23/04/2018

Embrapa completa 45 anos,investe e inova para enfrentar novos desafios

Embrapa completa 45 anos,investe e inova para enfrentar novos desafios

Uma única pesquisa da Empresa Brasileira de Pesquisa (Embrapa), um bioinsumo formulado com bactérias que fixam o nitrogênio do ar e que hoje alcança 33,9 milhões de hectares de soja, permitiu aos agricultores e o país economizarem R$ 42,3 bilhões – cerca de 14 vezes o orçamento anual da Empresa - apenas na última safra. Com essa inovação, os agricultores não precisam gastar com fertilizante nitrogenado. Este é apenas um exemplo do resultado da ciência aplicada à agricultura brasileira.

 

Exemplos como esse tornaram o País um dos maiores produtores mundiais de alimento e consolidaram uma revolução na agricultura da faixa tropical do planeta. O quadro é bem diferente de quatro décadas atrás, quando o Brasil era conhecido por produzir açúcar e café, mas importava praticamente todo o resto, e até alimentos básicos como arroz, leite ou feijão.

 

Prestes a completar 45 anos no próximo dia 26 de abril, a Embrapa anunciará na semana que vem os resultados do seu novo Balanço Social, elaborado a partir da avaliação do impacto de 113 tecnologias e de cerca de 200 cultivares adotadas e disponibilizadas em 2017. O estudo, cujos detalhes só serão anunciados  em uma solenidade no dia 24, em Brasília-DF, mostrará um lucro social de R$ 37,18 bilhões no ano passado e que para cada real aplicado na Empresa foram devolvidos R$ 11,06 para a sociedade.

"O Balanço Social é uma prova de que o investimento em pesquisa agropecuária mudou a lógica do desenvolvimento do campo brasileiro", afirma Lúcia Gatto, diretora de Gestão Institucional da Embrapa, explicando que na década de 1970 decidiu-se por realizar investimentos sólidos em inovação para área agropecuária, com base em formação de recursos humanos, pesquisa em rede e foco nos problemas dos agricultores. O objetivo era fazer com que o Brasil pudesse alcançar a sua segurança alimentar.

A Embrapa, a rede de universidades, assistência técnica, órgãos estaduais de pesquisa, muitas e muitas parcerias e um espírito empreendedor dos agricultores não apenas fizeram com que o Brasil alcançasse a segurança alimentar para sua população como permitiu exportar os excedentes para quase todos os mercados no mundo. Ainda: ajudou a diminuir o valor da cesta básica em 50% e a cada ano amplia a presença do Brasil entre os maiores exportadores de alimentos do globo, tornando o País líder em inovação agropecuária no mundo tropical - e de onde se espera que saiam os alimentos para uma população cada vez maior.

 

A agropecuária brasileira é hoje uma das mais eficientes e sustentáveis do planeta. Incorporou aos sistemas produtivos uma larga área de terras degradadas dos cerrados, região que hoje é responsável por quase 50% da produção nacional de grãos. A oferta de carne bovina e suína foi quadruplicada e a de frango, ampliada em 22 vezes. Nos últimos 46 anos, o Brasil aumentou a produção de grãos em 555,6%, sem ampliar a área plantada em grandes proporções (163,43%). As crises de abastecimento de produtos básicos, como feijão, arroz e frango, ficaram como lembranças das décadas de 70 e 80. Se no passado o brasileiro só consumia determinadas frutas e hortaliças (como uva e cenoura) em meses específicos, hoje elas estão presentes nas prateleiras o ano inteiro.

 

"Se o Brasil conquistou o posto de influente ator mundial em dois setores de importância vital, o meio ambiente e a segurança alimentar, tal patamar é consequência do trabalho da ciência, aliado à determinação e à ousadia do setor produtivo. Essa parceria precisará ser ainda mais ampliada para se fortalecer as bases que garantirão a qualidade de vida para todos no planeta", argumenta o diretor de Pesquisa & Desenvolvimento da Embrapa, Celso Moretti. Segundo ele, o conhecimento gerado pela ciência ajuda os legisladores a produzir decisões que refletem diretamente na economia e na sociedade.

