07/06/2018

Frete tabelado atinge exportação agrícola do país e eleva custos

Frete tabelado atinge exportação agrícola do país e eleva custos

A tabela de fretes instituída pelo governo como uma das medidas para acabar com os protestos de caminhoneiros está afetando os negócios e o escoamento de commodities, o que deve ter impacto negativo nas exportações agrícolas do Brasil em junho, disseram representantes do agronegócio, que já pedem mudanças nas regras.

Os embarques de grãos, por exemplo, têm sido afetados pela redução do escoamento até os portos, os quais já contam com estoques baixos após as manifestações, explicou Flávio Turra, gerente técnico e econômico da Organização das Cooperativas do Paraná (Ocepar), que representa produtores no segundo maior Estado agrícola do Brasil.

“Vai ter impacto nos embarques de junho, os estoques estavam baixos nos portos.”

A situação ocorre em um momento em que o país —maior exportador global de soja e o segundo de milho— ainda tem grande parte de sua safra recorde da oleaginosa para escoar, sem falar da produção do cereal, cujas exportações tendem a ganhar ritmo no segundo semestre.

Questionado se os efeitos da tabela limitariam os embarques neste mês, o presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), André Nassar, afirmou que as exportações de junho serão menores na comparação com igual mês do ano passado.

Essa queda esperada nos embarques deve-se não somente ao fato de o custo ser maior, com o tabelamento, mas também por uma imprecisão na MP que inviabiliza a contratação do frete, pelo tipo do caminhão definido para o transporte de grãos.

“Uma coisa importante: não estamos embarcando porque ninguém sabe o valor do frete por meio da tabela. Nem o ‘caminhão tipo’ que a gente usa está na tabela”, afirmou Nassar, ressaltando que o quadro ainda precisa de ajustes.

Ele explicou que a tabela contempla caminhão de cinco eixos e 25 toneladas para granel, mas “ninguém usa esse tipo de caminhão”. O setor utiliza o veículo com sete eixos (37 toneladas) ou nove eixos (50 toneladas), disse ele.

Nassar ainda ressaltou que o setor do agronegócio foi contra o tabelamento de fretes desde o início de discussões sobre o tema, por considerar tal medida inconstitucional, uma vez que vai contra a prática do livre mercado.

CARNES E CAFÉ

Produtores de aves e suínos, que figuram entre os mais afetados pelos protestos, com perdas de mais de 3 bilhões de reais, começam a arcar agora com custos cada vez maiores com fretes, pois precisam buscar rações para alimentar os animais que ficaram sem alimentos durante a greve.

“O setor não é contra, mas quer a suspensão da tabela até que sejam regularizados alguns equívocos”, disse o vice-presidente e diretor de Mercados da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Ricardo Santin, citando fretes menores para cargas perigosas, o que não deveria acontecer.

Conforme ele, na média o custo com o frete para o produtor já aumentou 25 por cento com a nova tabela, um cenário que tende a prejudicar os embarques neste mês —o Brasil é o maior exportador de carne de frango do mundo e um dos maiores de carne suína.

“Sim, com certeza vai ter decréscimo nas exportações.”

Na área de café, os embarques já acertados tendem a ser honrados, mas representantes notam um aumento de até 100 por cento no custo com frete.

“Praticamente, é impossível fazer tabelamento de fretes em um país continental como o Brasil. Isso gera um efeito cascata para custos com frete, não condiz com a realidade... Todas as intervenções que ocorreram no passado geraram distorções e grandes prejuízos”, afirmou o presidente do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), Nelson Carvalhaes.

A imposição de uma tabela de fretes ocorre em um momento delicado para o setor de café do Brasil, o maior produtor e exportador mundial, já que foi dada a largada à colheita de uma safra recorde, estimada em mais de 58 milhões de sacas pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

À ESPERA DE MUDANÇA

Como a tabela de frete elevou fortemente os custos em algumas rotas, na comparação com os valores anteriores, aqueles produtores e empresas que não detêm transporte próprio estão enfrentando problemas para escoar os produtos aos portos de exportação, comentou Turra, da Ocepar.

“A tabela de fretes ficou muito alta em relação ao preço que vinha sendo praticado anteriormente para o transporte de grãos, e ficou inviabilizado o transporte, principalmente para os contratos anteriores, que têm que usar a nova tabela”, disse ele.

O gerente da Ocepar explicou que, como a tabela prevê a remuneração do retorno do caminhão vazio, o que não era previsto anteriormente, isso quase dobra os custos. Segundo ele, a tabela eleva os custos entre 20 a 120 por cento, dependendo da rota, em relação ao preço praticado anteriormente —no Paraná, na média, o valor subiu 37 por cento.

“O que está acontecendo é que o pessoal está retendo as cargas, no caso de quem não tem caminhão próprio. As cooperativas, as grandes, a maioria tem um número pequeno para atender a demanda deles, esses estão transportando o que podem”, disse

“Os demais (que não têm caminhão) estão aguardando a revisão da tabela da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres). Já teve reunião ontem (de ministros com o setor), e existe uma expectativa de que seja revista a tabela”, acrescentou ele.

Nesta quarta-feira, o ministro da Agricultura, Blairo Maggi, afirmou que a ANTT ficou de “reavaliar” a questão dos fretes.

“A maneira como saiu (a tabela de fretes) acabou ficando em um preço máximo até fora dos padrões que a agricultura e outros setores podem pagar para transportar... São questões técnicas que, passada a fase política, vão ter de ser adequadas”, comentou o ministro após cerimônia de lançamento do Plano Safra 2018/19.

