Emissão de título de agronegócio perde fôlego
A era da forte expansão do mercado de certificados de recebíveis do agronegócio (CRA) parece ter chegado ao fim. No primeiro trimestre deste ano, o volume de emissões foi de R$ 611 milhões, baixa de 53,78% na comparação com o mesmo período de 2017, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). A queda da taxa de juros reduziu a rentabilidade desses títulos de renda fixa e, consequentemente, o interesse dos investidores.
"Com a Selic em trajetória de queda, é inevitável que tenha um grupos de investidores que comecem a exigir mais retorno, e com isso os olhares acabam migrando para outras opções", afirma Renato Buranello, sócio do VBSO Advogados. O recuo acontece depois de o produto ter apresentado forte crescimento durante a crise econômica. Nos anos de 2015 e 2016, as emissões dobravam ano a ano. No ano passado, no entanto, a tendência já virou e a queda foi de 10,1%.
As emissões de CRA ainda são muito concentradas em emissores com ratings elevados, que não aceitam pagar muito prêmio para fazer a captação, reduzindo assim o apelo do produto. Pagar remuneração abaixo de 100% da taxa interfinanceira (CDI) fazia sentido quando o indexador estava em torno de 14%, mas em 6,5% já não é tão atrativo.
"Quando percebe os juros mais baixos, o investidor preocupa-se mais com a rentabilidade. Ele passa a pedir um rendimento maior no próprio instrumento ou olha outras alternativas", afirma Guilherme Maranhão, executivo responsável por operações de renda fixa do Itaú BBA.
Segundo Maranhão, esse mercado já tem visto mudança em termos de preço, o que é possível confirmar em operações recentes. Para se ter ideia, no primeiro trimestre do ano passado a empresa de logística VLI, avaliada com a nota "AA+", levantou recursos pagando 95% do CDI. Neste ano, São Martinho emitiu um CRA com uma taxa de 99% do CDI mesmo tendo uma nota de crédito melhor: o rating "AAA".
O tipo de companhias que busca esse instrumento de funding também começa a mudar. Hoje, empresas menores têm considerado essa opção. Estão em andamento, por exemplo, ofertas da Usina Coruripe e da Usina Batatais, ambas do setor de açúcar e álcool e com porte menor do que as companhias que tradicionalmente acessavam esse mercado. Buranello, da VBSO Advogados, diz trabalhar em uma operação do setor de máquinas e equipamentos, a primeira do ramo, e espera outros emissores diferentes para esse mercado.
Existe a expectativa também que a busca por mais retorno incentive as operações pulverizadas, conforme Pedro Junqueira, sócio da Uqbar. Diferentemente das ofertas comuns, em que o lastro vem de apenas uma companhia cedente e com boa análise de risco, as operações pulverizadas são feitas a partir de uma carteira com diversos recebíveis, usadas para financiar o produtor rural menor.
Dados do anuário da Uqbar mostram que 89,8% do volume emitido no ano passado foi de operações com risco de crédito concentrado, enquanto apenas 10,2% foram das pulverizadas. Maranhão, do Itaú BBA, diz que o crescimento desses títulos ainda esbarra no custo de estruturação, que acaba sendo muito mais alto, e no perfil dos investidores, que têm pouco costume de aplicar em operações estruturadas.
Enquanto o número de operações pulverizadas ou de novos emissores não engatam, os recursos têm migrado para outras opções como debêntures de infraestrutura, que avançaram no início do ano. Dados da Anbima mostram que os títulos emitidos para financiamento de projetos, seguindo a Lei 12.431, tiveram alta de 263,7% nos primeiros três meses do ano, passando para um total de R$ 3,4 bilhões (Assessoria de Comunicação, 8/3/18)