Importação de milho cresce, mas pandemia torna mercado incerto
Legenda: Lavoura de milho no norte do Paraná. - Mauro Zafalon/Folhapress
Compras do cereal vêm da Argentina e do Paraguai e somam 358 mil toneladas no 1º tri.
Maior exportador mundial de milho no ano passado, o Brasil acelera as importações neste ano. Foram 358 mil toneladas no primeiro trimestre, o segundo maior volume para o período desde 2001.
Essas importações ocorreram devido ao temor que os grandes grupos tiveram, no final do ano passado, da falta do cereal neste início de ano. O Brasil exportou demais e houve um atraso no plantio da safra.
Não contavam, até então, com dois fatores que mudariam sensivelmente o mercado de milho: a queda do petróleo e a rápida evolução do coronavírus pelo mundo.
Os temores de escassez de milho do final do ano passado não se confirmaram. A safra brasileira deverá ser recorde e superar 100 milhões de toneladas.
A grande dúvida é como estarão as demandas interna e externa após a pandemia, segundo Leonardo Sologuren, analista do setor. Essa crise, ao contrário das anteriores, está afetando todos os países, e praticamente ao mesmo tempo.
O Brasil vai depender do mercado externo, mas, apesar do câmbio favorável às exportações, a competitividade do produto brasileiro não está garantida no mercado mundial.
A brusca queda do preço do petróleo já fez três dezenas de usinas de etanol fecharem as portas nos Estados Unidos, diz Sologuren.
Os americanos utilizam o milho para a produção do combustível, e os preços derivado do cereal ficam menos competitivos do que os da gasolina, devido à queda do óleo.
Além disso, surgiu o avanço rápido do coronavírus nos EUA, forçando a população a se isolar e a consumir menos combustível. O resultado será uma utilização menor de milho para a produção de etanol e uma disponibilidade maior do cereal para exportações.
Para Sologuren, os preços de Chicago serão uma incógnita no segundo semestre. Além disso, não se sabe o tamanho do colapso mundial e como vai ficar o consumo de proteínas. O milho é um componente importante na produção de rações.
O cenário dos Estados Unidos se repete, em menores proporções, no Brasil. A perda de competitividade do etanol para a gasolina, inibirá o consumo do cereal para a produção do combustível.
Vlamir Brandalizze, também especialista no setor de milho, afirma que o temor de escassez do cereal das grandes empresas não se confirmou. Algumas delas, inclusive, estão com estoques garantidos até junho.
O preço já começa a ceder, mas descerá de um patamar elevado para um patamar bom, o que ainda garante lucro aos produtores, afirma.
Brandalizze não acredita, porém, em mudanças bruscas de preços. Com a pandemia, os consumidores estão buscando alimentos mais confiáveis como leite, ovos e carnes, deixando de lago as comidas exóticas.
Com isso, a demanda por milho, que poderá cair em países como os Estados Unidos, crescerá na Ásia, mantendo um equilíbrio mundial entre oferta e demanda, próximo de 1,1 bilhão de toneladas (Folha de S.Paulo, 8/4/20)
Indústria de carnes precisará de mais milho importado a partir de maio
Parte das indústrias processadoras de carnes de frango e suínos do Brasil precisará buscar mais milho no exterior a partir do mês que vem, dado o alto patamar de preços internos da principal matéria-prima do setor, estimaram a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) e outros participantes do mercado.
A importação poderá ter origem na Argentina e Paraguai, tradicionais fornecedores quando a oferta aperta no Brasil, ou mesmo nos Estados Unidos.
O preço do milho no mercado físico superou 60 reais a saca de 60 kg na semana passada, maior valor nominal da história, segundo o centro de estudos Cepea, após o país começar o ano com baixos estoques depois de exportações recordes em 2019.
“Monitoramos o mercado e o termômetro nos indica necessidade de importação já em maio. A primeira safra (2019/2020) foi muito ruim por causa da seca, a oferta está baixa e os preços muito elevados”, disse o presidente da ABPA, Francisco Turra.
No momento, o país colhe a primeira safra de milho, mas uma frustração pelo clima no Rio Grande do Sul ajudou a sustentar os preços no Brasil, que terá de aguardar a produção da segunda safra chegar ao mercado, somente em meados de junho —a produção do cereal de inverno é a maior do país, respondendo por 75% da colheita total, estimada em cerca de 100 milhões de toneladas.
