Estatais patrocinam eventos que promovem Lula e dão palco ao presidente

Foto Reprodução Blog Hora Brasília
Secom nega ingerência política, e empresas dizem que financiamento segue objetivos estratégicos.
Estatais federais e entidades do Sistema S patrocinaram eventos que promoveram o presidente Lula (PT), deram palco a ele e atenderam bandeira de campanha do terceiro mandato. A verba bancou atos organizados por associações próximas aos petistas e para conferências prometidas à base do partido.
A lista de eventos patrocinados inclui reuniões que o presidente costuma citar como pontos de aproximação do governo com grupos da sociedade civil e movimentos sociais. Um exemplo é a ExpoCatadores, que reúne catadores de materiais recicláveis.
Em 2023, o ato teve patrocínios diretos de BNDES (R$ 200 mil), Caixa (R$ 300 mil), Itaipu (R$ 450 mil), Sebrae (R$ 250 mil) e Conselho Nacional do Sesi (R$ 250 mil).
A ExpoCatadores de 2023 aconteceu em Brasília de 20 a 22 de dezembro. Lula compareceu ao último dia para participar do Natal dos Catadores, ato ao qual costuma ir todos os anos.
Na ocasião, organizadores do evento fizeram reivindicações, deram declarações como "viva o presidente" e se referiram a Lula como uma "esperança para a democracia". Ao final, o presidente fez um discurso.
Em 2024, o petista se recuperava de uma cirurgia para tratar uma hemorragia intracraniana e não participou do ato. Ele foi homenageado com um vídeo desejando-lhe boa recuperação.
Sebrae (R$ 401 mil), Caixa (R$ 300 mil), Itaipu (R$ 200 mil), Correios (R$ 150 mil) e BNDES (R$ 195 mil) patrocinaram o evento. Além do repasse direto das estatais, em cada ano houve R$ 300 mil da Fundação Banco do Brasil.
A ExpoCatadores também tem financiadores privados. Em 2022, durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), foi realizada sem recursos de estatais, de acordo com lista divulgada na página do evento.
Bancos públicos também ajudaram a retomar a realização de conferências com a sociedade civil, prometidas por Lula a movimentos sociais.
A Caixa repassou R$ 300 mil para a Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, em 2024. O Banco do Brasil patrocinou a Conferência Nacional de Segurança Alimentar (R$ 150 mil), em 2023, e as conferências de Ciência, Tecnologia e Inovação (R$ 1 milhão) e de Cultura (R$ 1,5 milhão), em 2024. Lula discursou em dois desses eventos: no de cultura e no de ciência.
As conferências, marcas dos primeiros mandatos de Lula, são organizadas com a justificativa de levar ao governo propostas da sociedade civil. O petista mencionou esses atos nos primeiros e nos últimos dias de sua campanha eleitoral.
"Realizamos [nos governos anteriores] 74 conferências em âmbito municipal, estadual e nacional, com participação de milhões de pessoas, para discutir os mais diferentes temas", disse em maio de 2022, no lançamento de sua chapa com Geraldo Alckmin (PSB). "Vamos precisar convocar tudo outra vez."
Logo depois de vencer o segundo turno, ele voltou a defender as conferências.
Lula também discursou nos atos de 1º de Maio das centrais sindicais, tanto em 2023 quanto em 2024. As duas edições tiveram patrocínios do Conselho Nacional do Sesi. Os contratos foram de R$ 600 mil e de R$ 500 mil, respectivamente.
De acordo com o site da entidade, quem captou os recursos foi a CUT (Central Única dos Trabalhadores). A organização sindical tem relação estreita com o PT de Lula.
Empresas dizem que patrocínios seguem rito
A Secretaria de Comunicação Social (Secom) da Presidência afirmou que a diversidade de atividades do presidente "implica, naturalmente, em diferentes maneiras de custear a infraestrutura e os serviços envolvidos". Segundo a pasta, há processos de contratação e transparência quando esses eventos são financiados por órgão do governo federal.
A Secom também afirmou que tem a responsabilidade de supervisionar a instância que valida os patrocínios em órgãos federais.
Segundo a nota enviada, "não há que se confundir as competências institucionais da Secom com ingerência na política de empresas estatais ou sobre execução orçamentária ou estratégias específicas de patrocínio, que são definidas de forma autônoma por cada empresa".
O Conselho Nacional do Sesi disse que tanto a ExpoCatadores quanto o 1º de Maio proporcionaram visibilidade institucional. Além disso, afirmou que não houve nenhuma solicitação do governo federal para os patrocínios.
O Sebrae declarou que seus patrocínios cumprem regras e são publicados em ferramentas de transparência. Também afirmou que sua política de apoio a projetos é coerente com a missão de promover o desenvolvimento de pequenos negócios.
A Caixa afirmou que seus patrocínios são selecionados de acordo com o planejamento estratégico, observando os limites legais.
As restrições e pré-requisitos para as contratações também estão em instrução normativa da Secom, disse.
O BNDES afirmou que tem estratégia de patrocínios diversificada. "O patrocínio à ExpoCatadores se enquadra nos projetos de inclusão produtiva e fortalecimento da economia circular."
Itaipu declarou que já havia patrocinado a ExpoCatadores em 2016 e 2017. Também afirmou que tem ações relacionadas a catadores de material reciclável e gestão de resíduos sólidos e que o patrocínio está nesse contexto. Disse ainda que os apoios foram aprovados depois de análise técnica.
Os Correios afirmaram que todos os seus patrocínios têm rigorosa análise técnica, jurídica e administrativa e que negocia sua participação em eventos de forma a maximizar resultados.
O Banco do Brasil disse que seus patrocínios fazem parte de estratégias de visibilidade e posicionamento de marca. Segundo a estatal, essa estratégia é orientada por dados e "baseada nas melhores práticas de mercado". A Fundação Banco do Brasil afirmou que o patrocínio à ExpoCatadores está de acordo com seu plano estratégico.
A CUT declarou que o evento de 1º Maio tem atividades culturais, educativas e de lazer, que são viabilizadas pelos patrocínios. A central sindical também disse que sua proximidade com o governo não influi na obtenção de financiamentos.
A Folha procurou por email a Ancat (Associação Nacional dos Catadores), uma das organizadoras da ExpoCatadores, mas não houve resposta até a conclusão desta reportagem (Folha, 27/5/25)