26/10/2022

Em 100 dias, novo governo poderia 'destravar' Amazônia, defende iniciativa

Em 100 dias, novo governo poderia 'destravar' Amazônia, defende iniciativa

INCENDIO AMAZONIA REUTERS Bruno Kelly.jpg

Canetadas presidenciais podem criar uma secretaria de emergências climáticas, exigir rastreamento do ouro e garantir critério ambiental em projetos de infraestrutura.

O presidente a ser eleito no próximo dia 30 terá à mão minutas de decretos, Medidas Provisórias (MPs) e resoluções que prometem respostas imediatas para a Amazônia, dependendo apenas da canetada do Executivo.

Publicado nesta quarta-feira (26), o conjunto de medidas foi elaborado pela rede Uma Concertação pela Amazônia, que reúne 500 lideranças, entre pesquisadores, representantes de empresas, governos, ONGs e movimentos sociais ligados à pauta do desenvolvimento sustentável para a região.

Embora a guinada no modelo de desenvolvimento da Amazônia implique desafios de médio e longo prazo, a Concertação defende que os primeiros 100 dias do próximo mandato presidencial já poderiam dar o tom das políticas que devem se seguir ao longo dos anos.

"[O início do mandato] representa um momento de renovação, no qual os eleitos contam com a máxima confiança da sociedade para implantar políticas e mudanças necessárias", diz o documento. "Abre-se, portanto, a oportunidade para se estabelecer uma boa governança e adotar medidas inadiáveis".

O documento reúne 14 propostas de atos normativos que teriam papel estratégico para destravar soluções na região amazônica.

Uma das principais medidas foca em governança e criaria, através de Medida Provisória, a Secretaria de Estado de Emergências Climáticas, diretamente vinculada à Presidência da República. O órgão ficaria responsável pela formulação de políticas públicas de clima e pelas negociações nacionais e internacionais sobre o tema.

"Se a Secretaria tiver suporte político de verdade, poderá ter papel na alavancagem dos demais [instrumentos propostos] e fazer a agenda integrada para a Amazônia dar certo", afirma o confundador da Concertação pela Amazônia, Roberto Waack.

Outra proposta que pode gerar efeito dominó no desenvolvimento de políticas públicas é a de um decreto que antecipa para o início do processo decisório a análise socioambiental dos projetos de infraestrutura do governo no âmbito do PPI (Programa de Parcerias de Investimento).

"Essa organização do processo alivia a pressão sobre o licenciamento ambiental, que hoje é o único momento, tardio, de tomada de decisão de um projeto", afirma Ana Cristina Barros, conselheira de infraestrutura do Climate Policy Initiative e membro da Concertação.

Embora o foco do documento não seja a recuperação de normas ambientais desregulamentadas pelo governo atual —algo que já foi proposto em maio pelo Observatório do Clima, com um conjunto de 62 medidas emergenciais— parte das sugestões da Concertação inclui a restituição de conselhos participativos, na área de segurança alimentar, e também a recuperação do programa Bolsa Verde, no setor econômico, que atendia famílias em situação de extrema pobreza em áreas florestais da Amazônia Legal.

 

O documento também recomenda a revogação do Programa de Apoio ao Desenvolvimento
da Mineração Artesanal, lançado no governo Bolsonaro em apoio ao garimpo. Para atacar a mineração ilegal na Amazônia, a proposta traz a minuta de uma Medida Provisória com força de lei que estabelece novos parâmetros para compra e venda do ouro e estrutura um sistema de rastreabilidade e monitoramento do minério.

Nas áreas de saúde e ordenamento territorial, os atos preveem a criação de grupos de trabalho e, no setor de segurança, a priorização do Programa Tático Operacional em Segurança Pública, que deve integrar os sistemas estaduais de segurança na Amazônia Legal.

Das 14 medidas centrais, apenas uma precisará passar pelo Congresso para começar a valer: um projeto de lei para regulamentar e incentivar soluções tecnológicas para esgotamento sanitário descentralizado, voltado a comunidades e propriedades rurais.

As minutas dos atos normativos envolvem setores que vão desde a infraestrutura até a educação e a conectividade, como é exemplo a proposta de resolução que destinaria recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) ao atendimento de comunidades tradicionais e pequenos produtores rurais.

"Essa é uma agenda integrada de desenvolvimento. Em função dessa amplitude, ela interessa e pode ser executada por qualquer governo", afirma a secretária-executiva da Uma Concertação pela Amazônia, Renata Piazzon.

"Dado o imenso retrocesso que vivemos nesses quatro últimos anos, é pouco provável que as propostas voltadas a comando e controle sejam implementadas em caso de reeleição. Provavelmente, um possível governo Jair Bolsonaro (PL) terá, neste campo, uma ação aquém do que propomos", ressalva (Folha de S.Paulo, 26/10/22)