Impostos brasileiros na mira de Trump
TRUMP Foto Getty Images
Em 2020, EUA abriram investigação sobre práticas tributárias que estariam fora do padrão internacional e teriam características extraterritoriais.
O Brasil escapou da primeira rodada de aumento de tarifas alfandegárias do governo Donald Trump, mas continua no foco da nova administração, como deixou claro o presidente dos Estados Unidos em fala recente.
Em seu primeiro mandato, Trump abriu uma investigação contra diversos países, incluindo o Brasil, por práticas tributárias que estariam fora do padrão internacional e que teriam características extraterritoriais.
O principal alvo dos americanos eram jurisdições que adotavam impostos digitais sobre empresas de tecnologia (digital service tax). Na lista, só o Brasil não tinha esse tipo de tributo.
A ameaça de tributação das big techs americanas foi um dos fatores que levaram os EUA, na administração Joe Biden, a apoiarem o acordo na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) em torno do imposto mínimo global de 15% sobre multinacionais.
Neste início de ano, Trump anunciou que o país não levaria a proposta adiante e ainda voltou a ameaçar quem o fez, como União Europeia, Japão e Brasil.
O presidente dos EUA também quer reduzir o imposto de renda corporativo de 21% para 15%, o que pode levar muitas empresas que atuam no país a ficarem com uma carga inferior ao imposto mínimo, quando se coloca na conta benefícios fiscais que reduzem essa tributação.
A tributação mínima possui três mecanismos básicos. O Brasil adotou o primeiro, um imposto mínimo complementar doméstico (QDMTT na sigla em inglês), que garante o recolhimento desse percentual nas operações de qualquer empresa em território nacional. Nesse caso, não há o que falar em tributação extraterritorial ou fora das regras internacionais.
Parte da Europa adota também outra regra, que permite tributar filiais de empresas europeias nos EUA, por exemplo, a "Income Inclusion Rule", que não existe por aqui.
A avaliação de especialistas no assunto é que o Brasil não poderia ser alvo de sanções dos EUA por adotar o imposto mínimo em seu próprio território. Mas uma coisa é a questão técnica, outra, a política.
Em conversa com a coluna, Romero Tavares, especialista em tributação internacional da PwC Brasil, afirmou que o país tem algo muito mais poderoso para taxar as multinacionais americanas por aqui, como o Imposto de Renda Retido na Fonte sobre serviços e a Cide sobre remessas e royalties. Isso representa uma carga em torno de 25%, na maioria dos casos, bem superior a impostos de outros países sobre empresas de tecnologia, de 2% ou 3%.
Os EUA podem argumentar que o país não segue o padrão OCDE ao fazer essa tributação sobre remessas de serviços, mas se alinha à organização internacional ao adotar o imposto mínimo, o que pode ser visto como uma postura seletiva e discriminatória.
Especialistas na área de impostos internacionais da EY Brasil, Priscila Vergueiro e Gustavo Carmona afirmam que a administração republicana deu sinais de que o problema está no mecanismo adotado pelos europeus, e não pela Receita Federal do Brasil.
Outra fonte de conflito sobre o tema deve surgir nesta semana, no primeiro encontro do grupo das Nações Unidas sobre cooperação fiscal internacional, iniciativa com apoio de Brasil e países do sul-global e oposição dos EUA. O conflito em torno da questão só tende a crescer (Folha, 3/2/15)