Dono da Marfrig terá voz forte em nova gigante do setor de carne
Legenda: O empresário Marcos Molina, presidente da Marfrig, que negocia uma fusão com a BRF
Marcos Molina será maior acionista individual da empresa resultante da união com BRF.
Ao contrário do que parece à primeira vista, o empresário Marcos Molina não está se desfazendo da empresa que criou ao promover uma fusão entre BRF e Marfrig. Ele será o maior acionista individual da nova gigante das carnes e deve ter voz ativa.
Na quinta (30), BRF e Marfrig pegaram investidores de surpresa ao anunciar que estudam fusão. As duas empresas assinaram um acordo de exclusividade e vão negociar pelos próximos 90 dias, renováveis por mais 30.
Por causa da discrepância dos valores de mercado, os acionistas da BRF ficarão com 85% do capital da nova empresa, e os da Marfrig, com só 15%. Essas participações, no entanto, não contam toda a história.
Isso ocorre porque a BRF é uma "corporation" --uma empresa sem dono definido com participações bastante diluídas entre vários acionistas. Já o Marfrig sempre foi a chamada "empresa de dono". Molina tem 37% do frigorífico e o controle do negócio.
Cálculos preliminares indicam que o empresário terá entre 5,5% e 6% de participação na nova empresa. Ele estará atrás apenas dos dois maiores acionistas da BRF, os fundos de pensão Petros (Petrobras), com 9,8%, e Previ (Banco do Brasil), com 9,1%.
Conforme apurou a reportagem, os representantes de Petros e Previ só souberam oficialmente da eventual fusão na reunião do conselho da BRF. As conversas vinham sendo conduzidas por Pedro Parente, presidente do conselho, e Lourival Luz, presidente-executivo.
A surpresa não agradou aos fundos. Sob anonimato, duas fontes disseram que a fusão entre Sadia e Perdigão ainda não está consolidada e que a atual diretoria vem sob pressão para mostrar resultados, o que até agora não aconteceu.
Previ e Petros tem interesse em sair do negócio, porque o investimento estaria maduro e próximo do prazo para pagar aos cotistas, mas até agora os preços não foram considerados satisfatórios. A BRF vem acumulando prejuízos, provocados pelos equívocos da gestão de Abilio Diniz e pelas investigações de fraude feitas pela Polícia Federal.
O BNDES, que hoje tem 33,7% da Marfrig, também será acionista relevante da nova gigante das carnes, com 5%. Todavia, o banco já anunciou publicamente que está desinvestindo em grandes empresas. Com a fusão, sua missão de sair da Marfrig se torna mais fácil se os preços forem razoáveis.
Não se sabe ainda o que essas novas participações dos acionistas podem representar em termos de assentos no conselho da futura gigante. O tema promete ser um dos mais complexos nas negociações.
Pessoas próximas a Molina são categóricas em dizer que ele se manterá envolvido no negócio. Conhecido como "self made man", o empresário criou seu frigorífico a partir de um açougue, quase quebrou por causa do endividamento e é um empresário polêmico.
Em maio do ano passado, Molina fechou um acordo com os procuradores da Operação Greenfield e aceitou pagar uma multa de R$ 100 milhões para ter eventuais penas reduzidas se condenado pela acusação de ter pago propina para conseguir empréstimos na Caixa Econômica Federal.
O mercado financeiro viu com reticência a criação da nova gigante das carnes, principalmente para a BRF. A empresa, que vinha vendendo ativos para reduzir a dívida, se tornaria ainda mais complexa com a fusão, já que os negócios de carnes bovina, de frango e suína tem poucas sinergias.
As ações da BRF fecharam esta sexta (31) em queda de 4,5%. As da Marfrig subiram 0,7% (Folha de S.Paulo, 1/6/19)