07/11/2023

Economia verde é “espinha dorsal” de relação entre Brasil e EUA

Economia verde é “espinha dorsal” de relação entre Brasil e EUA

Abrão Neto, CEO da AMCHAM Brasil. Foto Rodrigues Pozzebom-Agência Brasil

 

Janela de oportunidade e de alinhamento entre os dois países deve ser aproveitada, afirma Abrão Neto.

Há uma janela de oportunidade para o Brasil intensificar sua relação bilateral com os Estados Unidos - e se beneficiar de investimentos privados americanos, se avançar rumo à transição para uma economia de baixo carbono. A leitura é do CEO da Amcham Brasil, a câmara americana de comércio para o País, Abrão Neto, que tem liderado conversas com o setor privado e público dos dois países, sobre o tema.

“Estamos em um momento em que Brasil e EUA compartilham a avaliação de priorização da agenda ambiental e climática. Hoje, é a coluna vertebral da relação entre Brasil e EUA, dado o potencial de aproximação entre os dois países e de impacto que pode gerar do ponto de vista econômico e ambiental”, disse o executivo, em entrevista ao Estadão. A Amcham reúne empresas que respondem por um terço do PIB brasileiro.

“Além de prioridade política, tanto brasil como EUA são potências ambientais e potências na agenda climática em razão do volume de recursos ambientais que os dois países guardam, em razão de serem potências energéticas em escala mundial. É fundamental que EUA e Brasil estejam engajados para agenda climática ter sucesso”, afirma o líder da Amcham, que foi secretário de Comércio Exterior do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços no governo Michel Temer.

Em setembro, uma missão com representantes do governo americano e do setor privado dos EUA esteve no Brasil para discutir o assunto. A delegação foi chefiada pelo embaixador David Thorne, assessor sênior de John Kerry, enviado especial do clima do presidente americano Joe Biden, e contou com a presença de representantes de 30 empresas americanas. “Eles foram embora com a melhor sensação possível, até positivamente surpresos com o nível de desenvolvimento, interesse e engajamento do setor privado brasileiro nessa agenda”, diz o CEO da Amcham.

 

Há uma semana, a Amcham lançou a plataforma Brasil Pelo Meio Ambiente, que reúne 183 projetos de 111 empresas associadas, que mobilizam investimentos de R$ 31 bilhões em projetos de preservação ambiental. São projetos em execução ou prestes a serem

A convergência da visão de Washington e Brasília sobre a adoção de uma política de desenvolvimento econômico baseada na transição energética e na descarbonização, no entanto, é fruto de um alinhamento recente entre os governos. Durante o mandato do ex-presidente Donald Trump (2017-2020), a Casa Branca menosprezou informes científicos sobre mudanças climáticas. Ao assumir o Planalto, em 2018, o ex-presidente Jair Bolsonaro endossou o posicionamento de Trump.

A partir de 2021, quando Biden assumiu o governo americano e colocou a questão climática como pilar de suas políticas econômica e externa, Brasília tentou modular o discurso, mas encontrou ceticismo e distanciamento por parte de Washington. Os dois países voltaram a falar a mesma língua a partir de janeiro deste ano, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi empossado e assumiu discurso afinado com a posição de Biden sobre o assunto. Em novembro do ano que vem, os EUA passarão por eleições presidenciais.

“Há uma janela que precisa ser aproveitada, porque o cenário político é favorável, mas também porque existe uma emergência climática e existe o trem da História. Todas as economias e agentes econômicos têm feito essa ação em direção a uma economia de mais baixo carbono. É uma janela e, por vários motivos, o Brasil está bem posicionado, mas precisa se movimentar”, diz o executivo da Amcham.

Segundo o CEO da Amcham, no entanto, o setor empresarial tende a se mover cada vez mais na direção dos investimentos em agenda verde, independentemente da posição dos governos. “Se houver uma mudança política, certamente os agentes vão buscar se reorganizar, mas com uma determinação de dar continuidade a essa transição. Acho que é uma realidade inescapável”, afirma.

No diálogo com o setor empresarial, Abrão Neto tem ouvido o relato recorrente de que, para melhorar o ambiente de negócios, é preciso criar marcos regulatórios ou aperfeiçoar alguns já existentes sobre energias renováveis, hidrogênio verde, combustível sustentável de aviação e outros temas.

A relação comercial entre Brasil e Estados Unidos tradicionalmente esbarrou em áreas onde os países competem pelo mesmo mercado. Na leitura do executivo da Amcham, no entanto, Brasil e EUA podem se complementar na agenda de transição energética, se avançarem em acordos, convergência de padrões e cooperações técnicas.

“Não abordamos essa agenda a partir de uma perspectiva de concorrência, mas de complementaridade e trabalho conjunto. Essa é uma avaliação no setor público e privado. O trabalho em conjunto potencializa os resultados de ambos os países”, diz Abrão.

“Seria importante avançar em acordos e parcerias para desenvolver as cadeias de fornecimento em relação a baterias, por exemplo, tanto na exploração e fornecimento de minerais críticos para bateria, como na cadeia de produção de baterias”, exemplifica Abrão Neto.

O governo americano tem lançado mão de incentivos para estimular a transição energética e a indústria ligada ao tema. É o caso do Inflation Reduction Act, o projeto de lei para reduzir a inflação que injeta US$ 27 bilhões em investimentos verdes e estimula a produção nacional de manufatura para, por exemplo, baterias para carros elétricos.

Brasil e Estados Unidos já lançaram uma aliança para promover e desenvolver biocombustíveis, além de um acordo para cooperar no desenvolvimento de hidrogênio verde e combustível sustentável de aviação (Estadão, 7/11/23)