Governo reza para ficar só com os problemas de 2025
Foto Reprodução – Blog Jornalistas Livres
Por Vinicius Torres Freire
Juros e dólar podem estacionar agora em nível alto, mas é preciso haver novidade fiscal.
O governo federal ficou rendido depois do revertério causado pelo anúncio do pacote fiscal. Gente do governo ficou surpresa e sem ação diante da péssima repercussão do plano —foi a reação inclusive daqueles que sabiam do estrago que causaria a notícia da isenção do Imposto de Renda.
Os economistas do governo não teriam como inventar medidas adicionais, no curtíssimo prazo, mesmo que tivessem autorização do presidente da República para tanto.
Parlamentares da oposição fizeram uma nota falsa de 1 dólar com a cara do presidente Lula impressa e a levaram para votação do pacote de gastos. Foto Reprodução – Blog Notícias R7
Ficaram atônitos, torcendo para que a degradação financeira venha a ser menor em janeiro. Quer dizer, que dólar e juros fiquem ainda em níveis horríveis de altos, mas estáveis graças ao chá de camomila aguado do pacote que vai ser aprovado no Congresso e ao fim do dezembro de saídas excepcionais de capital. Torcida.
A reação oficial foi de negação meio amarga mesmo entre pessoas mais conscientes do problema (gasto e juros altos, economia volátil). Nas poucas reações públicas ao pânico financeiro, voltavam a mencionar "erros do mercado", "especuladores".Também voltavam a fazer confusão entre o que são economistas, gestores e donos do dinheiro grosso.
O dinheiro vai para lá ou para cá à procura de retorno maior, risco menor e liquidez (facilidade de ser investido nisso ou naquilo, com custo baixo), dada uma certa proteção contra desapropriação. O conselho e as previsões de economistas (como os do Boletim Focus) podem ser em parte levados em conta nas decisões do dinheiro grosso. É no máximo isso.
Para resumir, importa pouco o que se pensa de toda essa gente, especialmente se não se tem à disposição medidas, recursos ou forças que possam se contrapor ao poder do dinheiro. Um governo terá mais poder se sua dívida é relativamente pequena e contida (e/ou seus juros são baixos), se o país cresce bem, sem inflação, de modo regular.
Em última instância, ao remoer amarguras sobre "o mercado" ou sobre seus porta-vozes, você parece desejar que seus credores ponham dinheiro onde você quer (em títulos do governo, em reais), à taxa que você quer. Hum.
Não quer dizer que governos não possa tributar um montão, de modo socialmente justo, que não possam inventar políticas de desenvolvimento, de ter política econômica alternativa etc. Quer dizer apenas o que está dito.
É até possível lidar com a situação fiscal por outros meios: com inflação e/ou fechamento da economia. Fica ao gosto do freguês, embora tais políticas costumem resultar em crescimento baixo ou pobreza.
Vale lembrar, enfim, que, lá por novembro, esperava-se que uma das consequências positivas do plano de contenção de gastos a ser anunciado fosse a baixa do preço do dólar. Isto é, que passasse da casa dos R$ 5,80 para algo pelo menos perto de uns R$ 5,60. Seria um sintoma de febre menor, claro, mas também um lenitivo, um calmante para pressões inflacionárias.
No otimismo do primeiro trimestre do ano, a gente se iludia até com a possibilidade de dólar a R$ 4,80. Isto é, era otimista com a perspectivas de inflação, juros e política nos EUA; imaginava que haveria remendos no arcabouço fiscal, bastantes pelo menos para sustentar o teto móvel de gastos de Lula 3 até pelo menos 2026.
Agora resta apenas consertar um estrago ainda maior. Luiz Inácio Lula da Silva teria de vir a público para apoiar uma versão aumentada do pacote fiscal. Para piorar, Donald Trump vem aí. (Folha, 20/12/24)