Governo Lula é Gleisi na política e Dilma na economia

Lula tem indicado postura mais radicalizada com a presença de Gleisi Hoffmann no governo e com política econômica que lembra a de Dilma. Foto André Dusek – Estadão
Por Carlos Andreazza
Escolhas para enfrentar o futuro e tentar levar o presidente à reeleição combinam voltar-se para dentro do PT e repetir soluções erradas do passado.
Querem nos convencer de que Gleisi Hoffmann não será Gleisi Hoffmann. Caso em que Lula a teria levado ao Planalto – neste momento crítico, de baixa popularidade – para que exercesse papel talvez mesmo contrário à sua natureza. Para de repente compor com o fiscalista petista Haddad. (Perdão pelo oximoro.) Não para valorizar e estimular – explorar – o desenvolvimento das características por que se tornou agente política influente.
Querem nos convencer de que Hoffmann entraria no governo – em ministério com lugar no Planalto – para dialogar-negociar-costurar discretamente; e não para materializar-radicalizar-vocalizar o movimento por meio do qual o presidente se fecharia (ainda mais) entre os seus, acirrado também o compromisso com as ideias econômicas que compõem este Dilma III.
Tudo é possível. Até a Gleisi Paz e Amor. Caso em que a ministra destoaria, uma vez que todo o corpo do governo reativo se apruma – com Haddad, com tudo – para a radicalização. Para grau a mais de radicalização. Para o ensimesmamento que confirma vieses – como o de que o problema seria de comunicação. O horizonte é 2026. O propósito, a reeleição. Tiro curto. E as escolhas para enfrentar esse futuro combinam voltar-se para dentro (do PT) e repetir soluções (erradas) do passado.
Hoffmann não destoará. É a própria expressão do movimento. Vem para a luta. Para defender e acelerar uma agenda. A de sustentação artificial do voo de galinha da economia brasileira, induzido por meio da derrama de bilhões em arreganhos fiscais e parafiscais – gastança mesmo – e da jorração recordista de créditos estatais. Dilma III. Por Dilma IV.
Lula dobrará a aposta. No estímulo ao consumo (e ao endividamento) das famílias. Já está lançado na corrida de tolerância para com a inflação. De súbito não sendo problema uma de 5%, de 6%... Essa é a cabeça. Há também a perfumaria.
Faz pouco foram anunciadas medidas que pretenderiam baratear o preço da comida. Serão zeradas as alíquotas de importação sobre vários produtos. Ação ótima – e de efeito inócuo ou limitadíssimo, se projetada em curto ou médio prazos. A intenção é apenas mostrar que o presidente se mexe. Ele quer passar a mensagem política de que age – de que sacrifica a natureza do governo arrecadador – para combater a inflação, enquanto sua administração trabalha diariamente para atiçá-la. Esse, o mundo real.
As pessoas são o que são. E pioram. Também os governos. Ante a crise de identidade de uma gestão que requenta pizza de vinte anos, frente à rejeição a Lula, diante da inflação de alimentos: Gleisi na política, Dilma na economia. Nenhuma surpresa. Tampouco ilegitimidade. Era previsível. Um governo do PT é um governo do PT, é um governo do PT, é um governo do PT (Estadão, 8/3/25)