17/10/2019

Com dívidas de R$ 3 bi, Renova Energia pede recuperação judicial

Com dívidas de R$ 3 bi, Renova Energia pede recuperação judicial

Empresa, controlada pela estatal mineira Cemig, vinha há algum tempo tentando vender ativos para resolver suas pendências.

Em crise desde 2016, após uma parceria frustrada com a americana SunEdison, a Renova Energia entrou ontem em recuperação judicial. A empresa, controlada pela estatal mineira Cemig, vinha tentando se desfazer de ativos para conseguir honrar seus compromissos, mas não conseguiu chegar a um acordo e foi obrigada a recorrer à proteção judicial. O pedido inclui 61 empresas do grupo e envolve a renegociação de R$ 3,1 bilhões em dívida.

Na petição feita pela advogada Fabiana Solano, do escritório Felsberg Advogados, a empresa argumenta que um dos principais fatores que levou a pedir a recuperação judicial foi o fim das negociações com a AES Tietê na venda do parque eólico Alto Sertão III, na Bahia. Na semana passada, a multinacional americana anunciou a desistência da compra por divergências em relação às condições da vendedora. 

A Renova contava com a conclusão do negócio para reforçar o caixa e se recuperar. Segundo a empresa, “mesmo diante de sucessivos aportes e adiantamentos dos contratos de energia realizados por acionistas, não foi possível concluir o projeto”. Alto Sertão III está paralisado desde 2016 e tem 85% das obras concluídas. 

No total, foram gastos R$ 2,1 bilhões, sendo quase R$ 1 bilhão de dívidas com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) – originalmente, esse valor era de R$ 650 milhões referente a um empréstimo ponte que vem sendo renovado a juros altos. Para concluir o projeto, faltam R$ 450 milhões, apurou o Estado. Segundo a Renova, a paralisação ocorre porque os recursos originalmente destinados à finalização do projeto acabaram sendo consumidos em grande maioria por juros e amortizações das dívidas.

Por causa dos atrasos no projeto, o grupo tem sido obrigado a comprar energia no mercado à vista para cumprir seus contratos de fornecimento de energia. “Tal necessidade de compra de energia tem contribuído definitivamente para o endividamento do grupo Renova, ressaltando-se que, apenas no ano de 2018, a despesa com a compra de energia somou R$ 815 milhões”, disse a empresa, no pedido de recuperação.

Fontes ligadas ao processo afirmam que o fim das negociações com a AES Tietê foi um baque para a Renova e seus acionistas que vinham conversando com o BNDES para adiar o pagamento da dívida de R$ 1 bilhão, vencida dia 15. O banco já tinha aceitado prorrogar o vencimento para dezembro de 2021 desde que Cemig e Light (sócias do grupo) dessem novas garantias.

A princípio, as duas sócias aceitaram o acordo, mas na semana passada, após a desistência da AES Tietê, a Cemig mudou de ideia. Na sexta-feira, reuniu os conselheiros e apresentou a proposta de recuperação judicial. Agora o BNDES deverá executar a fianças bancárias de bancos privados equivalentes a 55% do valor da dívida (ou seja, cerca de R$ 550 milhões). 

A Light, por sua vez, decidiu vender, na segunda-feira, sua participação de 17% ao fundo CG I, dos sócios fundadores Ricardo Delneri e Renato do Amaral, por R$ 1. A presidente da Light, Ana Marta Horta Veloso, explicou que a empresa tinha cláusulas contratuais, chamadas de covenants, que não permitiam empresas controladas entrarem em recuperação judicial sob pena de anteciparem vencimentos. “A Light poderia sofrer um cross default em toda a sua dívida.” Ela afirma que há algum tempo a Light vinha tentando se desfazer de sua participação na Renova. “Foi um investimento que não deu certo.”

Parceria frustrada

Fundada em 2001, a Renova tem como sócios a estatal mineira Cemig e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Até 2015, a Renova era uma das empresas mais promissoras no setor elétrico, com um estoque de grandes projetos eólicos. Em junho de 2015, a empresa vendeu 14 parques eólicos à americana SunEdison, por cerca de R$ 1,6 bilhão. Desse valor, cerca de R$ 500 milhões entraram no caixa da empresa em dinheiro, e o pagamento restante foi em ações. 

O negócio, no entanto, foi frustrado com a entrada em recuperação judicial da empresa americana, em 2016. Com dificuldades financeiras nos Estados Unidos, os papéis da SunEdison caíram e a Renova teve de amargar perdas milionárias. Ao mesmo tempo, a empresa brasileira tinha projetos que já haviam entrado em leilão e precisava ser construída. No entanto, faltou dinheiro para cumprir todos os compromissos.

Desde então, a Renova vem se desfazendo de seus parques eólicos para fazer frente aos compromissos. Alto Sertão I foi vendida para a canadense Brookfield e Alto Sertão II, para a AES Tietê. As duas multinacionais chegaram a negociar a compra de Alto Sertão III, mas desistiram. Boa parte do dinheiro conseguido com as vendas foi usado para pagar dívida com o Banco do Brasil, diz uma fonte ligada à empresa (O Estado de S.Paulo, 17/10/19)