26/03/2018

Com queda da Selic, produtor rural abre mão de crédito subsidiado

 A queda na taxa de juros (Selic), que chegou esta semana a 6,5% ao ano, vem provocando uma mudança no crédito rural no País

Juros subsidiados pelo governo foram fixados em 8,5%, quando a Selic estava em 10,25%, mas agora operações diretas com os bancos se tornaram mais atrativas e vêm ganhando espaço.

queda na taxa de juros (Selic), que chegou esta semana a 6,5% ao ano, vem provocando uma mudança no crédito rural no País. Parte dos produtores começa a migrar dos empréstimos subsidiados pelo governo federal – fixados, em média, em 8,5% ao ano – para financiamentos com juros de mercado dos bancos, que se tornaram mais atrativos.

No início da safra, em julho do ano passado, a Selic, usada como base para captação de recursos a serem emprestados, estava em 10,25% ao ano. Por isso, a taxa do crédito subsidiado foi fixada em 8,5%. Ao longo dos meses, porém, a taxa básica despencou para 6,5%, e os bancos começaram a oferecer crédito com juros mais competitivos. Desde julho, o volume de financiamentos com juros de mercado cresceu 54%, enquanto as operações com juro subsidiado subiram 2,6%. No total, o crédito rural ofertado avançou 10,6% no período, para R$ 107,554 bilhões, segundo dados do Banco Central.

Para os produtores, mesmo que o financiamento bancário tenha a mesma taxa que a do crédito subsidiado, a operação vale a pena, por causa da facilidade maior em relação aos recursos oferecidos pelo governo. “A exigência de contratar projetos técnicos e assistência técnica como parte do porcentual do financiamento liberado são fatores que têm inibido a procura pelo crédito com juros controlados”, diz Fernanda Schwantes, assessora técnica da Comissão de Política Agrícola da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). 

O Banco do Brasil, principal operador de crédito rural do País, foi o maior responsável pela alta na tomada recursos por agricultores e pecuaristas com juros de mercado. O volume de crédito agropecuário contratado com juro livre no BB disparou 190,5% nos oito primeiros meses da safra 2017/2018, de R$ 2,859 bilhões para R$ 8,306 bilhões. A participação desse tipo de operação no volume total de crédito agrícola da instituição saltou de 7,19% para 16,54%.

Para Tarcísio Hübner, vice-presidente de Agronegócios do BB, além do impacto da queda da Selic nos juros para a captação e empréstimo dos bancos aos agropecuaristas, a alta no volume contratado com juro livre foi motivada também pela autorização para que recursos de Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs) fossem utilizados nessas operações. “A mudança na regulamentação permitiu que parte das operações com LCA fosse destinada ao custeio, investimentos e estocagem.” 

Para o superintendente de Agronegócios do Santander, Carlos Aguiar, ainda é esperado um aumento da demanda por crédito nos próximos três meses, até o final da atual safra. “Os produtores estão colhendo uma safra boa e o otimismo prevalece no setor”, disse (O Estado de S.Paulo, 24/3/18)

 


Burocracia menor de bancos atrai produtores

Para levantar crédito subsidiado, agricultor precisa contratar seguro e registrar projeto.

trajetória de queda na taxa básica de juros (Selic), aliada à maior competição entre os bancos, cria um ambiente confortável para o produtor tomar crédito rural, segundo especialistas ouvidos pelo Broadcast Agro. “Caminhamos para um custo menor de financiamento agrícola embasado pelos sucessivos cortes na Selic. Até mesmo se houver uma mudança nas decisões do Banco Central e os juros passarem a subir, isso não deve frear a concorrência já instalada entre as instituições financeiras”, afirmou Fábio Silveira, sócio da consultoria MacroSector.

No contraponto, o fato de instituições financeiras privadas não estarem tão habituadas a lidar com o produtor rural, e vice-versa, é um dos fatores capazes de elevar o risco dessas operações. O diretor técnico da consultoria IEG FNP, José Vicente Ferraz, acrescenta que as quedas na Selic – que está hoje em 6,5% ao ano – tornam os juros livres mais interessantes, mas não significam que o produtor vá sair totalmente dos financiamentos a taxas controladas. 

“Não acredito que os juros livres cairão abaixo das tarifas controladas pelo governo (hoje em 8,5% ao ano), então, enquanto houver juro barato, o produtor vai continuar tomando”, afirmou. Para ele, um motivo ainda mais relevante para fomentar a migração para os bancos tradicionais é a restrição na oferta de crédito por parte do governo. “O País tem dificuldades fiscais e não sabemos até onde vai a capacidade de financiamento para a agropecuária.”

Produtor de cana-de-açúcar e limão em Bebedouro (SP), o agricultor Luiz Augusto Marino comemorou a simplificação no processo de tomada de crédito rural ocorrida este ano e o fim da burocracia para os empréstimos. Até o ano passado, com a dependência do crédito com juro controlado pelo governo, Marino precisava pagar taxas de projeto e de administração, contratar um seguro e registrar a operação em cartório para obter recursos para suas lavouras.

Este ano, levantou R$ 61,72 mil apenas assinando uma nota promissória rural no momento da compra de defensivos e fertilizantes, na Coopercitrus Cooperativa de Produtores Rurais, na cidade do interior paulista. O valor se tornou um empréstimo a ser pago com um prazo entre um ano e um ano e meio. Os juros de mercado são de 8,5% ao ano, os mesmos da média do crédito rural com juro controlado pelo governo. “Além disso, é uma compra à vista, com preços mais baixos. No ano passado, as compras a prazo, financiadas, tinham mais 8% de incremento nos preços”, disse Marino. 

Segundo a Coopercitrus, essa operação de crédito é chamada de intercooperação, já que a nota promissória rural é descontada na Credicitrus, braço de crédito da cooperativa para o qual o produtor pagará o financiamento. O aumento dessa operação só se tornou possível por causa da queda da Selic, segundo o presidente da cooperativa, José Vicente da Silva. “O recuo na Selic e a burocracia do repasse nos financiamentos oficiais mudaram completamente a tomada de crédito.” 

O gerente de Análise Econômica do Banco Cooperativo Sicredi, Pedro Ramos, concorda que a burocracia para adesão às linhas do Plano Safra afasta a demanda dos produtores rurais. Ele confirma que os cortes na Selic têm feito com que as taxas oferecidas pelas instituições financeiras fiquem cada vez mais semelhantes às taxas do crédito oficial. “Ainda temos uma procura grande para tomada de crédito via linhas a juros controlados, mas está se intensificando a iniciativa dos produtores na direção dos juros livres, algo que não se via antes.” (O Estado de S.Paulo, 24/3/18