 

Subsídios a políticas públicas

 

Mas a pesquisa agropecuária não contribui apenas com novas sementes, sistemas de produção mais eficientes, controle de pragas, equipamentos, softwares, melhoramento genético ou subsídios para o agricultor tomar a melhor decisão possível. Propriedade intelectual, transgênicos e código florestal são alguns exemplos de temas de amplo alcance e impacto social que são beneficiados pela contribuição qualificada da pesquisa.

 

Um exemplo pouco percebido de contribuição da pesquisa é o suporte tecnológico para o Plano Agricultura de Baixo Carbono (Plano ABC), voltado para estimular o produtor rural a desenvolver sua atividade com menos impacto ambiental e, assim, reduzir emissões de carbono. É uma medida do Brasil para atender ao compromisso firmado na Conferência do Clima das Nações Unidas (COP 15), de 2009. As principais tecnologias relacionadas são a recuperação de pastagens degradadas, a ampliação da área com integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), com reflorestamento e com plantio direto de qualidade, e a expansão das áreas que fazem uso da fixação biológica de nitrogênio e das iniciativas para aproveitamento dos resíduos sólidos.

 

Outro caso, pouco lembrado, é o Zoneamento Agrícola de Risco Climático (ZARC), que na prática, fez desaparecer do noticiário as fraudes com seguro agrícola. Trata-se de um mapeamento das áreas de produção que indica as melhores datas de plantio de mais de 40 culturas para cada município brasileiro, reduzindo o risco de perdas por fatores climáticos. O zoneamento agrícola é hoje base para o seguro agrícola brasileiro.

 

Prova mais recente, lançada no começo de março deste ano, é o Sistema de Inteligência Territorial da Macrologística da  Agropecuária Brasileira, que reúne, em base georreferenciada, dados sistematizados pela Embrapa sobre produção agropecuária, armazenagem e caminhos das safras dentro do mercado interno e para exportação. A novidade, que pode ser acessada por qualquer cidadão, permite gerar diversos estudos e extrair desse big data informações estratégicas para o planejamento de políticas públicas e do setor produtivo.

 

Futuro e Visão 2030

 

Estimativas da FAO indicam que até 2050 a produção agrícola precisará crescer globalmente 70%, e quase 100% nos países em desenvolvimento, para alimentar a crescente população, excluindo a demanda para biocombustíveis. Assim, os desafios para a Embrapa e seus parceiros são enormes e exigem um olhar atento para o futuro. Além das áreas tradicionais, a Empresa tem investido fortemente em tecnologias de ponta, como sequenciamento de genomas de plantas e animais, clonagem, nanotecnologia e agricultura digital.

 

Ainda assim, a visão é de que é preciso mudar para se adequar às exigências de um processo permanente de transformações. "A Empresa segue em movimento, buscando ajustar-se às mudanças tecnológicas e sociais e aumentar sua eficiência, simplificando seus processos. Por isso, em fevereiro, iniciamos a maior mudança administrativa de nossa história, reduzindo de 15 para seis as áreas administrativas da sede, em Brasília, com corte de funções gratificadas e alteração de toda a estrutura e processos", diz Maurício Lopes, presidente da estatal.

 

No final de 2017, a Embrapa já havia reduzido a quantidade — de 46 para 42 — de Unidades de pesquisa e inovação, com a extinção de cinco Unidades de serviço. Também no ano passado, ela adotou um novo Estatuto, alinhado à Lei das Estatais e produzido com a orientação da Secretaria de Coordenação e Governança das Empresas Estatais (SEST) e do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão. Reflexo das mudanças estruturais que estão sendo implementadas, toda a gestão da programação de pesquisa também passa neste momento por uma grande reformulação, tendo como principal objetivo aumentar a capacidade de inovação da Embrapa e aproximar mais a Empresa das cadeias produtivas.

