Especialistas criticam MP do governo que regulariza propriedades rurais
Legenda: Especialistas criticam a MP do governo que regulariza propriedades rurais
Segundo dizem, texto abriria brecha para a grilagem. O suposto proprietário é quem declara a posse da terra. Mas o governo diz que só entrega títulos após confirmar as informações.
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O presidente Jair Bolsonaro assinou nesta terça-feira (10) uma medida provisória para regularização das propriedades rurais. Segundo especialistas, o texto abre brechas para a grilagem.
O país tem 18 bases diferentes de registro fundiário - 16% do território brasileiro não estão em nenhuma base de dados. Em outras palavras, ninguém sabe quem é o dono de quê.
A autodeclaração - quando o interessado é quem diz onde é a propriedade, qual o tamanho e há quanto tempo ocupa a área - chegou a ser cogitada pelo governo. A ideia recebeu críticas e, nesta terça, ao sair do Palácio da Alvorada de manhã, o presidente Jair Bolsonaro disse que havia recuado dessa proposta. E até fez piada.
“Não, acho que não vai ser declaração não. Foi comentado isso, não é assim, se não isso aqui seria meu”.
Mais tarde, na cerimônia de assinatura da medida provisória, a palavra autodeclaração não foi usada, mas a proposta é semelhante. O suposto proprietário é quem vai declarar que tem a posse da terra, mas o governo diz que só vai entregar os títulos depois de confirmar todas as informações.
Para o pedido de regularização, vai exigir uma declaração de posse (uma forma de autodeclaração, segundo especialistas, um documento que a pessoa assina para dizer que ocupa a terra que pretende regularizar), uma planta e uma descrição do terreno, o georreferenciamento da área com a posição geográfica exata, como latitude, longitude, comprovante de produtividade e a inscrição obrigatória no cadastro ambiental rural que registra os recursos naturais da terra.
O governo estima que a MP da regularização fundiária deva alcançar cerca de 600 mil famílias instaladas em terras da União nos próximos três anos.
“Nós estamos eliminando a burocracia, as situações arcaicas que eram feitas séculos atrás, décadas atrás, e estamos nos beneficiando da tecnologia. É um grande marco na história do Brasil”, disse Nabhan Garcia, secretário de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura.
“Estamos executando com essa MP um grande programa ambiental. É um combo. Titulação = preservação = responsabilidade. A MP transforma os produtores rurais em parceiros na recuperação ambiental, pois todos terão que aderir às exigências do Código Florestal para garantir a titularidade da terra”, afirmou a ministra da Agricultura, Tereza Cristina.
O governo promete usar a tecnologia para fiscalizar e checar as informações, inclusive com o uso de drones. Nas pequenas e médias propriedades, só vai fiscalizar em solo se houver conflito de informação.
Segundo o governo, quem apresentar informações falsas perderá o direito que tinha reclamado sobre a terra e será alvo de um processo criminal.
Mas o texto da medida provisória facilita a concessão dos títulos, por exemplo, ao alterar a data para a regularização, incluindo as ocupações mais recentes, feitas até 2014. Antes, esse prazo era até 2008.
A ambientalista Brenda Brito, pesquisadora associada do Imazon, disse que essa medida incentiva a grilagem.
“A mensagem que o governo passa, basicamente, é: continuem ocupando terra pública que depois a lei vai ser flexibilizada e vai beneficiar quem está ocupando essa área. Então, o que está sendo feito na prática é uma grande anistia a um crime, que é invadir terra pública, um crime que é previsto desde 1966”.
Paulo Moutinho, especialista do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, afirma que as regras mais flexíveis premiam os infratores.
“Há muitos proprietários e agricultores bastante sérios que estão fazendo direito, mas se você abre uma nova janela para aquele que grilou terra fazer a legalização fundiária, é a mesma de eu estar transferindo parte do patrimônio meu, como brasileiro, para aquele grileiro” (Jornal Nacional, 10/12/19)