23/05/2025

Governo Lula recua em parte das medidas de elevação do IOF após críticas

Governo Lula recua em parte das medidas de elevação do IOF após críticas

Foto Ricardo Stuckert/Divulgação

 

Fazenda diz que 'ouviu país' e revê imposto sobre aplicações de fundos brasileiros no exterior e remessas internacionais para investimentos.

 

Horas depois de baixar um decreto para aumentar o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) de uma série de operações de câmbio e crédito de empresas, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chamou uma reunião de emergência e decidiu rever dois pontos da medida, editada pelo presidente nesta quinta-feira (22).

 

Os ministros Rui Costa (Casa Civil), Sidônio Palmeira (Secretaria de Comunicação) e Gleisi Hoffmann (Secretaria de Relações Instituições) se reuniram no Palácio do Planalto na noite desta quinta com técnicos da área jurídica do governo para discutir os ajustes no texto do decreto. Eles pediram uma avaliação da Fazenda sobre a existência de erros na redação.

 

O ministro Fernando Haddad viajou para São Paulo após a entrevista coletiva do anúncio das medidas, mas participou das discussões a distância. A previsão é que o novo decreto seja publicado em edição extra do Diário Oficial da União antes da abertura dos mercados nesta sexta-feira (23).

 

A pasta confirmou, em nota, a mudança no decreto. "Este é um ajuste na medida, feito com equilíbrio, ouvindo o país, e corrigindo rumos sempre que necessário", disse o Ministério da Fazenda.

Segundo a pasta, "após diálogo e avaliação técnica", o governo decidiu restaurar o texto que estabelece alíquota zero de IOF sobre aplicações de fundos de investimentos do Brasil em ativos no exterior.

 

Operações internacionais

 

Operação

 

Como era

 

Como fica

 

Cartões de crédito e débito internacionais

 

3,38%

 

3,5%

 

Cartão pré-pago internacional, cheques de viagem para gastos pessoais

 

3,38%

 

3,5%

 

Remessa de recurso para conta do contribuinte brasileiro no exterior para investimento

 

1,1%

 

1,1% (governo havia previsto 3,5%)

 

Compra de moeda em espécie

 

1,1%

 

¨3,5%

 

Empréstimo externo de curto prazo

 

Zero

 

3,5%

 

Transferências relativas a aplicações de fundos no exterior

 

Zero

 

Zero (governo havia previsto 3,5%)

 

Operações não especificadas

 

0,38%

 

Entrada: 0,38% Saída: 3,5%

 



A versão editada na tarde desta quinta previa a cobrança de uma alíquota de 3,5% sobre essas aplicações a partir desta sexta-feira (23), que antes tinham alíquota zero. A alteração tornou-se um dos pontos mais polêmicos, apontado por representantes do mercado financeiro a integrantes do governo.

 

A cúpula do Ministério da Fazenda foi alertada para o problema durante a entrevista de detalhamento das medidas. O próprio secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, acenou com a possibilidade de correções na medida.

 

Um integrante da equipe econômica reconhece que houve um erro de entendimento da Fazenda em relação ao funcionamento dos fundos de investimento, e que o decreto desta quinta permitia que as aplicações fossem tributadas diariamente com o IOF.

 

Outro interlocutor do governo diz que a Fazenda errou a mão no decreto e "foi além do que devia". Segundo ele, a aplicação do IOF de 3,5% configuraria, na prática, um controle na entrada e saída de capitais desses fundos. Daí a necessidade de revogar a medida.

 

Uma segunda mudança, segundo a Fazenda, busca esclarecer que remessas de contribuintes brasileiros ao exterior que sejam destinadas a investimentos continuarão sujeitas à alíquota atual de 1,1%, sem alterações. Pela versão anterior, essa cobrança também subiria a 3,5%.

 

Segundo relatos, o governo identificou que essa alteração estava sendo alvo de desinformação em grupos de mensagem. Integrantes do Executivo afirmam que não havia intenção de elevar o imposto para quem envia dinheiro ao exterior para comprar uma casa, por exemplo, por isso optaram pelo ajuste na redação.

 

A estimativa da equipe econômica é que as mudanças no decreto devem reduzir em R$ 1 bilhão a R$ 2 bilhões o potencial de arrecadação com as alterações no IOF, inicialmente calculado em R$ 20,5 bilhões para 2025. Este valor foi contabilizado no relatório de avaliação do Orçamento e ajudou o governo a reduzir o tamanho do congelamento de despesas necessário para cumprir regras fiscais.

 

O alcance das medidas foi alvo de críticas de empresários ouvidos pela Folha. "É uma explosão de arrecadação insuficiente para uma expansão assustadora do gasto público e não tem como dar certo", disse Flávio Rocha, da Riachuelo.

Integrantes do governo também estão preocupados com a possibilidade de a oposição usar o aumento do IOF sobre compras com cartão de crédito e débito no exterior, cartão pré-pago internacional e cheques de viagem para desgastar o governo Lula.

 

Esta elevação, de 3,38% para 3,5%, está mantida.

 

A redução gradual dessa cobrança havia sido prevista em decreto de 2022, editado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e

buscava alinhamento com as práticas da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), grupo do qual o Brasil almeja fazer parte.

 

Dados da plataforma BuzzMonitor, que acompanha tendências nas redes sociais, apontam para um pico histórico de menções ao IOF. Cerca de 74% das 1.500 publicações coletadas pelo site nas últimas 24 horas, principalmente do X, tinham conotação negativa.

 

O aumento no IOF acabou ofuscando a divulgação do congelamento de R$ 31,3 bilhões de despesas do Orçamento deste ano.

Mais cedo, auxiliares do presidente Lula reclamaram do vazamento da medida antes de o mercado fechar. O ministro dos Transportes, Renan Filho, antecipou as informações (Folha, 23/5/25)