 

Mudanças também redirecionarão o futuro da Embrapa. Na cerimônia dos seus 45 anos será lançado o documento “Visão 2030: o futuro da agricultura brasileira”, que consolida sinais e tendências globais e nacionais sobre as principais transformações na agricultura em questões científicas, tecnológicas, sociais, econômicas e ambientais e seus potenciais impactos. “Visão 2030” terá versões digital e impressa e oferecerá bases para o planejamento estratégico das organizações públicas e privadas de ciência, tecnologia e inovação (CT&I). Na Embrapa, vai, particularmente, subsidiar novas estratégias e prioridades da Empresa, a produção do próximo plano diretor e, consequentemente, o trabalho dos seus 2.448 pesquisadores.

 

Edson Bolfe, coordenador do Sistema de Inteligência Estratégica da Embrapa (Agropensa) e da produção do documento, diz que “no esforço de análise e de prospecção de cenários buscou-se antever transformações e, assim, contribuir para a definição de diretrizes que orientem a programação de pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I) com foco no desenvolvimento sustentável da agricultura”. O documento traz perspectivas e os principais desafios científicos, tecnológicos e organizacionais baseados em análises do ambiente interno e externo, nacional e internacional e alinhados à Agenda 2030, estabelecida pela Organizações das Nações Unidas (ONU) a partir de 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS).

 

Um dos destaques é a identificação de sete megatendências: Mudanças Socioeconômicas e Espaciais na Agricultura; Intensificação e Sustentabilidade dos Sistemas de Produção Agrícolas; Mudança do Clima; Riscos na Agricultura; Agregação de Valor nas Cadeias Produtivas Agrícolas; Protagonismo dos Consumidores; e Convergência Tecnológica e de Conhecimentos na Agricultura. A publicação explora aspectos relacionados a cada uma das megatendências e sugere, por exemplo, desafios e oportunidades.

 

Alinhada ao documento Visão 2030 será lançada também a plataforma digital Olhares para 2030, que reunirá artigos de opinião de 90 especialistas de diferentes áreas de atuação, com projeções e expectativas de caminhos possíveis para o desenvolvimento sustentável da agricultura brasileira. Os artigos foram agrupados nas sete megatendências, sintetizando as principais forças de transformação da agricultura brasileira para os próximos anos.

De acordo com o diretor de Inovação e Tecnologia, Cleber Soares, a Embrapa tem feito ainda grande esforço para "dar agilidade, mais atenção à atividade-fim e obter maior proximidade com o mercado de inovações tecnológicas e os produtores. Em resumo: garantir que a instituição continue atendendo a sua missão”. O esforço é para garantir a otimização dos processos e o foco da Empresa em inovação e proximidade com o mercado, inclusive pela ampliação das parcerias públicas e privadas.

"Capacidade de influenciar é parte da Missão da Embrapa e será a base de motivação para as mudanças que estamos promovendo para nos alinharmos cada vez mais efetivamente às agendas relevantes do país, fazer escolhas acertadas e definir e perseguir metas de impacto que possam comprovar a qualidade das nossas entregas para a sociedade", conclui o presidente Maurício Lopes.

Serviço:

Cerimônia do 45º Aniversário da Embrapa

Data: 24 de abril de 2018

Horário: 15 horas

Local: Auditório Assis Roberto de Bem, da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, em Brasília-DF

Lançamentos: documento “Visão 2030: o futuro da agricultura brasileira”, Balanço Social 2017, Plataforma Olhares para 2030, Coleção de e-books sobre contribuições da Embrapa para os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, publicações, assinatura de convênios de parcerias e apresentação de tecnologias (Assessoria de Comunicação, 20/4/18)


A crise da Embrapa – Editorial O Estado de S.Paulo

A estatal vive uma deplorável decadência, fruto de desorientação administrativa e estratégica.

