06/08/2024

Desmatamento prejudica menos o clima do que outros tipos de degradação

Desmatamento prejudica menos o clima do que outros tipos de degradação

Área desmatada em Santarém, no Pará. "Para cada dólar exportado há mais desmatamento do que cada dólar consumido no Brasil", afirma o economista Rafael Feltran-Barbieri Foto Daniel Beltra-dpa-picture-alliance

 

Extração de madeira, queimadas e outras atividades humanas, juntamente com distúrbios naturais, estão liberando mais carbono.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assumiu o cargo em 2023 prometendo combater o desmatamento na amazônia e restaurar a posição de seu país como líder climático, após anos de intensa destruição na maior floresta tropical do mundo sob o comando do antecessor, Jair Bolsonaro (PL).

O compromisso de Lula de acabar com o desmatamento até 2030 está no caminho certo, com taxas reduzidas pela metade, apontam dados do governo. Mas um novo estudo indica que o desmatamento, sozinho, é responsável por apenas uma fração dos danos climáticos envolvendo a amazônia.

A extração de madeira, as queimadas e outras formas de degradação causadas pelo homem, juntamente com os distúrbios naturais do ecossistema amazônico, estão liberando mais dióxido de carbono, que aquece o clima, do que o desmatamento em corte raso, segundo um estudo publicado nesta segunda-feira (5) na revista PNAS (Proceedings of the National Academy of Sciences).

O estudo, que utilizou dados obtidos por escaneamento a laser aéreo da região amazônica, para uma quantificação mais precisa das mudanças na floresta do que nas imagens de satélite, descobriu que a degradação causada pelo homem e os distúrbios naturais foram responsáveis por 83% das emissões de carbono, com 17% de perda por desmatamento.

As florestas têm uma capacidade natural de absorver dióxido de carbono, mas algumas medições atmosféricas nos últimos anos indicam que a amazônia tem liberado mais carbono do que tem absorvido, por causa do desmatamento e da degradação florestal, disseram os pesquisadores.

A amazônia absorve grandes quantidades de dióxido de carbono que são armazenadas em sua vegetação exuberante. Mas, quando as árvores são destruídas, elas liberam esse gás de efeito estufa de volta à atmosfera.

A pesquisa ressalta o dano causado à floresta pelos incêndios após uma seca que transformou a região em um barril de pólvora.

As técnicas utilizadas na pesquisa fornecem um nível de detalhe sem precedentes sobre a degradação florestal na região do Brasil onde a destruição é mais desenfreada, segundo o principal autor do estudo, Ovidiu Csillik, especialista em sensoriamento remoto da Wake Forest University, nos Estados Unidos.

O desmatamento é facilmente detectável em imagens normais de satélite, enquanto a degradação é mais difícil, explicou Csillik.

Os aviões fizeram leituras a laser que forneceram uma imagem tridimensional da floresta tão detalhada que é possível detectar a morte de uma árvore individualmente, acrescentou.

Csillik disse que ficou surpreso ao ver que as tempestades de vento também estavam causando grandes emissões e danos extensos à floresta, derrubando um grande número de árvores.

A descoberta apoia o argumento de que o governo de Lula pode estar excessivamente focado no desmatamento, disseram à Reuters cientistas não envolvidos no estudo.

"O governo acha que se reduzirmos o desmatamento também reduziremos a degradação", disse Erika Berenguer, ecologista tropical da Universidade de Oxford e da Universidade de Lancaster, na Inglaterra.

"Isso é cientificamente incorreto, e é isso que esse artigo também está mostrando", afirmou a pesquisadora, que não participou do estudo.

O gabinete de Lula e o Ministério do Meio Ambiente não responderam imediatamente a pedidos de comentários.

 

Mais de 140 países, incluindo o Brasil, assinaram em 2021 um compromisso global para acabar não apenas com o desmatamento, mas também com outras formas de degradação até o final desta década.

Mas, como a degradação tem muitas causas diferentes, é muito mais complexo monitorar e policiar, disse Manoela Machado, especialista em incêndios do Centro de Pesquisa Climática Woodwell, nos Estados Unidos.

mudança climática está tornando o combate aos incêndios mais complicado. Antes, os incêndios estavam intimamente ligados ao desmatamento, com os fazendeiros derrubando as árvores primeiro e depois incendiando a área para terminar a limpeza para a agricultura, disse a especialista.

Mas isso está mudando, destacou Machado. "Os incêndios podem escapar de seus limites pretendidos e invadir áreas florestais caso o combustível esteja seco o suficiente para permitir que os incêndios se espalhem, o que está se tornando cada vez mais comum devido às ondas de calor e secas severas causadas pelas mudanças climáticas." (Reuters, 5/8/24)