18/12/2020

Incra investiga compra de terras por empresas de fundo americano

Incra investiga compra de terras por empresas de fundo americano

No centro da investigação está a Tellus Brasil Participações SA, controlada pela Cosan SA e que também tem como acionistas empresas brasileiras controladas pelo TIAA. Um importante fundo de aposentadoria dos Estados Unidos e um grande produtor de açúcar estão implicados em uma investigação sobre possíveis violações das regras de compra de terras no Brasil.

O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) concluiu em relatório preliminar que o envolvimento indireto do Teachers Insurance and Annuity Association of America (TIAA) em aquisições de propriedades representa uma violação das restrições de compra de terras por estrangeiros.

Embora o TIAA e seu parceiro local, a gigante de açúcar Cosan, digam que estão em conformidade e refutem as acusações, o caso coloca em alerta vários investidores estrangeiros que encontraram maneiras de contornar as restrições de controle para comprar ou arrendar propriedades agrícolas no Brasil, o maior exportador mundial de soja, açúcar, café e carne bovina.

No centro da investigação está a Tellus Brasil Participações SA, controlada pela Cosan SA e que também tem como acionistas empresas brasileiras controladas pelo TIAA.

De acordo com o relatório do Incra, ao qual a Bloomberg teve acesso, várias aquisições da Tellus violam a legislação brasileira. Com isso, a empresa não teria plenos direitos sobre fazendas que somam cerca de 32.000 hectares nos estados do Mato Grosso, Maranhão, Piauí e São Paulo.

O Incra afirma que a Tellus faz parte de um grupo econômico que tem como principais acionistas companhias internacionais, o que torna a firma brasileira equivalente a uma empresa estrangeira. O TIAA e a Cosan Ltd, que tem sede nas Bermudas e controla a Cosan SA, aparecem como acionistas em uma rede de empresas por trás da Tellus.

Entre os integrantes do grupo investigado estão a Cosan SA e a Radar SA, empresa controlada pela Cosan e TIAA, especializada em negócios de terras. Em novembro de 2012, a Radar possuía 392 fazendas em 151.468 hectares, dos quais 43.285 hectares foram comprados naquele ano, segundo outro relatório do Incra.

Embora o parecer de 2010 da Advocacia Geral da União (AGU) tenha limitado a compra de terras por estrangeiros na última década, alguns investidores encontraram maneiras de comprar ou arrendar propriedades rurais.

O TIAA possui a maioria das ações preferenciais da Radar, mas apenas 49% das ações ordinárias com direito a voto, dando o controle da Radar à Cosan.

“Os sócios criaram uma rede nebulosa de empresas brasileiras com o propósito de comprar terras”, segundo relatório da GRAIN, organização com sede na Espanha que monitora compras globais de terras, da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos e da Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais (AATR).

Representantes dos trabalhadores afirmam que o relatório do Incra tem implicações para outros casos semelhantes investigados pela agência.

O TIAA disse que conduz diligência prévia completa e que suas estruturas de negócios estão de acordo com as leis brasileiras. “Continuamos transparentes, prestando contas e responsáveis em nossos investimentos em terras agrícolas”, disse o fundo por e-mail.

Em resposta por e-mail à Bloomberg, o Incra confirmou a denúncia e a investigação, que começou em 2016 e tem avançado lentamente. O órgão aguarda parecer da Procuradoria Federal Especializada, vinculada à AGU, para dar continuidade ao processo administrativo após recurso apresentado pelas empresas em julho. Segundo a regulamentação brasileira, as medidas possíveis incluem a anulação dos títulos de propriedade.

A AGU informou por e-mail que a análise judicial do caso ainda não foi iniciada, porque está no aguardo de um parecer de uma área técnica do Incra após a defesa das empresas ter sido incluída no processo.

A Cosan disse que o Incra fez apenas uma análise preliminar da questão, em vez de oferecer um parecer conclusivo. O grupo disse ainda ter detalhado seu posicionamento no processo administrativo, tendo apresentado uma lista das empresas envolvidas nas aquisições de terras e respectivas estruturas de investimento, demonstrando que “seu controlador é brasileiro nato e que, portanto, todas as aquisições imobiliárias estão de acordo com as condições previstas no parecer da AGU” (Bloomberg, 17/12/20)