O milho importado da Argentina e Paraguai chega a ter preços competitivos para algumas indústrias do Sul do Brasil, em relação ao produto vindo do Centro-Oeste devido ao custo de transporte, mesmo com o câmbio oscilando a níveis recordes.
A divisa norte-americana acompanha um movimento de alta global, diante de evidências crescentes de que o mundo já está em uma recessão de grande magnitude.
O dólar à vista fechou a 5,2918 reais na venda e tem oscilado perto de máximas históricas em sessões anteriores.
Turra explicou que, como as moedas da Argentina e Paraguai estão ainda mais enfraquecidas que o real em relação ao dólar, o valor do milho se manteve atrativo para o comprador brasileiro, que já importou o grão em anos anteriores.
“(Com este câmbio) é complicado importar milho dos Estados Unidos. As indústrias do Nordeste sempre precisam trazer alguns volumes de lá, nesse ano ainda não fizeram, mas esta possibilidade não está descartada para breve, principalmente se a safrinha não vier cheia.”
O analista da consultoria Agrifatto, Yago Ferreira, alerta que o contrato de milho na Bolsa de Chicago atingiu 3,28 dólares por bushel nesta segunda-feira, o que, segundo ele, representa 40,60 reais por saca, valor abaixo dos 48,79 reais por saca que o cereal está sendo precificado na B3 atualmente, para entrega em maio.
“Isso por si só já justificaria o fato de que a importação deveria ser posta em pauta pelos consumidores internos”, disse o analista.
Ferreira ressaltou que a segunda safra de milho do Brasil, que está no campo, só chega ao mercado em meados de junho. Ainda que a produção seja boa, deixa um hiato de oferta e demanda entre abril e maio, em algumas regiões do país com baixa oferta na primeira safra.
Em linha com as projeções do mercado, a Agrifatto espera que o país colha 73 milhões de toneladas de milho na safrinha de 2019/2020, queda de 3,31% ante a safra passada.
O agrometeorologia da Rural Clima, Marco Antônio Santos, previu na segunda-feira que uma frente fria provocará chuvas em regiões produtoras do grão da safrinha no Brasil, neste mês, que devem beneficiar as lavouras.
Sobre a importação de milho norte-americano, o analista da Agrifatto considera a hipótese factível, pois a primeira safra brasileira, provavelmente, não será suficiente para reduzir o preço interno a ponto de deixá-lo mais competitivo que o milho que está nos estoques dos EUA.
“Com o problema de demanda nos EUA (quarentena e crise do petróleo), o esmagamento de milho tende a ter uma forte redução, ou seja, abre mais espaço para (a importação do) milho norte-americano.”
COMPRAS EXTERNAS
Somente no primeiro bimestre de 2020, as importações de milho do Brasil saltaram cerca de 235% em relação ao mesmo período do ano passado, para 283,73 mil toneladas, com o Paraguai respondendo quase pela totalidade do cereal importado, de acordo com dados do Ministério da Agricultura.
A JBS, detentora da Seara que atua nas áreas de aves e suínos, foi uma das companhias do setor de carnes que contribuiu para a aquisição deste montante.
A companhia disse à Reuters que negociou cerca de 100 mil toneladas de milho argentino com escala de recebimento em três cargas mensais, sendo a terceira prevista para maio de 2020.
“Os altos custos do milho brasileiro verificados nos últimos meses têm exigido a adoção de medidas alternativas de aquisição do cereal no mercado externo.”
A decisão da JBS está baseada na melhor competitividade apresentada na importação do cereal argentino em relação ao custo atual do grão no Brasil, acrescentou a empresa em nota.
Além das 100 mil toneladas de milho que chegarão para a JBS até maio, outras 100 mil foram importadas pela companhia anteriormente e estavam previstas para chegarem ao país até março, disse uma fonte com conhecimento sobre o assunto sob condição de anonimato.
A BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão, ainda tem mantido as negociações de compra de forma regular e não houve quebra no fornecimento de insumos no Brasil, segundo manifestação da empresa na última semana.
Apesar de não ter optado pela importação neste ano, a BRF não descarta totalmente esta possibilidade, monitora constantemente as condições de preço do mercado e pode optar pelo que for mais competitivo para a empresa, disse à Reuters outra fonte que não quis se identificar (Reuters, 7/4/20)