Mercado brasileiro de carbono: o momento é agora
MERCADO DE CARBONO - FOTO PORTAL DA INDUSTRIA - GETTY IMAGES
Ter ambição no escopo e impulso para avançar é fundamental.
O Brasil entrará no seleto grupo de países que têm um mercado regulado de carbono? A resposta depende do futuro do PL 412/2022, atualmente em fase de tramitação na Câmara dos Deputados.
Os mercados regulados de carbono são instrumentos poderosos para a redução da pegada climática de uma nação. Eles ajudam a reduzir as emissões, incentivando ações climáticas nos setores com custos mais baixos. Num mercado regulado, o governo limita as emissões de GEEs de determinados setores econômicos, normalmente aqueles com emissões mais altas, elevando os requisitos ao longo do tempo de forma a atingir seus objetivos climáticos.
São alocadas cotas de emissões às entidades desses setores, conforme o teto estabelecido. Os agentes que conseguirem reduzir as emissões além de suas cotas (normalmente aqueles com custos mais baixos) podem vender suas licenças de emissão a outros que estiverem realizando avanços, mas que ainda não tiverem atingido os níveis exigidos.
Não é de se estranhar que os mercados regulados de carbono estejam se tornando muito populares no mundo todo. Segundo o Banco Mundial, já existem 36 mercados regulados de carbono em vigor ou em fase de implementação ao redor do mundo, cobrindo mais de 17% das emissões globais de GEEs.
A versão atual da proposta de regulamentação do mercado de carbono no Brasil limitaria as emissões de setores não baseados na natureza. As emissões desses setores são significativas: na América Latina, são superiores às emissões totais de qualquer país, com exceção do México.
A proposta prevê regras para a transferência de licenças de carbono entre entidades reguladas e regras para a utilização de créditos de carbono confiáveis gerados por setores não regulados. O projeto de lei também busca promover maior transparência e supervisão por meio de um sistema obrigatório de medição, comunicação e verificação das emissões de GEEs.
Uma crítica feita ao projeto de lei atual é que ele propõe excluir a agricultura, a silvicultura e as mudanças no uso da terra do limite máximo de emissões. Essa é uma questão importante, porque o perfil de emissões do Brasil difere da média global: cerca de três quartos das emissões brutas do Brasil vêm desses setores, ao passo que, globalmente, três quartos das emissões estão relacionadas à energia. O receio é que isso possa reduzir a eficácia do instrumento no tratamento das principais fontes de emissões nacionais: o desmatamento e a agricultura, o que é uma preocupação válida.
A inclusão da agricultura seria potencialmente vantajosa, expandindo significativamente o escopo da regulamentação e a eficiência do sistema, se combinada com inovações técnicas para medir e aumentar o sequestro de carbono no solo.
Para aproveitar ao máximo o mercado regulado, o Brasil se beneficiaria de esforços intensificados em prol de uma agricultura e pecuária mais inteligentes em termos de clima para, assim, realizar progressos significativos em relação a suas metas climáticas.
O redirecionamento dos programas públicos de crédito rural, como o Plano Safra, para práticas agrícolas inteligentes em termos de clima seria um passo fundamental nessa direção. O Plano de Agricultura de Baixo Carbono (ABC+) deveria ser ampliado para melhorar os incentivos existentes, as ações de pesquisa e desenvolvimento e a assistência técnica. A reforma do Imposto sobre a Propriedade
Territorial Rural (ITR) também é crucial. A estrutura atual desse tributo, que incentiva a conversão de terras para a pecuária extensiva, deveria evoluir para recompensar práticas sustentáveis e o uso eficiente da terra.
O mercado regulado de carbono e a reforma tributária seriam dois marcos importantes capazes de colocar o Brasil no caminho certo rumo a um futuro mais verde e próspero. Ademais, alinhariam as políticas climáticas nacionais a boas práticas internacionais e favoreceriam a integração do Brasil aos mercados globais, que valorizam cada vez mais os produtos da economia verde. Mas ter ambição no escopo e impulso para avançar é fundamental. O momento para isso é agora, com o Brasil na Presidência do G20 e prestes a receber as nações do mundo para a 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP-30) (Shireen Mandi é a economista principal do Banco Mundial para o Brasil e doutora em economia pela Universidade de Manchester (Reino Unido); Folha, 14/11/23)