22/01/2018

Disputa entre Lactalis e Vigor pela Itambé está longe do fim

Disputa entre Lactalis e Vigor pela Itambé está longe do fim

Ainda que a mais recente decisão da Justiça tenha sido favorável parcialmente à francesa Lactalis, a disputa entre a empresa e a Vigor, agora controlada pela mexicana Lala, envolvendo a compra da Itambé Alimentos parece longe do fim.

Na última terça-feira, o desembargador César Ciampolini, da Câmara de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, validou a recompra de 50% da Itambé pela CCPR, e a posterior venda de 100% das ações da Itambé à Lactalis. No entanto, em sua decisão, Ciampolini determinou que a Lactalis não pode exercer os direitos de acionista "até eventual decisão em contrário do juízo arbitral".

A decisão do desembargador gerou interpretações divergentes por parte de Itambé e Vigor. No entendimento da Itambé, com a decisão, o único fator que impede a transferência de 100% das ações da empresa para a Lactalis hoje é o ato de concentração, que está em análise pelo Conselho de Administração de Defesa Econômica (Cade).

Em entrevista ao Valor na quarta-feira, o presidente da Itambé, Marcelo Candiotto descartou a possibilidade de a venda da empresa à Lactalis ser revertida pela câmara de arbitragem. Já a interpretação da Vigor, que acusa a CCPR de ter descumprido o acordo de acionistas, é que a câmara pode decidir por desfazer a operação.

A avaliação entre os advogados da Itambé é que se a Vigor provar em arbitragem que houve algum dano para ela, terá direito a uma indenização, mas que o negócio com a Lactalis seria irreversível.

Procurada, a Vigor não se pronunciou, pois o processo está em segredo de Justiça. Mas, em nota, informou que "a decisão judicial preserva seus direitos, já que impede a Lactalis de assumir qualquer papel de acionista da Itambé até a decisão do Tribunal Arbitral, que julgará o mérito da questão".

A briga entre as empresas começou em dezembro depois que a CCPR anunciou, de forma surpreendente, a venda da Itambé à Lactalis, um dia depois de ter concluído a recompra de 50% da empresa. Em reação ao negócio, a Vigor entrou na Justiça e conseguiu uma liminar suspendendo os efeitos da venda de suas ações na Itambé à CCPR, o que também suspendeu a venda da empresa à Lactalis.

A CCPR recorreu e, em nova decisão, no dia 11 deste mês, o juiz Luis Felipe Ferrari Bedendi, da 1ª Vara Empresarial e Conflitos de Arbitragem em São Paulo, validou a recompra dos 50% da Itambé pela CCPR, mas manteve a suspensão à venda da empresa de lácteos à Lactalis, definindo que a decisão sobre a validade da operação seria da arbitragem.

A central recorreu de novo, e o processo foi à segunda instância, para o desembargador Ciampolini.

No processo, a Vigor alega que a venda da Itambé à Lactalis fere o acordo de acionistas que tinha com a CCPR na empresa de lácteos. Controlada até agosto pela J&F, a Vigor é uma das empresas vendidas pelos irmãos Batista na esteira da delação premida. Foi adquirida pela mexicana Lala. A transação envolvia ainda até 100% das ações da Itambé, na qual a Vigor tinha 50%, fatia comprada da CCPR em 2013 por R$ 410 milhões. Na operação, a Lala atribuiu um valor de R$ 4,3 bilhões à Vigor e de R$ 1,4 bilhão à Itambé, montante considerado baixo pela CCPR.

Segundo o acordo de acionistas da Itambé, a CCPR teria direito de preferência para recomprar a fatia de 50% da empresa em caso de venda da Vigor. A CCPR exerceu esse direito, em outra decisão que surpreendeu, já que havia dúvidas sobre sua capacidade financeira.

O acordo de acionistas na Itambé previa ainda que era proibida a venda da empresa para um terceiro que fosse concorrente, o que é caso da Lactalis. O entendimento da Vigor é de que a CCPR deveria ter oferecido a ela o direito de preferência caso não quisesse ficar com a Itambé.

Outro ponto questionado pela Vigor na Justiça é o acordo de NDA (non disclosure agreement) que Lactalis e outras empresas assinaram com a J&F quando fizeram propostas de compra pela Vigor, em meados de 2017. Pelo contrato, as empresas teriam de ficar dois anos sem negociar com a Itambé. Questionada sobre o tema, a Lactalis não se manifestou.

No entendimento da CCPR, a venda da Itambé à Lactalis não descumpriu o acordo de acionistas, uma vez que este teria deixado de valer quando a CCPR voltou a ter o controle da Itambé.

A rapidez com que a CCPR fechou a venda da Itambé para empresa francesa também abriu espaço para questionamentos, uma vez que a dificuldade da central para obter o empréstimo no mercado era evidente.

No processo, a Vigor afirma que a CCPR recebeu a oferta da Lactalis enquanto o acordo de acionistas na Itambé ainda estava em vigor, antes de 4 de dezembro, quando a CCPR pagou os R$ 600 milhões referentes à compra dos 50% da Itambé à Vigor. A reportagem procurou Candiotto ontem para falar do tema, mas não houve retorno.

Na entrevista de quarta, Candiotto disse que para fazer a recompra, a CCPR tomou empréstimo de cerca de R$ 560 milhões, com carência de dois anos e prazo de três anos. Segundo fontes do mercado, o francês BNP Paribas teria participado da operação. Questionado, o presidente da Itambé disse não poder revelar a instituição em decorrência de acordo de confidencialidade. Procurado, o BNP Paribas negou ter feito empréstimo à CCPR.

Antes de conseguir o financiamento, a CCPR tentou obter recursos com o Banco do Brasil, mas não houve tempo hábil para a operação. A Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig) também chegou a autorizar aporte de R$ 587 milhões para garantir a recompra. Mas o empréstimo não ocorreu. Segundo Candiotto, a tentativa da Codemig de juntar bancos como o BDMG, BMI e o BB para financiar o negócio, tornou a operação complexa, inviabilizando-a, já que o prazo de pagamento era curto (Assessoria de Comunicação, 19/1/18)