Para Maggi, que se disse contrário a uma tabela de fretes desde “sempre”, a situação já gera valores “duas, duas vezes e meia” mais altos que antes da greve.

“Um mesmo transporte que você gastava 5 mil reais para levar mercadoria do ponto A ao B, na nova tabela está custando 13 mil ou 14 mil reais”, comentou.

Ele ressaltou, no entanto, que a ANTT ainda não tem um prazo para fazer uma avaliação a respeito e que o acordo com os caminhoneiros será mantido.

“Há um acordo com os caminhoneiros, ninguém quer romper. O que precisa fazer são as contas. O que é justo? Ninguém vai romper nada.”

De acordo com relatório da consultoria T&F Agroeconômica, “quem tem soja no interior não está retirando, porque os fretes foram calculados com um valor e agora há que se pagar cerca de 28 por cento a mais”.

O mercado de trigo também está sendo afetado. “No Parará o trigo está sem preço há dez dias, nem para o spot, nem para o futuro na maioria das praças, diante da incerteza sobre o frete”, afirmou a T&F. “Os compradores também não estão retirando, porque precisam reavaliar o frete...” (Reuters, 6/6/18)


Indústria vai recorrer à justiça contra medidas para atender caminhoneiros

Setores industriais do país afirmaram nesta quarta-feira que pretendem recorrer à Justiça contra medidas anunciadas pelo governo de Michel Temer para encerrar a greve de caminhoneiros que paralisou o país no fim de maio.

A Fiesp, federação das indústrias do Estado de São Paulo, vai entrar na quinta-feira com pedido de mandado de segurança na Justiça contra tabelamento do frete, que segundo o presidente em exercício da entidade, José Ricardo Roriz Coelho, já gerou aumentos no custo do transporte da ordem de 30 a 150 por cento.

“Somos contra qualquer tipo de tabelamento. Isso é coisa de 20, 30 anos atrás, não é justo resolver o problema dos caminhoneiros fazendo tabelamento de frete”, disse Coelho, ponderando, porém, que os caminhoneiros fizeram reinvindicação justa sobre a melhoria de suas margens de lucro, pressionadas pela queda no volume de carga nos últimos anos.

“Mais uma vez, para resolver os problemas de outros setores, a indústria é que está pagando a conta. Não é justo a sociedade pagar preço mais caro por ineficiência no sistema de transporte”, acrescentou Coelho.

Em Brasília, porém, o presidente da Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA), Diumar Bueno, disse que o governo não mudará os valores da tabela de frete previstos na Medida Provisória acertada com a categoria para por fim à greve.

Ao sair de uma reunião com o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, para avaliação de cumprimento das medidas adotadas pelo governo, o presidente da CNTA admitiu que pode haver ajustes na tabela de fretes, mas não nos valores.

A reunião ocorreu horas após o ministro da Agricultura, Blairo Maggi, dizer que a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) se comprometeu a revisar os valores da tabela. De acordo com Maggi, o valor do frete mais do que dobrou, em alguns casos.

“Isso (tabela de frete) terá que ser renegociado e repensado junto aos caminhoneiros, até porque se parar a indústria de novo eles não vão ter carga”, disse o presidente da Fiesp.

Em outra frente, as usinas siderúrgicas, representadas pelo Instituto Aço Brasil (IABr) decidiram buscar liminar na Justiça para suspender a redução da alíquota do programa de compensação tributária Reintegra, voltado a exportadores, de 2 para 0,1 por cento, afirmando que a indústria teria direito neste ano a uma elevação de 2 para 3 por cento.

E a indústria de produtos químicos, liderada pela Abiquim, afirmou que também está inclinada a judicializar a questão, decisão que deve ser tomada nos próximos dias, após consultas às empresas associadas.

O presidente-executivo do IABr, Marco Polo de Mello Lopes, citou que a siderurgia brasileira amargou prejuízo de 1,1 bilhão de reais nos 11 dias da greve dos caminhoneiros, tendo que paralisar produção de aço em 17 alto fornos sob risco de danos aos equipamentos. Lopes também afirmou que o tabelamento de fretes poderá gerar uma perda de 3,2 bilhões de reais ao setor. A entidade representa siderúrgicas como CSN, Usiminas, Gerdau e ArcelorMittal.

“Não estamos sendo priorizados, estamos fazendo aqui um desabafo à luz dessa sequência de medidas tomadas pelo governo e que afetam diretamente a nossa competitividade”, disse o presidente do IABr, citando além das medidas tomadas para encerrar a greve dos caminhoneiros decisões que impediram o Brasil de cobrar tarifas de antidumping e contra subsídios sobre importação de aço da China.

No setor químico, que inclui a petroquímica Braskem, a greve deve ter gerado prejuízo de 950 milhões de reais, disse o presidente da entidade, Fernando Figueiredo. Ele calculou que a redução do Reintegra vai gerar um prejuízo para a indústria química de 1,5 bilhão de reais neste ano, além do 1 bilhão de reais em perdas a serem geradas com a extinção do regime especial Reiq, também a reboque da negociação do governo para encerrar a greve dos caminhoneiros.

Mais cedo, o presidente da associação de montadoras de veículos, Anfavea, Antonio Megale, que negocia há meses um programa de incentivo a investimentos no setor, tentou evitar críticas às medidas anunciadas pelo governo Temer, mas afirmou que o tabelamento do frete “não é o melhor caminho” e que “subsídio ao diesel preocupa. O estabelecimento do preço do combustível de forma artificial não é boa solução” (Reuters, 6/6/18)