Dívida das usinas crescerá distância entre líquidas e mais endividadas
Não há no horizonte de algumas safras um cenário realista de retomada de crescimento do setor sucroenegértico. A um conjunto de empresas mais capitalizadas, a expansão ou ao menos a estabilização estão garantidas porque já vinham ocorrendo, mas quando se constata que haverá o aumento da distância destas para as demais – maioria – a expressão menos dolorosa setorialmente é de continuidade do processo de consolidação.
Em paralelo a essa consolidação, continuando de carona com gerente sênior de relacionamento do Rabobank, Manoel Pereira Queiroz – Foto -, o aumento do endividamento está garantido para esta safra. “Sem dúvida, a dívida total do setor irá subir. A magnitude desse aumento, no entanto, depende, além dos preços de etanol e açúcar, da cotação do câmbio, uma vez que entre 35% e 40% da dívida do setor é em moeda estrangeira e do quanto as empresas vão investir, sobretudo em renovação de canavial”, apontou, salientando que poderia ser o segundo ciclo seguido de aumento da alavancagem, já que a instituição ainda trabalha com estabilização ou pequena expansão na safra passada.
De certa maneira era esperado esse aumento da dívida, com produção menor de cana (de 580 a 590 milhões de toneladas, entre vários analistas), menores exportações de açúcar (de 5 a 6 milhões de toneladas) e o que ficou para ser fixado em 2018 na linha de prejuízo de R$ 900 a 950,00 por tonelada (todos os contratos já na casa dos 11 c/lp na ICE Futures de Nova York). E naturalmente a pressão sobre os preços do etanol por ser uma temporada mais alcooleira. O destaque é mesmo o distanciamento que vai aumentando no setor, conforme frisou Pereira Queiroz.
Distâncias no setor
“Temos clientes que, por terem liquidez satisfatória, foram capazes de segurar estoques de etanol para comercializar na entressafra, durante a qual os preços foram maiores e alguns deles também conseguiram fazer boa parte do seu hedge de açúcar antecipadamente, obtendo preços de açúcar VHP acima de R$ 1.100 ou R$ 1.200 reais por tonelada”, explicou. Muito provavelmente companhias que já haviam conseguido mudar o perfil das dívidas e, melhor ainda, entraram nesta safra carregando passivos menores.
O Rabobank não lista o grupo de empresas nestas condições, tampouco se conhece o retrato do sistema financeiro, mas “infelizmente foram poucas. Nossa visão é de que, o ‘gap’ entre empresas saudáveis e empresas em dificuldade aumentou e continuará aumentando”.
O executivo da instituição holandesa, especializada em agronegócio, remete seu argumento à análise da heterogeneidade do setor para mostrar os níveis de alavancagem de sua base de clientes – inclusive divulgada em artigo no mês passado. No grupo dos menos endividados, estão empresas com dívida líquida de R$ 19,00 a R$ 101,00/tonelada, enquanto no lado oposto estão as com débitos de R$ 139,00 a R$ 227,00, mais um grupo “consideravelmente grande, com dívidas ainda mais elevadas e com baixíssima liquidez”.
São os dois últimos que certamente Manoel Pereira Queiroz acredita que continuarão na rabeira, ganhando distância dos líderes, mas como se destacam pela quantidade de empresas e volume de dívida, o setor leva a fama.
Reestruturação de dívidas
O setor tem passado por vários estágios de reestruturação de dívidas, desde que terminou o boom da sucroenergia e 76 unidades foram fechadas e outras tantas entraram em processo de recuperação judicial. E o alongamento do perfil da alavancagem “é sempre parte importante. Quando falamos de reestruturação, contudo, esse alongamento está muito ligado às contrapartidas que a usina está disposta a oferecer, como, em alguns casos, garantias e compromisso de capitalização da companhia, seja por venda de ativos ou por injeção de capital”.
Naturalmente que em cenários complicados como o atual, ainda que haja grandes oportunidades futuras para o negócio como um todo - e o RenovaBio é um deles, como o gerente sênor de relacionamento do Rabobank expõe em artigo -, essas exigências podem ficar mais pesadas.
O que se diferencia, no entanto, como sustenta Pereira Queiroz, é que há instituições financeiras mais capitalizadas e comprometidas com o longo prazo, enquanto outras, mesmo sendo robustas, possuem “ação oportuna”, portanto avessa às renegociações.
Se essa é um viés da consolidação setorial, o outro como ele já disse antes, é a “fusão silenciosa”, quando as empresas mais do topo absorvem a cana das da base (Notícias Agrícolas, 25/4/18)