Jardim: Agtechs tendem a ser menos afetadas pela crise das startups
Francisco Jardim, General Partner da SP Ventures. Linkedin Divulgação
As agfoodtechs, startups voltadas ao agronegócio e à cadeia de alimentos, tendem a ser menos afetadas pela crise que atinge as empresas de tecnologia, avalia o sócio-fundador da gestora SP Ventures, Francisco Jardim.
"Vejo que há uma restrição e escassez de recursos geral no ecossistema que vem contaminando todas as classes de ativos. As agtechs sofrerão impacto, mas acredito que, em linhas gerais, serão muito menos afetadas que outras teses de investimento", disse Jardim, ressaltando que a restrição de recursos por parte de fundos de venture capital (capital de risco) para investimento em startups observada hoje no mundo já foi vista anteriormente em crises financeiras globais como em 2008, 2010 e 2012.
A SP Ventures é o maior fundo de venture capital especializado em startups ligadas ao agronegócio da América Latina.
Ele aponta que até o momento, diferentemente do que ocorreu em startups de outros setores, não observou-se demissões em massas de agtechs e nem planos expressivos de retração. "Não quer dizer que não estão havendo demissões e que não haverá, mas são cortes preventivos. As agfoodtechs estão mais focadas em rever os planos de crescimento do que em diminuir a operação", acrescentou.
Para Jardim, pelo mês três fatores podem explicar a maior resiliência das agfoodtechs à crise atual das empresas de tecnologia e de capital mais seletivo. O primeiro é o fato de terem recebido menos aportes que startups de outros segmentos nos últimos anos, a exemplo das fintechs. "Elas já estavam acostumadas a rodar com cheques menores e, assim, buscar maior eficiência", comentou o executivo.
Além disso, ele avalia que a precificação das rodadas de investimento feitas pelos fundos nas agfoodtechs não foi hiperavaliada, como ocorreu em determinados segmentos. "As empresas que fizeram avaliação de montante de aportes nos últimos anos não fizeram do nada. Não está tão ruim. A festa não foi tão grande e a ressaca também não deve ser", pontuou o sócio-diretor da SP Ventures.
A segunda característica que reforça essa resistência é o próprio setor em que estão inseridas e o bom momento vivido pelo agronegócio. "O agro não está sofrendo ainda com as questões macroeconômicas que afetam em maior peso outros setores. O mercado agrícola brasileiro, por exemplo, está aquecido. A agricultura tem, em sua maioria, receita em dólar, os produtos comercializados não apresentam queda de receita e existem pressões para aumento da produção e para maior adoção de tecnologia, como a segurança alimentar e necessidade de redução das emissões de carbono", apontou Jardim.
Na avaliação do sócio-fundador da SP, as agtechs latino-americanas também estão mais adaptadas à volatilidade da economia, característica comum dos mercados da região. De acordo com ele, nas crises anteriores do venture capital, como na de 2008, o mercado de venture capital latino-americano não foi tão afetado pela crise como o mercado de outros lugares do mundo.
As notícias de aportes nas startups do agro confirmam esse descolamento do cenário das agtechs da conjuntura geral das startups. Levantamento da consultoria de inovação Distrito mostra que as startups brasileiras do agronegócio captaram R$ 54,7 milhões nos primeiros cinco meses deste ano em 10 aportes.
A própria SP Ventures somente neste mês liderou duas novas rodadas de investimento - uma envolvendo a Agroadvance, edtech voltada à educação no campo, em valor não revelado e outra de cerca de R$ 20 milhões na argentina Puna Bio, de tecnologias para recuperação da saúde do solo com microrganismos.
A gestora prevê aplicar recursos em pelo menos ainda outras uma a três agtechs e foodtechs latino-americanas até o fim deste ano. Outras 15 já receberam recursos deste terceiro fundo da SP.
Até o momento, Jardim diz não ter encontrado maior resistência para captação de recursos. O seu último fundo, de R$ 300 milhões que está em andamento, foi captado após início da pandemia, em cenário já de inflação difusa e em meio aos sinais de estruturação da bolha do Nasdaq, relata o gestor.
"Captamos recursos corporativos estratégicos, de grandes famílias e com investidores que possuem estratégia de diversificar aportes. A estratégia é capturar por meio de fontes mistas de recursos", apontou Jardim. O fundo atual da SP tende a ser alocado até o fim de 2023. O próximo deve começar a ser desenhado no primeiro trimestre do próximo ano.
"Em cenário normal, de maior estabilidade, já estaríamos pensando em captar um novo fundo. Na conjuntura atual, com inflação difusa, taxas de juros elevadas, ano eleitoral, risco de calote na Argentina, nova constituição no Chile, há dificuldade em precisar qual seria o tamanho do veículo", explicou (Broadcast, 5/9/22)