Demanda artificial por alimento básico pode prejudicar pequenos produtores
Pequeno produtor, voltado mais para o mercado interno, deverá ter uma saída da crise mais complicada
Outro ponto preocupante são os custos de produção que se elevam.
A agropecuária vive uma situação inédita. Apesar da crise causada pelo coronavírus, a maioria dos preços agrícolas pagos aos produtores está em patamares elevados e, em muitos casos, são recordes.
Os produtos que vão para o mercado externo têm preços garantidos pelo dólar alto e pela intensa demanda externa. Internamente, os itens básicos —arroz, feijão e farinhas— também têm sustentação de preços pela demanda. Ela vem da melhora de renda das famílias de menor poder econômico, aquecida pelo auxílio emergencial.
A saída dessa crise, porém, preocupa, diz Nicole Rennó, pesquisadora do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada).
O grande produtor deverá continuar sendo favorecido pela demanda externa e pelo câmbio. O pequeno, voltado mais para o mercado interno, deverá ter uma saída da crise mais complicada.
A demanda atual pelos produtos básicos é artificial, vinda do programa emergencial. Ela não poderá ser mantida por longo prazo.
Pequeno produtor, voltado mais para o mercado interno, deverá ter uma saída da crise mais complicada - Renato Stockler
Outro ponto preocupante é que os custos de produção estão se elevando, puxados pelo câmbio e pelo bom momento dos preços agrícolas.
A alta de preços dos produtos dá melhor margem aos produtores, mas permite também um ajuste de margens das fornecedoras de insumos.
A pressão maior desse aumento recai sobre os pequenos e médios, os de menor escala e voltados basicamente para o mercado interno. Os grandes têm mais poder de barganha.
Rennó diz que esse cenário favorável para os preços agrícolas tem como fator comum o dólar e a demanda. Eles poderiam ser ainda maiores, contudo, não fosse a produção recorde deste ano.
A agricultura sempre tem uma característica de resiliência nas crises. A decisão de produção ocorre antes, segundo ela. No caso de 2020, os produtores já tinham definidas suas intenções de plantio antes da pandemia. Além disso há uma essencialidade dos alimentos, o que segura a demanda.
Das duas dezenas de produtos acompanhados pelo Cepea, poucos têm preços em queda. Açúcar é um dos destaques na alta (Folha de S.Paulo, 18/8/20)