Energia: Um curto-circuito diplomático na tríplice fronteira
Um fio cruzado aumentou a tensão diplomática entre Brasil e Paraguai em meio à complexa negociação do Tratado de Itaipu. O governo paraguaio está exigindo do Itamaraty e do Ministério de Relações Exteriores da Argentina explicações técnicas sobre o possível descumprimento de um acordo bilateral no setor elétrico.
O imbróglio envolve a hidrelétrica binacional de Yaciretá, controlada por paraguaios e argentinos. O Paraguai descobriu ter havido fornecimento de energia da usina para o Brasil nos dias 26, 27, 28, 29 e 30 de setembro e 6, 7 e 8 de outubro. A transação ocorreu por meio da estação conversora de Garabí, localizada na fronteira entre a Argentina e o Brasil, e envolveu a empresa privada portenha Cammesa. O fornecimento teria sido da ordem de 1000 MW por dia, totalizando cerca de US$ 20 milhões.
Ressalte-se que o tratado de Yaciretá assinado entre Paraguai e Argentina proíbe a comercialização de energia da hidrelétrica para terceiros. Olhando para a “cena do crime” as autoridades paraguaias têm todo o motivo para enxergar um conluio entre Brasil e Argentina: um com o objetivo de comprar energia mais barata; o outro, gerando um bocadinho de divisas e ganhando mercado com a venda de um insumo que não poderia ser comercializado.
O pensamento do governo do Paraguai vai na seguinte direção: “Se o Brasil precisa de energia, que compre de Itaipu”. É mais do que natural que o episódio torne ainda mais complexa a renegociação do tratado da usina. Mesmo porque o presidente paraguaio Mario Benitez precisa dar uma satisfação à oposição e à opinião pública local depois de quase ser alvo de um processo de impeachment, diante da revelação de que o país havia fechado um acordo lesivo aos seus interesses com o Brasil em relação à Itaipu.
Consultado pelo RR, o Ministério de Minas e Energia confirmou oficialmente a transferência. Porém, fez questão de esclarecer que a operação não configura venda. Segundo a Pasta, houve uma “uma troca de energia (operação swap) em caráter não comercial”. Neste contexto, o volume retirado da hidrelétrica é devolvido depois ao país cedente e vice-versa.
O Ministério enfatizou ainda que Brasil e Argentina assinaram em 6 de junho passado uma nova versão do Memorando de Entendimentos, contemplando questões sobre intercâmbios de energia. O governo paraguaio não deverá aceitar tão facilmente a versão oficial. As autoridades locais evocam o Artigo XIV do Tratado de Yaciretá, que estabelece que a aquisição dos serviços da hidrelétrica só pode ser feito pela Água e Energia da Argentina e pela estatal paraguaia Ande (Administração Nacional de Eletricidade).
Ou seja: a própria participação da argentina Cammesa já é uma prova de que o acordo foi descumprido (Relatório Reservado, 14/10/19)