Como será o consumo dos estoques de hidratado? – Por Marcos Fava Neves
Nesta análise mensal seguem os principais números e as reflexões tanto para o curto quanto para o longo prazo da cadeia agroindustrial da cana à partir dos fatos da segunda quinzena de setembro e primeira de outubro. Segundo a UNICA, já processamos até o dia 01 de outubro 458 milhões de toneladas (2,3% abaixo do ciclo anterior). O mix está em 63,63% para etanol. Em açúcar foram produzidas 22,27 milhões de toneladas (24% a menos) e de etanol24,39 bilhões de litros (25,05% a mais), sendo 52% a mais de hidratado. Como choveu bem na segunda quinzena de setembro, o processamento de cana foi quase 32% menor que no mesmo período do ano passado. Muitas usinas também já começam a parar.
O ATR/tonelada está em 140,34 (3,09% maior) e o rendimento apurado pelo CTC foi de apenas 65,8 t/ha em setembro, contra 72,4 t/ha na safra anterior, refletindo a seca que castigou os canaviais. Na safra temos 76,06 t/ha contra 79,35 t/ha da anterior. Muitas unidades encerrando as atividades à partir de agora.
No açúcar, como apostei aqui anteriormente e acertei, subiu já mais de 20% neste mês. Também como previ, o Real se valorizou, puxado pelo quadro eleitoral brasileiro. Segundo a Archer, até inicio de outubro cerca de 13,5% do açúcar a ser exportado em 2018/19 já havia sido fixado, abaixo dos 20% tradicionais para o período. O preço de R$ 1.150/tonelada foi o estimulo. O etanol remunera a 15 cents/libra peso. A fixação média está em 13,27 cents/libra peso.
Até setembro as exportações de açúcar caíram 51%. Trouxemos US$ 3,4 bilhões face aos US$ 7 bilhões nos nove primeiros meses de 2017, fruto da decisão por fazer etanol. Continuamos com o problema chamado Índia. Este país começa a exportar mais açúcar com o recente aumento de preços e ligeira desvalorização da rupia. Foram aprovados incentivos (ao transporte para exportação, aos produtores). Países produtores devem entrar na OMC contra a Índia, mas temos que reconhecer que este país tem um problema social no campo. Informações de um jornal "Indian Express" relata 6.351 casos de suicídio de agricultores apenas em 2016. Um equação difícil a seu Governo.
O Brasil também considera entrar na OMC contra a China no caso do açúcar. Nossa exportações caíram 85% após a elevação da tarifa de importação a 90%. Agora são 60 dias de negociações para se tentar uma solução. O próximo passo é ver o que fazer com Índia e Paquistão.
Creio ainda em maior subida dos preços do açúcar por termos menos cana nesta safra e na próxima, pelo mix alto para etanol devido aos preços do petróleo, maior consumo de combustíveis em 2019 pela recuperação da nossa economia. Há ainda informações de possíveis pragas atingindo canaviais da Índia e riscos também na produção europeia. O grande excedente previsto pode não acontecer. No mercado interno o preço já chegou a R$ 65,51 a saca (50 kg) de acordo com o CEPEA. Sigo na aposta!
Em relação aos fatos e números do etanol e energia, a boa notícia foi o uso do hidratado. Pela ANP, nos 12 meses de setembro a agosto consumiu-se 17,03 bilhões de litros, 33% a mais na comparação com o mesmo período. Em setembro, as usinas do Centro-Sul venderam 1,889 bilhão de litros, 35,7% a mais que setembro de 2017 mas quase 4% menor que o mês de agosto, devido a menores importações do NE, que começou a produzir. Segundo a mesma ANP as vendas de hidratado no período de janeiro a julho foram 40,5% maiores, atingindo 9,7 bilhões de litros. De abril a setembro (safra) vendemos 9,9 bilhões de litros, aproximadamente 38,3% a mais que o comparativo do ano anterior. No anidro as vendas caíram 13%, para 4,16 bilhões de litros. Em agosto consumimos, segundo a ANP, incríveis 1,82 bilhão de litros - maior volume mensal da série histórica. Diversos bons números aqui para serem analisados.
E na economia também pode haver aceleração. Em agosto o consumo de combustíveis no Brasil cresceu 2% quando comparado ao mesmo mês de 2017. Foi 3,9% no diesel, queda de 13,7% na gasolina e aumento de 49% no hidratado. No ano a gasolina caiu 13,1% e o etanol hidratado aumentou quase 42%. Preços do hidratado também subiram no período, aposta que acertei, com um aumento entre 25 a 30% desde agosto, segundo o CEPEA.
No longo prazo, excelente estudo da Plural mostra que espera-se um déficit de 800 mil barris por dia em 2030, no caso dos derivados de petróleo, considerando-se o consumo e investimentos previstos, ou seja, mercado pela frente. E a expectativa da Agência Internacional de Energia (AIE) é que os preços do petróleo continuarão altos devido à demanda ter evoluído mais que a produção e estoques estão mais baixos, criando oportunidades ao hidratado também no ciclo 2018/19.
Boa notícia neste ano vindo da cogeração. Desde o início do ano até o final de agosto cresceu 11% e segundo a UNICA, 77% do total gerado veio da cana. Inclusive em julho houve recorde de fornecimento mensal: 4.121,3 megawatts médios. Foi a primeira vez na história em que as usinas sucroalcooleiras geraram mais de 4 mil MW médios em um mês, segundo a CCEE. Isto levou a biomassa a quase 8% do total da matriz energética. Porém, a UNICA alega que mesmo o preço estando alto (R$ 500/MWh) as diferenças de preços não vêm sendo pagas aos geradores, ficando estes créditos acumulados;
A Bolívia também começa a misturar mais etanol na gasolina. Um combustível com 12% de mistura passa a ser comercializado, e se chamará Super 92 e servirá como estímulo à cadeia produtiva pulando de 80 milhões de litros consumidos para 300 milhões em 2025. Foi apresentado pela Dedini no EsalqShow uma mini unidade de processamento de etanol de milho, que pode ser investimento de produtores em fazendas maiores. Muito interessante.
Finalizando... qual seria a minha estratégia com base nos fatos? Onde eu arriscaria agora em outubro/novembro: A recomendação é a de terminar a safra fazendo e estocando o máximo possível de hidratado. A análise da oferta de hidratado na entressafra é a bola da vez, com estoques maiores, mas consumo bem maior. Acho que ainda temos espaço para ver preços mais altos. Começo a prever um ano de 2019 bem melhor para o setor de cana, no acúmulo de notícias do etanol e do açúcar (Prof. Dr. Marcos Fava Neves, especialista em planejamento estratégico do agronegócio, é Provessor Titular dos Cursos de Administração da USP em Ribeirão Preto e da FGV em São Paulo)