O fim do horário de verão é uma decisão acertada? Não
Legenda: Mauricio T. Tolmasquim, professor titular da Coppe/UFRJ e ex-presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE)
Por Mauricio T. Tolmasquim
Estudos precisam ser aprofundados
Insalubre e irritante para alguns, saudável e lucrativo para outros, o horário de verão é tema de debates acalorados. Idealizado por Benjamin Franklin, que percebeu que em certos meses do ano o sol nascia antes de as pessoas se levantarem, o horário de verão é atualmente adotado por cerca de 70 países.
O objetivo do cientista norte-americano era economizar vela. A motivação das economias contemporâneas é economizar energia e diminuir a demanda máxima no horário de ponta.
No Brasil, historicamente, o principal benefício do horário de verão é a redução da ponta noturna, levando ao aumento da confiabilidade do sistema elétrico nas horas mais críticas para o suprimento e atenuando, assim, o risco de apagões. Além disso, reduz a necessidade de investimentos em expansão de capacidade ou despacho de termelétricas.
Nos últimos anos, o aumento no número de aparelhos de ar-condicionado, aliado à melhoria da eficiência energética da iluminação pública e residencial, tornou a temperatura o principal determinante do consumo. Como tais aparelhos ficam ligados de forma quase contínua nos meses de verão, o horário de ponta se espalhou para boa parte da tarde, provocando um “achatamento” da curva de consumo. Dessa forma, o principal benefício do horário de verão vem diminuindo nos últimos anos. Apesar disso, ele não pode ser considerado nulo.
Nota técnica do Operador Nacional do Sistema (ONS), de fevereiro de 2018, concluiu que o horário de verão permite uma redução de 3,33% da demanda de eletricidade no Subsistema Sudeste/Centro Oeste (SE/CO) e de 3,43% no Subsistema Sul, ambas calculadas no horário da ponta noturna. Apesar desses percentuais serem baixos, eles representam um valor da ordem de 1.496 MW no SE/CO e 400 MW no Sul. A título de comparação, a usina de Angra 3 terá uma potência de 1.405 MW.
É legitimo o questionamento do governo sobre a manutenção do horário de verão, já que não são poucas as reclamações. Para quem o relógio biológico não se ajusta facilmente ao adiantamento dos ponteiros, a adaptação é penosa.
Quanto mais distante da linha do Equador, mais longos os dias e mais curtas as noites. Assim, somente em algumas regiões do país faz sentido adiantar em uma hora o relógio durante alguns meses do ano. Por conta disso, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, as emissoras de televisão são obrigadas a fazer adaptações em suas grades, e os bancos, no horário de funcionamento das agências.
Por outro lado, a oportunidade de aproveitar por mais tempo a luz solar após o trabalho é saudada por muitos. O período maior de claridade aumenta a sensação de segurança das pessoas. Aproveitam a luz do sol para fazer exercícios físicos ao ar livre ou saem para confraternizar com colegas do trabalho.
Esses hábitos geram uma demanda para o comércio e o setor de serviços. Tanto é que representantes de entidades de bares e restaurantes já se pronunciaram contra a descontinuidade do horário de verão e expressaram preocupação com a queda do faturamento.
Como vemos há razões favoráveis e contrárias ao horário de verão. Dado que os impactos não se restringem apenas ao setor elétrico, teria sido interessante que, antes de uma decisão sobre o fim dessa política, fosse realizado —e tornado público— um estudo analisando os efeitos sobre saúde, segurança pública e atividade econômica (Mauricio T. Tolmasquim é professor titular da Coppe/UFRJ, ex-presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e ex-secretário do Ministério de Minas e Energia)