O “exército do Stédile” está de volta – Editorial O Estado de S.Paulo
ESTADÃO AZUL
Ao levar a tiracolo o líder do MST à China, Lula na prática endossou os métodos truculentos daquele bando. É assim que o presidente pretende reconstruir pontes com o agronegócio?
O presidente Lula da Silva escarneceu do Brasil que produz e respeita as leis e a Constituição ao levar uma figura como o sr. João Pedro Stédile, líder máximo do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), na comitiva de sua viagem oficial à China.
Como se não fosse insultuosa o bastante a mera presença de um notório invasor de propriedades no seleto grupo que acompanhou o presidente da República na visita ao maior parceiro comercial do País, Lula ainda permitiu que o chefão do MST figurasse na foto oficial do encontro de cúpula com o presidente chinês, Xi Jinping. Na cerimônia de posse de Dilma Rousseff como presidente do chamado Banco do Brics, Lula também fez questão de mencionar a presença de Stédile na plateia.
Uma deferência assim a alguém que, dias antes da viagem, prometera um “abril vermelho”, ou seja, um mês marcado por mais invasões de terra Brasil afora, leva este jornal a questionar: afinal, o que pretende Lula?
Quando diz que pretende “reconstruir pontes” com o agronegócio, ou Lula está mentindo ou está dando sinais de desorientação. Calejado como poucos, desorientado Lula não é.
Ora, como acreditar na intenção de Lula de restabelecer laços institucionais e transmitir segurança ao agronegócio, o setor mais importante da economia brasileira, quando o presidente em pessoa respalda o líder de uma organização que por vezes pratica crimes, como o MST? É disso que se trata. Ao levar Stédile a tiracolo para a China, Lula não fez outra coisa senão endossar seus métodos truculentos para defender uma agenda política. Mais que o agronegócio, o País só tem a perder com essa atitude irresponsável do atual mandatário.
Com alguma dose de boa vontade, poder-se-ia dizer que a presença de Stédile na comitiva presidencial se tratou “apenas” de uma imprudência de Lula em um momento delicado do início de seu terceiro mandato, quando pontes, de fato, precisam ser reconstruídas e a sociedade precisa ser pacificada. Porém, a relação entre Lula e o MST é antiga o bastante para que se saiba muito bem que, quando lhe é conveniente, o presidente não hesita em apelar para os métodos ilegais da organização a fim de fazer prevalecer seus interesses – ou os interesses do PT.
Não faz tanto tempo assim desde que Lula, durante ato “em defesa da Petrobras” no Rio, em 2015, ameaçou convocar o “exército do Stédile” para enfrentar com violência as manifestações pelo impeachment de Dilma Rousseff que grassavam por todo o País. “Quero paz e democracia, mas também sabemos brigar. Sobretudo quando o Stédile colocar o ‘exército’ dele nas ruas”, disse Lula naquela ocasião.
Pois é ao líder dessa espécie de milícia a serviço do PT que o presidente conferiu enorme prestígio em sua passagem pela China. A mensagem que ele transmitiu com esse gesto é muito clara. De nada adiantará Lula dizer que busca unir e reconstruir o País se, na prática, condescende com o MST em suas violações das leis e da Constituição. Tão logo voltou da China, Stédile cumpriu a ameaça de provocar um “abril vermelho”. Uma área de preservação ambiental e de pesquisas genéticas da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) foi invadida pelo MST em Pernambuco no domingo passado.
Não há paz possível quando não há respeito à ordem jurídica, da qual depende fundamentalmente a ordem social.
Em março, o MST já havia invadido fazendas de cultivo de eucalipto da empresa Suzano Papel e Celulose nos municípios de Teixeira de Freitas, Mucuri e Caravelas, na Bahia. Até hoje, não se ouviu uma só palavra do presidente da República condenando as invasões.
O MST, como qualquer grupo de interesse da sociedade, tem o direito de existir e defender sua agenda. É intolerável, no entanto, que recorra à violência e ao desrespeito às leis e à Constituição como instrumento de ação política. Isso não é democrático; é crime. O presidente, quando endossa esses métodos, tampouco ajuda o País a sair de um estado de permanente tensão entre cidadãos e adversários políticos que se tratam como inimigos irreconciliáveis. O Brasil precisa de paz e de respeito às leis e à propriedade para se desenvolver (O Estado de S.Paulo, 19/4/23)