Lavouras de café ganham com soluções inovadoras de startups
Legenda: Dispositivo da Grandeo, que faz leitura com luz infravermelha em lavouras
Empresas como Grandeo, ScanFito e QIPixel propõem melhorias no campo a partir de leitura de dados com dispositivo infravermelho e monitoramento por drones ou satélite.
Um dispositivo do tamanho de uma máquina de cartão capaz de fornecer análises quando encostado no fruto do café: essa é a proposta do espectrofotômetro NIR portátil da startup paranaense Grandeo. A invenção é capaz de fazer uma série de diagnósticos por meio de luz infravermelha. “É uma luz especial que tem várias colorações e diversas frequências. Cada molécula do fruto responde de um jeito diferente a essa luz”, explica Alexandre Pereira, consultor da Grandeo.
A partir da luminosidade que é refletida e retorna do fruto, o aparelho consegue fornecer em menos de um minuto análises como taxa de umidade, proteína, açúcar e fibras. É possível avaliar também as folhas e o solo. O usuário pode baixar uma base de dados no celular e conectar a maquininha por meio de bluetooth, mas o próprio dispositivo possui inteligência artificial para locais onde não há conexão à internet.
Tudo começou com um desafio que o fundador da startup, Luciano Paitch, enfrentava na indústria de álcool onde trabalhava: produtos químicos aplicados de maneira inadequada na cana-de-açúcar prejudicavam o processo industrial. Surgiu a ideia de criar um dispositivo que trouxesse portabilidade a processos feitos apenas em grandes equipamentos.
“No modelo tradicional, o produtor ia pegar alguns frutos de café e levar ao laboratório, o que demandava de 5 a 10 dias até o resultado. Nossa solução é instantânea, direto no pé e não destrói o fruto”, relata Pereira.
A utilização do NIR (dispositivo de infravermelho) vai além das lavouras. Pensando no mercado de cafés especiais, a Grandeo foca também na rastreabilidade do produto que chega ao consumidor. As informações geradas por produtores e indústrias são armazenadas. “Vamos enriquecendo tanto o banco de dados que vai chegar o momento em que conseguiremos identificar de onde veio esse café”, diz o consultor.
Atualmente, o dispositivo pode ser utilizado com soja e cana-de-açúcar, e a validação para café e laranja é prometida para breve. Segundo a Grandeo, o aparelho tem sido buscado por produtores e também por cooperativas e indústrias que precisam certificar a qualidade de sua matéria-prima. A expectativa é que o produto se popularize no futuro. “Ao ponto de você levar seu NIR ao mercado, pegar um pedaço de carne e descobrir há quanto tempo mataram a vaca, se tem resquícios de algum remédio veterinário”, prevê Pereira.
Monitoramento a partir do céu
O Brasil é o maior produtor e exportador de café do mundo, segundo a Organização Internacional do Café, e Minas Gerais responde por metade da produção nacional. Com a perspectiva de crescimento e potencial expansão para países da Ásia e do Leste Europeu, onde o consumo ainda é pequeno, as melhorias no campo devem trazer produtividade, analisa o especialista em cafés Ensei Neto, colunista do Estado.
“À medida que tecnologias como a da Grandeo possam ser incorporadas pelo produtor no campo, não só de forma manual, mas futuramente em drones, o produtor vai ganhar em precisão e eficiência”, projeta.
Legenda: Equipe da QIPixel em lavoura de cliente em Itamogi, Minas Gerais
Para fortalecer o mercado, a Embrapa Café, em parceria com as Universidades Federais de Lavras e Viçosa, em Minas, lançou o Avança Café, um programa de pré-aceleração de startups.
Entre as vencedoras da primeira edição, realizada neste ano, está a ScanFito, que oferece monitoramento contínuo da lavoura por meio de imagens de drone. Todo mês, uma equipe da startup vai à plantação do cliente e coleta imagens. Os dados são tratados e geram informações ao produtor, que pode cuidar de cada talhão de maneira específica.
“Não tem desperdício quando ele vai fazer a aplicação de um agrotóxico ou de um adubo”, garante um dos diretores da startup, Julio Martins.
A rastreabilidade também é a aposta da ScanFito para o mercado de cafés especiais. O banco de dados da empresa armazena todos os diagnósticos das plantações ao longo do tempo, desde a plantação até a colheita. “A gente vai ter relatórios sobre os problemas que aquela plantação enfrentou, quais produtos foram aplicados, agregando mais informação e valor”, analisa o diretor-geral, Clever Oliveira.
O foco de outra selecionada do Avança Café, a QIPixel, são os agrônomos. A startup utiliza imagens gratuitas disponibilizadas por satélite a cada cinco dias. Um software processa as imagens e identifica os pontos críticos. A equipe cria um mapa de voo a partir das coordenadas e vai até as fazendas, onde um drone automaticamente produz imagens em 360º.
Assim, os agrônomos podem propor soluções à distância, sem precisar percorrer a lavoura atrás de problemas. “As tecnologias possibilitam um diagnóstico rápido de uma área muito grande e viabilizam uma ação corretiva muito rápida, antes que os problemas se espalhem”, avalia Gabriel Dias, diretor executivo da startup.
A partir das análises dos agrônomos, a meta da QIPixel é desenvolver, no longo prazo, um banco de dados capaz de diagnosticar problemas e propor soluções automaticamente. “O café é uma agricultura com muita variabilidade de ano para ano, tem uma interferência muito grande de fatores climáticos. A nossa intenção é coletar dados técnicos para propor uma inteligência artificial que torne possível trabalhar de forma preditiva”, explica Dias (O Estado de S.Paulo, 24/11/19)