Inovação recupera terras para plantio
Áreas de solo degradado e pouco apto para a agricultura viram ‘campeãs’ de produção.
A tecnologia tem mudado a cara das tradicionais fazendas brasileiras. A cada ano, uma série de técnicas desenvolvidas para melhorar o solo e combater os efeitos das intempéries são aplicadas em locais que, em situação normal, teriam poucas condições de produzir. Com a ajuda da inovação, regiões inteiras viraram campeãs de produtividade e diversidade de produtos.
“Normalmente, o que puxa o desenvolvimento desses polos é a terra mais barata e não a qualidade do solo, que é compensada com máquinas e equipamentos modernos e muita tecnologia”, afirma o assessor técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Rogério Avellar. Hoje em dia, a agricultura avança principalmente sobre pastagens degradadas, o que é mais barato do que desmatar. Foi o que ocorreu com Cristalina, no leste de Goiás – cidade localizada a 131 km de Brasília e a 281 km de Goiânia.
Em meados dos anos 1980, pouca gente queria se arriscar por aquelas bandas, ainda sem tradição na produção de grãos ou pecuária. Mas, com a chegada de famílias do Sul e de Minas, a cidade se transformou com a adoção da tecnologia. Ali, quando o clima não favorece, sistemas de irrigação são acionados para garantir a produtividade no campo. A cidade tem a maior área irrigada da América Latina e, por isso, produz o ano inteiro.
Hoje tem 45 diferentes atividades diferentes. Produz soja, trigo, milho, tomate, cenoura, beterraba e café, entre outros. O município é o maior produtor de alho do Brasil e o segundo em cebola e batata. Também tem uma pecuária forte e, recentemente, iniciou a produção de frutas, como pêssego, uva, maçã, atemóia e goiaba.
O mineiro de Capinópolis Edson Carlos da Silva é um dos precursores da fruticultura no município goiano. Há sete anos, ele e outros empresários locais decidiram criar um projeto experimental. Em 10 hectares, iniciaram a plantação de cinco culturas: pêssego, uva, maçã, atemóia e goiaba. A produção é vendida para grandes redes varejistas da região.
Hoje, além da área experimental, o produtor Silva tem, sozinho, 15 hectares com fruticultura. “Nossa ideia é tornar Cristalina um polo de fruticultura”, diz Silva, que tem apoio do Instituto Agronômico (IAC), em Campinas (SP), para desenvolver o negócio na região. Nos últimos meses, ele iniciou a colheita das primeiras frutas na sua propriedade.
O agricultor acabou de fazer a colheita de pêssego, está terminando a de maçã e, em meados de dezembro, fará a de uva. “A qualidade da fruta está muito boa e já conseguimos colocar tudo no mercado, o que era nossa grande preocupação.” Segundo Silva, o retorno do investimento, no entanto, só deve ocorrer em três anos. “Gastamos bastante com irrigação e condução das lavouras. Foi muito tempo de dedicação exclusiva à fruticultura. Agora temos de aguardar resultados.”
Condições ideais
O presidente do Sindicato Rural de Cristalina, Alécio Maróstica, conta que o fator preponderante para o crescimento da agropecuária em Cristalina foi a irrigação, a altitude de quase 1.200 metros e a amplitude térmica (a temperatura varia entre 30 e 15 graus Celsius entre o dia e a noite).
Ele acrescenta que a taxa de crescimento da agricultura na cidade tem variado entre 2,5 mil e 3 mil hectares por ano. Há três anos, diz o dirigente, Cristalina tinha 52 mil hectares de área plantada. Hoje já possui 60 mil. “O potencial de crescimento é enorme, pois há cerca de 280 mil hectares de área com plantio sem irrigação.”
Maróstica alerta, no entanto, que é preciso organizar o negócio: “Temos de começar a olhar a questão da água que tem sido bem séria no País inteiro. Se tiver organização, há capacidade para triplicar a produção aqui”. O que ele quer dizer é que alguns sistemas de irrigação terão de ser alterados para evitar o desperdício de água.
Além disso, os produtores terão de investir mais em barramentos para alimentar a irrigação. Hoje a cidade tem cerca de 150 barragens. “Por causa dos investimentos feitos no passado, tivemos cinco meses de seca e não houve problema nenhum com duas safras.”
Avellar, da CNA, destaca que a adoção de tecnologias é um aliado de peso para os agricultores. Mas é preciso fazer a conta para saber até que ponto vale a pena economicamente. “A tecnologia pode elevar, por exemplo, a produtividade para mais de 100 sacas por hectare. Mas tem de ter retorno financeiro” (O Estado de S.Paulo, 30/11/17)