de frango no Brasil, a tendência é de recuperação, disseram ambos.
Em boa medida, o otimismo decorre do câmbio. Com operações voltadas à exportação, a companhia já tem se beneficiado da valorização do dólar no Brasil e na Argentina, e os reflexos positivos da escalada deverão aparecer nos resultados operacionais deste segunda trimestre.
No médio prazo, o dólar mais forte tende a impulsionar a receita – e a geração de caixa – da Minerva, afirmou Ticle. A expectativa é alcançar receita líquida de R$ 15 bilhões este ano, mas os cálculos foram feitos com o dólar a R$ 3,40. Com a moeda americana acima de R$ 3,60, o faturamento deverá superar a projeção.
Considerando uma margem Ebitda histórica de 8% a 10%, a empresa também deverá conseguir reduzir a alavancagem (relação entre dívida líquida e Ebitda em 12 meses). Em março, o índice estava em 4,5 vezes.
Questionado, Ticle evitou estipular uma meta de redução do índice até o fim do ano. Mas admitiu que, com o impacto negativo da alta do dólar sobre o valor em reais das dívidas da Minerva, a velocidade da redução da alavancagem pode ser afetada em relação ao que ele mesmo imaginava no fim de 2017.
Na ocasião, a expectativa era um índice de 3 vezes. Mas o que importa, disse, é que a trajetória de queda da alavancagem ao longo de 2018 está garantida. “A trajetória é descendente, ainda que fatores exógenos afetem a velocidade” (Assessoria de Comunicação, 28/5/18)