GDias leva cola à CPI do MST:'Não convencer as pessoas' e 'lealdade' a Lula
GENERAL DIAS - Foto Zeca Ribeiro Câmara dos Deputados
Ex-ministro do GSI depôs sobre atuação da Abin; pergunta sobre golpe militar provocou bate-boca na comissão.
O ex-ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional) general Gonçalves Dias levou à CPI do MST, que investiga o movimento social, uma cola para seu depoimento, incluindo lembretes como "não convencer as pessoas", "respostas curtas" e "se ater aos fatos".
A cola também indica frases como "lealdade ao PR", em alusão ao presidente Lula (PT), e "porquê da minha demissão" —esta última seguida de "ato pessoal/começo de envolvimento plt (sic) na minha função".
GDias, como o militar é conhecido, prestou depoimento na tarde desta terça-feira (1º). As orientações estavam escritas à mão em um bloco de notas que permaneceu à frente do ex-ministro durante sua oitiva.
Também estavam entre as anotações de GDias: "concentrar no que eu fiz", "narrativa – tomei todas as providências", "se ater as minhas atuações" e "ser enfático/burocrático".
O general, amigo de Lula, pediu demissão do cargo em abril após a divulgação de imagens que colocaram em xeque a atuação do órgão durante o ataque golpista de 8 de janeiro. Vídeos do circuito interno da segurança durante a invasão da sede da Presidência da República mostraram uma ação colaborativa de agentes com golpistas e a presença de GDias no local.
A cola indica que o ex-ministro estava preparado para responder a perguntas sobre os atos golpistas de 8 de janeiro —embora o escopo dessa CPI seja o MST. Frases como "o que falou com o presidente sobre a invasão do palácio", "liguei quando cheguei", "execute seu trabalho", "fiz o possível com as informações que tinha" aparecem nas folhas do bloco.
GDias foi convocado para que ele relatasse aos parlamentares da CPI as "ações realizadas pela Agência Brasileira de Inteligência no monitoramento de invasões de terra ocorridas no Brasil" durante o período em que atuou como ministro. O requerimento era de autoria do relator da CPI do MST, deputado Ricardo Salles (PL-SP).
O ex-ministro de Lula havia solicitado ao STF (Supremo Tribunal Federal) para não comparecer à comissão, mas teve seu pedido negado. O ministro André Mendonça, do STF, assegurou a GDias o direito de ficar em silêncio diante de questões que poderiam incriminá-lo, além de poder estar acompanhado de advogado.
Logo no começo do depoimento, Salles fugiu do tema da comissão e questionou o ex-ministro qual a avaliação dele sobre o golpe militar de 1964 no Brasil, referindo-se ao episódio como "revolução" —o que gerou tumulto e bate-boca entre os presentes.
GDias respondeu que o que impulsionou sua carreira militar foi sua "vocação de querer ser soldado" e uma "necessidade de sua família". "Entrar nessa situação se foi bom ou se foi ruim o movimento de 1964 é polêmico. E eu não gostaria de entrar nessa seara", disse.
Salles insistiu ainda outras três vezes na mesma pergunta, gerando reação dos parlamentares que estavam na comissão. "O Exército brasileiro sempre se orgulhou da importante medida de 31 de março de 1964, porque, se não fosse o 31 de março de 1964, nós chegaríamos mais rapidamente onde alguns aqui querem chegar nesse momento. Para mim soa muito estranho para não dizer uma certa traição aos seus colegas de caserna o senhor não dizer que 1964 foi uma boa medida", afirmou Salles.
A deputada Camila Jara (PT-MS) repudiou a declaração do relator e disse que "não é aceitável que alguém eleito democraticamente faça apologia à ditadura militar". Sâmia Bonfim (PSOL-SP) disse que Salles é "covarde".
"O senhor é um parlamentar, o senhor não deveria aplaudir os horrores da ditadura contra a população brasileira. O senhor cale a sua boca porque estou utilizando o meu tempo de fala. O senhor não gosta de democracia, não gosta de ouvir as mulheres falando e é por isso que faz elogios à ditadura", disse a deputada do PSOL.
A presidente do PT, Gleisi Hoffmann (PR), indicou que poderá acionar Salles no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara. "Nós vamos buscar para que ele [Salles] tenha um processo na Comissão de Ética porque não é possível um deputado eleito para o Congresso Nacional fazer apologia da ditadura, defender 1964 e desmerecer a democracia", afirmou.
Na sessão, Salles associou ainda o movimento sem-terra a atos terroristas e perguntou se GDias havia recebido alertas das invasões que ocorreram neste ano enquanto ele esteve à frente do GSI. "Eu, como ministro, não recebi nenhum relatório de inteligência pelo sistema Sisbin [Sistema Brasileiro de Inteligência]", respondeu.
Ao ser questionado se era a favor de invasões de terra, GDias respondeu: "Claro que não. Cada uma tem que ser estudada, cada situação tem que ser estudada. Você não pode trabalhar de maneira genérica".
Ao longo da sessão, parlamentares da oposição fizeram também diversas menções aos atos golpistas de 8 de janeiro e à CPI mista que investiga o ocorrido. GDias respondeu aos questionamentos afirmando que esses atos não fazem parte do escopo da CPI do MST e por isso ele não iria responder.
O ex-ministro ainda deverá prestar depoimento na CPI do 8 de janeiro. No dia 20 de junho, o colegiado aprovou a convocação de GDias, que se tornou um dos alvos preferidos de críticas dos parlamentares da oposição, que o acusam de omissão na invasão das sedes dos três Poderes (Folha, 2/8/49)