A agropecuária brasileira alimenta os 214 milhões de habitantes deste país e ainda exporta para mais um sexto da população mundial, ou 1,3 bilhão de pessoas. Nossa estrutura de produção agropecuária hoje é flexível e diversificada, capaz de se articular com mercados distantes e demandas bastante variáveis. Nas últimas décadas, a lavoura se tornou a salvação da economia brasileira. E, na presente crise econômica, o agro foi o único setor a crescer no ano passado (13%), garantindo um suado aumento de 1% do PIB. 

Grande parte de tal crescimento deve-se a ganhos de produtividade, resultantes de inovações tecnológicas adaptadas às variadas situações de solo e clima do Brasil. Centenas de milhares de tecnologias foram produzidas, desenvolvidas e testadas nos 44 centros de pesquisa da Embrapa.

A Embrapa foi criada em 1973, focada em duas únicas metas: reduzir o preço dos alimentos no mercado nacional e tornar competitivas as exportações de produtos agropecuários. Cumpriu ambos os objetivos e foi muito além, criando uma base tecnológica ajustada à realidade e com viabilidade econômica. Mas, hoje, infelizmente, a estatal vive uma deplorável decadência, fruto de desorientação administrativa e estratégica.

Durante os governos petistas, a Embrapa perdeu relevância e protagonismo, em função de numerosos erros de seus dirigentes. Passou a contribuir cada vez menos para a competitividade da agropecuária, respondendo apenas marginalmente pelos resultados alcançados. A maior parte dos mais de R$ 3 bilhões anuais que custa ao Tesouro Nacional é gasta em atividades-meio. A oferta de tecnologia agora vem de empresas privadas. A estatal passou do claro sucesso experimentado em seus primeiros 20 anos para uma situação paulatina de dificuldades, nos últimos 25 anos.

O descolamento da realidade do campo teve início na gestão 1995-2000. Então diretor, o atual presidente, Maurício Lopes, implantou seis “macroprogramas”, aos quais todos os projetos de pesquisa foram submetidos, de modo compulsório. A mudança se mostrou distante dos problemas reais e a pesquisa aplicada gradativamente deu lugar à produção acadêmica de papers, com temas dispersos. Em meio a outras deficiências de visão – como o abandono dos Laboratórios da Embrapa no Exterior (Labex) – instalou-se um regime interno de direção central, facilitado pelo clima de temor e inquietação. Acabaram-se as discussões democráticas, abertas e francas, como seria da natureza de organizações dedicadas à ciência e às práticas científicas, sobretudo as de caráter público.

No início do ano, a imagem da Embrapa sofreu enorme desgaste perante o mundo rural e a sociedade. O presidente, Maurício Lopes, demitiu sumariamente um renomado pesquisador por um artigo crítico, escrito para este jornal (Por Favor, Embrapa: acorde!O Estado de S. Paulo, 15/1/2018). O gesto suscitou centenas de reações contrárias e foi criticado publicamente por associações, instituições e personalidades, antigos presidentes da Embrapa, secretários de Agricultura, lideranças do agronegócio e acadêmicos. O pesquisador só retornou à Embrapa após decisão da Justiça do Trabalho.

O ministro Blairo Maggi, nessa ocasião, externou claramente a necessidade de mudanças na Embrapa, para reaproximá-la do setor produtivo. Ainda assim, já no final de seu mandato, o presidente da estatal promove mudanças internas, sem debater com os dirigentes dos 44 centros de pesquisa e sem ouvir opiniões externas, seja de associações do agronegócio ou parceiros do setor produtivo.

Pesquisadores e analistas são o maior patrimônio da organização, mas não há recursos para novos projetos de pesquisa. A insegurança e a apatia tomam conta dos outrora centros de excelência. Isso precisa mudar. A Embrapa deve voltar a ser um centro de excelência, produtor de pesquisas aplicadas e tecnologia de ponta. Sua direção será renovada em breve. Com a renovação, espera-se que retome seu relevante papel na construção do futuro do agronegócio (O Estado de S.Paulo, 21/4/18)